Olá a todos
Começo hoje um novo espaço, aqui na Gazeta. Sou pediatra e interesso-me pela saúde das crianças, adolescentes, mas também pelos direitos dos cidadãos destes grupos etários e suas famílias. Escrevo livros médicos, romances e poesia, e para mim é uma particular honra poder “conversar” convosco.
Neste espaço irei falar de alguns assuntos que têm a ver com a vida do dia-a-dia, mas sem entrar em aspectos demasiado técnicos ou específicos.
O meu objectivo é fazer-vos pensar em assuntos vários, talvez menos falados e, porventura por isso, mais polémicos. E é meu desejo também que passem momentos agradáveis na leitura dos artigos.
Acredito que devemos cada vez mais ser responsáveis pela nossa própria saúde e pela prevenção da doença. E que devemos aos nossos filhos e educandos, enquanto adultos responsáveis, a fasquia alta de lhes proporcionar mimo, amor, regras, limites, apoio, prevenção de doenças e promoção de saúde, ensinando-os a ser autónomos e a fazerem, eles próprios, escolhas acertadas e adequadas.
Encontrar-nos-emos aqui regularmente.
Um abraço e boa leitura.
Estados de alma
Alegria nem sempre é sinónimo de felicidade ou condição para se atingir a felicidade, e tristeza nem sempre significa depressão e acaba no suicídio.
Estar triste é um direito. Um direito tão natural e tão desejável como estar alegre. Os sentimentos são isso mesmo – sentir. E sentir é ver o mundo e os outros umas vezes de um modo mais optimista, outras mais pessimista, umas vezes de forma mais positiva, outras menos. Estar triste é muitas vezes estar. Simplesmente estar. Sem se saber porquê e sem se querer saber porquê… até porque muitos sentimentos não se explicam, apenas existem enquanto tal.
Tristeza e alegria pertencem à escala de sentimentos e de estados de alma, não havendo propriamente uma divisão radical entre ambas. Quantas vezes a maior das alegrias não é tão grande que roça a tristeza, tantas as vezes a tristeza se insinua nas nossas almas tornando-se bem-estar e tranquilidade. Tudo depende das alturas, dos momentos, das razões
É bem sabido que os grandes criativos, no domínio da literatura, das artes, da ciência, tiveram e têm as suas fases de maior produtividade nos dias em que se sentiam ou se sentem tristes. Muito mais, seguramente, do que quando andavam bem dispostos – a tristeza traz consigo a reflexão, a interiorização, o estar-se tranquilamente consigo próprio. A alegria é mais expansiva, mais comunicativa, mas também mais partilhada, menos pessoal. Estar triste é algo de bom, é um estado de alma que saboreamos a cada momento, devagarinho, com prazer, como um momento nosso e só nosso, enigmático, ao qual os outros não têm acesso.
Evidentemente que não será desejável estar sempre triste. A tristeza temperada com a alegria (e também, embora menos, com situações de perfeita “neutralidade” de sentimentos) constrói o equilíbrio interno e externo de que tanto precisamos e que nos permite gerir de forma adequada a adversidade e o stresse, bem como os estímulos positivos e o contentamento.
Não estranhemos, pois, se os nossos filhos por vezes estiverem tristes. É um direito e um estado de alma necessário. Podemos tentar saber, isso sim, se há algo que possa minorar a tristeza, nomeadamente se podemos resolver o que a gerou. Mas por vezes não há nada a registar de concreto e, por isso, o que devemos fazer é mostrarmo-nos dispostos a escutar, mantendo a “porta aberta” para quando eles entenderem por bem vir ter connosco. Com atenção mas sem dramas, e sabendo que “depois da chuva, vem o bom tempo”.
Mário Cordeiro
Pediatra na ETC Saúde
mario.cordeiro@netcabo.pt
































