A leitura do título da crónica desta semana, poderá induzir o leitor em erro. É que, nunca o autor destas linhas, nestes mais de 35 anos de vivência na América do Norte assistiu a qualquer sessão de cinema ao ar livre, ou no parque, como por aqui se diz. Para nós, cinema ao ar livre, lembramo-nos apenas de uma ou duas sessões, nas cálidas noites de Luanda, durante a curta, mas intensa estadia, que passámos naquela cidade no cumprimento do serviço militar obrigatório, em pleno PREC (processo revolucionário em curso), no período compreendido entre os meses de Outubro de 1974 e Outubro de 1975, e das quais guardamos boas e más recordações.
De todas as sessões cinematográficas a que então assistimos, a que mais nos marcou numa daquelas noites tórridas dos trópicos, foi sem dúvida a visualização algures em Luanda, do primeiro, e para nós o melhor de todos os filmes da popular série, Emmanuelle, com a belíssima e sensual actriz holandesa Sylvia Kristel, (impensável antes da Revolução de Abril). E, não fora o facto do parque cinematográfico ficar situado num dos morros sobranceiros à cidade, com uma vista esplendorosa sobre a magnífica baía da capital angolana, outras recordações haveria se, enquanto o filme passava na tela, não fôssemos simultaneamente obrigados a assistir ao rasto luminoso das balas tracejantes dos «soldados» dos três Movimentos de Libertação (MPLA, FNLA e UNITA) que já na altura lutavam entre si, pelo controlo político e militar daquela riquíssima antiga colónia portuguesa. Foi assim, na Luanda de meados dos anos setenta do século passado e nas magníficas instalações que na altura nos oferecia o cinema Miramar, como o nome diz, «mirando» o mar, que pela última vez assistimos à projecção de cinema ao ar livre.
Antes disso, guardamos recordações muito vagas da paupérrima qualidade dos cinemas «ambulantes» que visitavam todas as aldeias circundantes das Caldas no início da década de sessenta. No Chão da Parada da nossa infância, devido à inexistência de energia eléctrica de rede, era através dum gerador diesel, que a indispensável corrente, necessária à projecção era produzida. Nesses dias, a partir das primeiras horas da manhã, o ruído tonitruante dos altifalantes do «carro do cinema», dava repetidas voltas pelas ruas da aldeia, repetindo até à exaustão o nome da «mundialmente conhecida», estrela do filme. Ao cair da noite, a aldeia em peso dirigia-se para o maior largo da terra, e aí se juntavam jovens e menos jovens com o intuito de assistirem, sentados em rudes bancos de madeira, a algo a que, com um pouco de boa vontade, se poderia chamar de cinema. Era afinal, o cinema possível numa pequena terriola dum Portugal pintado de cinzento, no que era já o crepúsculo da ditadura de Salazar e Caetano. Obviamente não nos lembramos de nenhuma película em particular.
No entanto, este tipo de cinema ao ar livre, não corresponde ao que na América se chama de ciné-parque, onde, e como não poderia deixar de ser, não estivéssemos nós na terra onde o automóvel é (já foi mais) rei, os espectadores estão confortavelmente recostados no interior dos seus veículos, observando a progressão das imagens projectadas numa tela enormíssima. Estes amplos espaços, grandes como vários campos de futebol, e situados fora das grandes urbes, são locais de encontros românticos ou familiares, segundo o enredo do filme e a faixa etária a que se destina. Chova ou faça Sol, frio ou calor, os espectadores, uma vez estacionados os seus automóveis em longas filas geometricamente alinhadas, assistem às sessões calmamente instalados no conforto dos seus veículos, onde, uma vez sintonizada uma frequência dedicada à banda sonora, ouvem no auto-rádio, os actores da sua preferência.
Mas neste novo milénio uma grande ameaça paira actualmente sobre este tipo de actividade. É que os grandes estúdios americanos poderão deixar de distribuir as suas produções em película, já a partir de 2013. Numa altura em que tudo se converte ao digital, os custos a suportar pelos pequenos empresários proprietários destes parques, são exorbitantes. Se é um facto que os projectores numéricos são mais eficientes, muitos receiam que sejam sensíveis ao pó e humidade exteriores, mas sobretudo ao frio, problemas que não afectam os velhos sistemas de 35mm. Se juntarmos que no final de cada época todo o equipamento terá obrigatoriamente de ser desmontado, e montado de novo no início da seguinte, com os custos inerentes, para cinco ou seis meses de utilização durante a época estival, o investimento associado leva muitos empresários a reflectirem sobre se vale a pena manterem-se em actividade.
Estamos assim, possivelmente, perante mais um género de negócio, este tipicamente norte-americano, que, a exemplo de tantos outros, poderá desaparecer num breve espaço de tempo. Se acrescentarmos ainda que estes amplos terrenos, no passado longe e distantes das grandes cidades, encontram-se actualmente praticamente nos subúrbios das mesmas, valendo verdadeiras fortunas devido às constantes valorizações de todos os espaços de terra, e considerando também, que existe actualmente uma corrente de pensadores da teoria económica, que entende que a terra, desde que responda a determinados critérios, e, por oposição ao espaço urbano com habitações, é de todos os activos conhecidos, aquele que, pensado em termos de longo prazo, maior valorização terá no futuro, cremos que a sorte dos ciné-parques, tal como todos os conhecemos, já está escrita!
J.L. Reboleira Alexandre
jose.alexandre@videotron.ca
































