”Os tempos são quase felizes, os tempos são quase tristes”, escreveu Gonçalo M. Tavares há alguns dias. É nessa divisão que me encontro, é nesse meio onde estou. Energias que foram condensadas durante o isolamento são libertadas agora de forma explosiva, violenta.
A violência como ferramenta para mostrar um ponto de vista é usada há muito, o resultado não resulta, cria ressentimento, ódio e mais violência, numa espiral perpétua. Não tenho grandes dúvidas que o racismo nasce da ignorância, gerada pelo medo e pelo apego. Mas ignorância trata-se com educação e a violência nunca foi a melhor escola. O que preferem: um país a fingir que não é racista ou um país que simplesmente não é racista?
Para o segundo, acredito que o exemplo e a educação são o caminho, mas antes temos de perceber que se a educação vem em muitas formas, não chega a todos os lados. Temos de entender que miséria não tem cor nem etnia. Miséria é miséria. Temos de entender e não rejeitar o passado para mudar o futuro, entender que não há muito tempo a educação era outra, era violenta e castrava opiniões. Mesmo hoje a educação é um produto comercial, e não chega a todos da mesma forma; somos avaliados, colocados à prova e divididos. E tudo o que fazemos na vida é dividir e avaliar – e onde há divisão não pode haver união. Dizer que se sou português, que sou das Caldas, que sou preto, que sou branco, que sou isto ou aquilo é por si um acto de isolamento, é por si um acto de violência .
O fim do isolamento, que prometiam vir com reencontros e alegria, é agora preenchido com incerteza e separação. Sinto-me ensombrado. Quase que tenho vontade de voltar para a ilha, mas virar a cara não é solução, não é justo, é privilégio.Sinto um grande pesar que torna difícil encontrar palavras para escrever estes parágrafos e me leva a questionar muito sobre mim, mas sei o que quero, quero ajudar a criar um futuro livre para todos. E para isso julgo que todas as escolhas contam. Não podemos mudar o mundo mas podemos ajudar o mundo a mudar. Não podemos julgar alguém pela sua cor de pele, não podemos virar a cara à injustiça. Não podemos comprar roupa ignorando a sua origem. Não podemos consumir alimentos sem questionar o sofrimento causado.
A verdadeira revolução, primeiro, é interior.
Problema Capital
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