De Costa a Costa

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No nosso imaginário coletivo permanecem algumas expressões dum tempo em que, enquanto crianças, partilhávamos o “sonho americano”. Era uma altura em que ninguém tinha dúvidas que os “maus-da-fita” eram os índios e que os heróis eram os cowboys. Era uma época, durante a “corrida ao espaço”, em que todos parávamos para ver o lançamento de uma nave espacial americana. Nesse tempo, que misturava em doses perfeitas a bravura e a ingenuidade, havia uma expressão que apelava ao ideal de terra de liberdade em que a América se havia tornado: “from coast to coast”.
Todos sonhámos um dia percorrer as infindáveis planícies ao volante dum mustang vermelho descapotável. Podíamos sair de Nova Iorque, a “capital do Mundo”, passávamos por Chicago, onde apanhávamos a famosa route 66 e seguíamos, “de costa a costa” até à solarenga Califórnia.
Em Portugal e, mais concretamente, nas Caldas da Rainha, não havendo uma tão famosa estrada de costa a costa, sempre podemos fazer uma crónica de Costa a Costa.
A nível nacional, temos um Costa que personificava o ideal de um verdadeiro cowboy honrado. Este herói era a eterna esperança socialista de um governante impecável. Tal convicção começou e esboroar-se pelo facto de António Costa ter sido o braço direito dum primeiro-ministro que, acusações de fraude e prisões preventivas à parte, é responsável por ter levado Portugal até à bancarrota e ter obrigado os portugueses a passarem pelo processo de reajustamento destes últimos quatro anos. Muitos são os que também não lhe perdoam a maneira como chegou ao poder dentro do partido socialista. Deixou o “caldense” Seguro em lume brando quando não era fácil dar a cara pelo PS, por causa do estado em que tinham deixado o país em 2011, e, quando lhe pareceu que a passadeira vermelha estaria estendida para um passeio triunfal até à cadeira de Primeiro-Ministro, atraiçoou Seguro e roubou-lhe o lugar. A gota-de-água foram os últimos episódios com os cartazes em que mostravam pessoas a contarem as suas dramáticas histórias de vida, para depois percebermos que tais histórias não eram verdadeiras e que as pessoas nem sequer haviam dado autorização para serem expostas nos cartazes. As consequências estão à vista: todas as sondagens demonstram a mais que provável derrota do PS de António Costa que, ironicamente, já conta com uma percentagem inferior à conseguida por Seguro. Rapidamente se percebeu que, como muitas vezes aconteceu no velho oeste, o cowboy António Costa não era o herói mas o verdadeiro vilão.
Nas Caldas também temos um Costa. O “nosso” Costa, pelo desenvolvimento que trouxe à cidade e ao concelho, foi, durante décadas, o herói dos caldenses, equiparável, no sonho americano, a um astronauta. Mas, tal como acontece aos verdadeiros astronautas, chega um dia em que já não os deixam voar para outros mundos. Os planetas de Fernando Costa são os parlamentos. Tentou embarcar numa nave espacial em direção ao parlamento europeu mas não foi eleito. Mais modesto, tentou entrar na nave que ia para o parlamento português mas foi barrado à entrada. Poderá continuar a descentralizar as suas escolhas e, um dia, tentar voltar a governar as Caldas da Rainha mas, por cá, estão astronautas novos que certamente preferirão contar apenas com os seus experientes conselhos do que tirar as mãos dos comandos da nave espacial.
É preciso saber quando chega a hora de se passar de governante a senador. Pode parecer sempre uma injustiça mas, por vezes, mais vale continuar a ser lembrado como o herói que foi do que como o astronauta que já não deixaram voar.

Jorge Varela
jorge.varela@ipleiria.pt

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