Baixela caldense na mesa do embaixador

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Gazeta das Caldas

Nos idos anos de 2007, o jornal “O SOL” publicou um conjunto de livros da autoria do Prof. José Hermano Saraiva, intitulados “Álbum de Memórias”, sendo o caderno nr.º 6 dedicado aos anos 70; o facto que vamos relatar passou-se quando o autor desempenhava o cargo de embaixador no Brasil, e está assinado como tendo sido escrito no deia 6 de Dezembro.
“(…) Foi esta a última festa que eu dei na pequena casa geminada com a casa do dr. Sá Machado. Convidei para isso principalmente jornalistas. Não podia servir num jantar de jardim, e à volta de uma pequena piscina, a loiça do serviço da Companhia das Índias com marcadores de prata que servia a embaixada de S. Clemente. Para resolver o problema voei para Lisboa, fui às Caldas da Rainha, e na casa de cerâmica de Rafael Bordalo Pinheiro encomendei três grandes caixotes com louça para uma refeição a que não ia chamar nem almoço nem jantar. Estávamos na altura de S: Martinho e resolvi introduzir o neologismo na língua brasileira: o Magusto. No Magusto o essencial eram as castanhas, a assar em pequenos fornilhos debaixo da terra, que os empregados da embaixada iam mantendo acesos. Tudo regado com dois ou três barris de vinho moscatel de Setúbal, que foram enviados diretamente pela adega regional de Palmela. A louça era louça das Caldas, cerâmicas muito vistosas, as folhas de couve, os cachos de uva, toda aquela fantasia dezanoviana do Rafael Bordalo Pinheiro. A Maria de Lourdes insistia dedicadamente, dizendo que louça das Caldas não pode servir em caso nenhum numa embaixada. Mas o certo é que teve um êxito extraordinário. Os meus convidados faziam à saída, gentilmente, o elogio da louça, e pediam para levar uma recordação. Alguns levaram duas ou três recordações. […] Mas muitos nem sequer pediam: metiam os pratos debaixo da roupa que vestiam e saiam apressadamente. […] Esse extraordinário êxito da louça das Caldas numa festa de jornalistas foi para mim uma lição. Há riquezas em Portugal que nós desconhecemos.”
Como já não há nenhuma peça de louça que eu possa levar como recordação, o melhor é pôr um ponto final na história.

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