Os nossos prédios Coutinho

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Há alguns anos foi apresentado um pedido de viabilidade que propunha a demolição da moradia situada à direita do Hotel do Facho, na Foz do Arelho, para construção de um prédio de quatro pisos. O Ministério do Ambiente deu parecer negativo por vários motivos, nomeadamente os riscos associados à proximidade do mar e à instabilidade geológica da área e questões ligadas ao ordenamento do território e à proteção da paisagem.
Esta recusa levou a que alguns autarcas me tenham apelidado de fundamentalista ambiental. Passado pouco tempo, depois de chuvas intensas, verificou-se um deslizamento de terras junto da moradia. Se tivesse sido autorizado, este prédio teria sérios problemas estruturais e muito provavelmente estaríamos a pagar obras de proteção contra o avanço do mar.
Um problema semelhante ocorreu recentemente no Facho em S. Martinho como foi noticiado pela Gazeta de 15 de Marco deste ano.
A moda da construção em altura teve grande relevo nos anos 70 quando a existência de prédios altos num município era símbolo de progresso. Esta situação era um win-win para autarcas e construtores. Para os autarcas trazia “modernidade” às respetivas autarquias e para os construtores era um negócio da China em que compravam uma moradia para depois venderem muitos andares. Para maximizar o lucro o recurso a arquitetos de renome também foi escasso. Daí que a maioria destes prédios não sejam recomendáveis dum ponto de vista estético.
Esta “modernidade” está democraticamente espalhada por todo o país. Em Caldas temos alguns exemplos desde os mamarrachos da Praça, de que falou o meu vizinho Paulo Caiado na sua crónica de 28/6, até à própria Avenida 1 de Maio.
Na nossa região há múltiplos exemplos. O que me dói mais é S. Martinho do Porto que em poucos anos, foi quase totalmente descaracterizado.
Torres Vedras é outro exemplo duma cidade que perdeu a alma com a ironia extra de que um dos autarcas que permitiu esta descaracterização da cidade ter sido, posteriormente, nomeado Secretário de Estado do Ordenamento do Território.
Esta opção pela construção em altura, para além de descaracterizar as cidades e vilas, teve impactos na qualidade de vida dos cidadãos (mais trânsito, mais ruído mais poluição, por exemplo).
Os casos mais graves, como a construção em arribas ou junto à costa, podem acabar mal e geralmente somos todos nós a pagar a conta. Um exemplo gritante são as torres de Ofir em Esposende que implicaram obras de proteção costeira (pagas pelo Estado claro) e que, cada vez que há tempestades mais fortes, têm de ser reforçadas.
Em S. Martinho, em 2014, o Estado também teve de investir em obras de consolidação das arribas que foram destabilizadas por construção autorizada em zonas de risco.
Se vivêssemos no país rico a melhor solução seria a demolição dos casos mais gritantes e indeminização dos proprietários. Infelizmente não me parece que alguma vez o país se possa dar a esse luxo.

Paulo Lemos
pagulit@gmail.com

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