A comunidade portuguesa da zona de Montreal é constituída por cerca de cinquenta mil pessoas, dispersas pela metrópole central e pelas múltiplas pequenas cidades e vilas circundantes. O nosso grupo étnico faz hoje parte das chamadas comunidades antigas, a exemplo de outros grupos de europeus como os italianos ou os gregos, que chegaram a estas paragens durante as grandes vagas migratórias que tiveram lugar nas décadas de cinquenta e sessenta do século passado.
Naturalmente, e como acontece noutros países acolhedores de imigrantes todas estas diferentes etnias têm tendência a criarem serviços próprios de apoio às necessidades de todos os dias, com instituições de vária ordem onde, desde a direcção até à parte mais baixa do organigrama da entidade em causa, se pode comunicar na língua mãe de cada um. Como já mencionei numa crónica anterior, se é um facto que os portugueses de Montreal dirigem algumas, poucas, indústrias, é sobretudo na actividade comercial que demonstramos maior vigôr, não fosse esta, a razão da partida dos navegadores lusos desde os finais do século XV. Hoje, e um pouco por todo o lado onde exista um português, é indubitavelmente através da restauração, que somos mais conhecidos como grupo. Costumo dizer que, atendendo ao depauperado erário nacional, os bons restaurantes portugueses espalhados um pouco por todas as latitudes, são hoje os melhores e mais baratos embaixadores da nossa cultura e das nossas gentes.
No entanto, a organização portuguesa mais representativa em Montreal, é sem margem de dúvidas a nossa Caixa de Economia. Nos finais da década de sessenta do século XX um pequeno grupo de visionários, e a exemplo do que a comunidade italiana por exemplo, já tinha feito, decidiu criar uma instituição que pudesse fornecer a todos nós um amplo leque de serviços financeiros, que, se numa fase inicial se limitavam aos depósitos e empréstimos, hoje alargam-se a outros produtos mais complexos. O sistema bancário do Canadá é, numa situação imutável desde que aqui cheguei há mais de trinta anos, dominado pelos mesmos cinco grandes bancos que operam em todo o país, da costa do Atlântico à do Pacífico. Depois, cada província tem ainda alguns bancos mais pequenos e regionais, e organizações de crédito que funcionam em estruturas cooperativas, cuja actividade era inicialmente direccionada em exclusivo para o apoio financeiro, junto dos grandes espaços agrícolas com pequenas densidades populacionais, e onde normalmente as grandes instituições bancárias cotadas em bolsa, estão menos presentes. Numa atitude plena de realismo, os fundadores da Caixa dos Portugueses, agregaram-se ao maior grupo cooperativo e financeiro da província, as, por todos conhecidas, Caisses Desjardins, do nome do seu fundador Alphonse Desjardins (1854-1920). O capital social destas cooperativas financeiras é pertença de todos os que com elas têm relações comerciais, e trata-se dum montante simbólico de apenas cinco dólares por cada conta aberta. Desde que aqui cheguei em 1976 e nela abri a minha primeira conta, com os poucos dólares que ganhei no meu primeiro emprego num dos grandes hoteis da cidade, sempre a nossa Caixa manteve este pequeno montante inalterado.
Durante todos estes anos tem tido uma existência normal, de altos e baixos, mas se exceptuarmos uma fase verdadeiramente tumultuosa e complicada há já alguns anos, tem cumprido a sua missão de forma satisfatória. Qualquer português incapaz de comunicar numa das duas línguas oficiais do Canadá, pode, a custos inferiores aos dos bancos, obter junto dos seus balcões todos os serviços bancários de base, e no caso de necessitar produtos mais sofisticados é direccionado para os serviços centrais do grupo Desjardins. O leitor que desconheça o funcionamento destas instituições perguntará, então se todos os cooperantes detêm uma quota igual como são distribuídos os lucros, quando os há? Ao contrário dos bancos cotados em bolsa que distribuem os mesmos através de dividendos que são função do número e do tipo de acções de cada um, aqui os lucros são distribuídos em função do montante e do tipo de produtos que cada cliente detém na instituição. É na nossa modesta opinião uma forma justa de remuneração como é igualmente justo que os diferentes tipos de produtos retribuam de forma igualmente diferente o cliente, sempre em função do risco assumido por este, ou do potencial de lucro subjacente ao produto disponibilizado pela Caixa.
Nestas situações nunca se pode agradar a gregos e troianos, e claro, os credores, depositantes da Caixa nunca estarão de acordo com os devedores, beneficiários de empréstimos da mesma. Sendo uma situação salutar, já menos salutar são as lutas intestinais na praça pública, que surgem regularmente, com longos artigos nos jornais em língua portuguesa de Montreal, onde, através de discussões fulanizadas se degladiam publicamente e à boa (ou má) maneira nacional, sobre questões que não deveriam extravasar o interior das organizações. Por uma questão de respeito por todos os clientes e funcionários, e sobretudo da actual gerente da instituição, que ao assumir as suas funções encontrou múltiplos e graves problemas por resolver, mas que, numa gestão sóbria e cuidada conseguiu reconquistar a confiança da comunidade na mesma, entendo que um mínimo de reserva e de decoro se deveria sobrepôr a egos demasiado elevados, e sobretudo, se considerarmos ainda que um dos intervenientes na recente polémica, tem responsabilidades acrescidas, que lhe advêm do facto de ter efectuado toda a sua actividade profissional no seio dum dos citados cinco grandes bancos canadianos. Mas enfim, às vezes o que parece não é!
J.L. Reboleira Alexandre
jose.alexandre@videotron.ca
































