Quer queiramos quer não, uma vez chegados a esta época do ano, não conseguimos ficar indiferentes à dureza do Inverno quebequense. Ainda há pouco mais de duas ou três semanas comentávamos que, mais uma vez, e para grande tristeza de grande parte dos habitantes da nossa província, teríamos um Natal verde. Isto é, sem neve. Pura ilusão, exactamente no dia 25 de Dezembro último, caiu uma pequena tempestade deste elemento, indispensável ao equilíbrio de parte da população, e de múltiplos factores de produção.
Hoje, pouco mais de três semanas depois do Natal, fazemos parte do grupo dos que não morrem de amores pela beleza da brancura que nos envolve até finais de Março, depois de cerca de dez dias consecutivos, em que o termómetro só muito raramente se aventura para além dos dez graus negativos centígrados , e como muitos outros, vivemos na esperança de que a realidade climática exterior acabe se por adequar um pouco, à mini saia com que a menina dos serviços meteorológicos da televisão, nos anuncia o tempo 24 horas por dia, sete dias por semana.
É também a partir deste fim de semana, que na Ilha de Sainte Hélène, situada no meio do São Lourenço, entre Montreal e a nossa cidade de Longueuil, se abrem as festividades das Festas das Neves, que duram duas semanas, mas sobretudo, a Aldeia das Neves, que perdura até ao dia 31 de Março. O primeiro evento é sobretudo dedicado aos mais pequenos, e incorpora todas as diversões ligadas ao gelo e à neve. Pistas de esqui, corridas de trenós puxados por cães e por cavalos, castelos de neve, patinagem sobre o São Lourenço, etc. Tudo isto, a menos de cinco minutos de viatura da grande cidade. O segundo evento, a Aldeia das Neves, passa-se em local adjacente, e dirige-se a todo o género de público. Uma verdadeira aldeia viva, com todo o tipo de edifícios, fabricados com gelo evidentemente, que se podem encontrar numa aldeia normal. O visitante pode passar uma ou mais noites no hotel de gelo, com 15 quartos. Neste hotel, os clientes mais exigentes podem contar com spas aquecidos, igloos de neve, restaurante de gelo com um chefe de renome, bar de gelo com esplanada com vista para o rio e Montreal, salas de reunião (no folheto publicitário não diz se tem internet), capela de gelo, exposição de esculturas de gelo, labirintos de neve e escorregas, de gelo logicamente. E para desentorpecer os membros inferiores, uma discoteca.
A temperatura interior destes espaços não vai no entanto além dos cinco graus negativos.
Numa atitude louvável, o serviço de metropolitano, que liga Montreal a Longueuil, com uma estação na ilha, e que passa sob o leito do São Lourenço, numa distância de cerca de cinco quilómetros, é completamente gratuito para todas as crianças até aos cinco anos durante as festvidades.
Hoje, aábado dia 21, ao atravessarmos a ponte Jacques Cartier, no nosso percurso diário entre o escritório e a nossa residência, e por entre uns magníficos raios de Sol, apesar do termómetro exterior marcar quinze graus negativos, quando passámos pela saída da ponte para a Ilha, havia uma placa dizendo que todos os locais de estacionamento, pagos 17 dolares por dia, estavam ocupados, e a polícia pedia às pessoas para utilizarem os transportes colectivos.
Mas, definitivamente, não somos adeptos deste tipo de actividades. E não pense o leitor que tal se deve ao facto dos nossos genes terem origem em climas mais temperados. Temos dois filhos, ambos nascidos no Québec, há mais de vinte e trinta anos. O mais velho lá estará certamente, com a companheira e os seus dois jovens rebentos. O mais novo, é tão, ou mais friorento do que nós. O mesmo se passa com muitas outras famílias.
Para nós, Inverno, é sobretudo o problema da viatura, que com a ajuda duma pequena pá, é desbloqueada da montanha de gelo que o trator limpa neves lhe lançou para cima, no trabalho de limpar a via e que, obviamente, ao passar não se estava nada preocupando com a nossa ou qualquer das outras viaturas estacionadas. Ou pior ainda do que isso, é o telefone que toca, quando um dos inquilinos nos diz que o maldito cano dos esgotos está completamente gelado, e teremos uma vez mais de chamar o canalizador, que como outros profissionais, nestes dias de gelos extremos, fazem negócios de ouro, cobrando-nos setenta e cinco dolares por cada hora de trabalho. Devemos no entanto mencionar, para aqueles que pensem improvisar-se canalizadores no Québec, que não é tarefa fácil nem agradável.
Talvez o facto de tanto nós como a nossa companheira, quando aqui chegámos pela primeira vez, na segunda metade da década de setenta do século passado, já o mês de Dezembro se aproximava do fim, e assim, tudo o que veio a seguir foi melhor e mais agradável, explique o nosso amor a esta terra.
J.L. Reboleira Alexandre
jose.alexandre@videotron.ca
































