O plano ferroviário denominado “Ferrovia 2020” como em todos os documentos macro que procuram definir uma “visão” para o país nada fez de concreto ou de inovador sobre a linha do Oeste. A acertada ideia dos corredores internacionais e das ligações internas no apelidado corredor Norte-Sul, colocou a linha do Oeste como um corredor “complementar”. Não percebo o tamanho desinvestimento estratégico desta visão, pois neste caso “o complementar” parece significar que não é prioritário.
É isso que explica que a linha não tenha sido reinventada considerando quer a “concorrência” da A8, quer a necessidade de a ligar a pontos intermodais estratégicos. Não. A proposta é simplesmente electrificar e modernizar comunicações em parte- metade da Linha entre Sintra (Cacém) e Caldas da Rainha. Além do tempo que temos vindo a gastar nesta espera de investimento, a falta de visão política é aqui o que mais salta à vista. Entendo o planeamento dos corredores de mobilidade como algo que deve responder a necessidades actuais e futuras das populações e da economia. O que vejo aqui é uma incompreensão sobre a ligação de um corredor litoral a Lisboa que se no final do século XIX fazia sentido chegar à capital “por Sintra”, no final do século XX concluímos que não. A A8 soube unir territórios de costas voltadas e criar politicamente uma plataforma chamada “Oeste” e desde 1998 ganhámos uma “nova região”.
Ao posicionar-se na rodovia como o corredor litoral por excelência criou condições únicas em tempo e comodidade para uma viagem de acesso e de saída da capital de Portugal e praticamente condenou a linha da ferrovia no Oeste a vestígios de um tempo que já passou. Os números e a prática observada nestes 20 anos de A8 mostram que esta cumpriu um dos seus maiores desígnios: aliviar a pressão da A1; enfraquecer a ferrovia e abrir caminho a um corredor litoral rodoviário sul-norte que teve mais tarde continuidade na ligação entre Lisboa e Porto com a aposta na A17 e na A29. O que não se percebe é porque esta visão não é transferida para a ferrovia? Não é esta um instrumento privilegiado da mobilidade e do desenvolvimento?
Parece um pouco inacreditável que tanto tempo de observação desta realidade não tenha ajudado a reinventar o papel da ferrovia nesta parte do país. Primeiro porque enquanto a A8 nos oferece concorrência também nos mostra os pêndulos de mobilidade e a entrada em Lisboa passou a ser feita por Loures e não mais por Sintra como antigamente acontecia com as estradas nacionais. Essa foi a grande reinvenção (e daí o êxito!) de traçados na rodovia com expressão na A8 e essa deverá ser também a de uma nova linha do Oeste cuja entrada em Lisboa se deveria fazer não via Cacém, mas em direcção à gare do Oriente, assumidamente o grande Hub inter-modal da mobilidade de Lisboa. Esta alternativa colocada num quadro de desenvolvimento e de ordenamento do território mais amplo é a que mais faz sentido quer pelo que assistimos nos últimos anos 20 anos, quer pelo futuro que devemos construir e que passa por recriar as formas de mobilidade que são na verdade uma das mais relevantes revoluções sociais e económicas do nosso tempo e que está em curso.
Mas se o traçado deveria fechar a sul no coração da distribuição de várias formas de mobilidade como é já a Gare do Oriente, assumindo-se como a nossa Pen Station de Portugal, a norte dever-se-ia criar um hub na zona de Leiria, permitindo, por exemplo, que do interior se possa chegar de carro e mudar para a ferrovia nas deslocações Norte-Sul.
Telmo Faria
telmofaria1@me.com

































