António José Correia
Ex-Autarca
Setembro foi um mês intenso para quem vive ligado ao mar. No plano global, celebrou-se a entrada em vigor, a partir de 2026, do Tratado do Alto Mar (BBNJ). Pela primeira vez, a comunidade internacional terá um acordo vinculativo para proteger a biodiversidade em áreas além da jurisdição nacional. Trata-se de um marco histórico a que Portugal aderiu em abril passado: possibilitar a criação de Áreas Marinhas Protegidas em alto-mar, reforçar a transferência de conhecimento e tecnologia e assegurar que todos os países, desenvolvidos ou em desenvolvimento, participam na preservação deste bem comum. É um passo da aspiração à ação, alinhado com os compromissos da Estratégia Nacional para o Mar e com a meta de proteger 30% do espaço oceânico até 2030.
Mas o futuro do oceano constrói-se também a partir do local. Peniche voltou a ser palco de iniciativas de grande significado para a literacia do mar. A Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar (ESTM), integrada no Politécnico de Leiria, em parceria com a Fórum Estudante e o Município de Peniche, organizou a 15.ª edição da Semana Tanto Mar, que reuniu cinquenta jovens do ensino secundário em experiências diretas com a pesca, a ciência, o surf, as Berlengas e a economia azul. Também em setembro, e numa iniciativa em que integrei uma painel de discussão, a ESTM organizou pela primeira vez a Universidade de Verão Tanto Mar da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, reforçando-se a ligação entre Portugal e os Estados Unidos na valorização do Atlântico.
Para mim é um orgulho ver a afirmação desta marca — Tanto Mar — à qual estive ligado desde a sua génese, e que hoje constitui uma referência nacional no despertar de vocações para o mar. A ESTM afirma-se, assim, como instituição âncora para a nossa região, combinando ensino, investigação, cultura e inovação ligadas ao oceano.
Este setembro levou-me também ao Brasil, a Maricá, onde participei no Seminário Internacional da Economia do Mar. Levei a minha experiência enquanto Presidente da Câmara Municipal de Peniche como exemplo de cidade costeira que soube articular tradição piscatória, turismo náutico e surf, conhecimento e inovação. O Atlântico, afinal, não nos separa: une-nos.
No ano em que a Gazeta das Caldas celebra o seu centenário, não posso deixar de recordar o papel fundamental que este jornal, sob a liderança do seu diretor José Luís Almeida e Silva, desempenhou na promoção da luta contra a instalação da Central Nuclear que o governo de 1975 e 1976 pretendia construir em Ferrel, no concelho de Peniche. Uma luta que também integrei, e que permanece como exemplo de cidadania ativa e de defesa do território e do mar. Ao evocar este episódio, importa igualmente sublinhar a relevância da comunicação social local e regional na afirmação e defesa da liberdade de expressão e, consequentemente, da democracia. A Gazeta das Caldas é, há cem anos, uma voz indispensável para a identidade da nossa comunidade e para a vitalidade da vida democrática.
Do tratado global às experiências locais, passando pela cooperação transatlântica e pela memória histórica, uma mensagem se impõe: o mar exige-nos visão partilhada e ação concertada. É sempre no mar que encontramos o nosso maior desafio e a nossa maior oportunidade.

































