Carnaval! Ninguém leva a mal! Será?

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José Ramalho
Actor & Marionetista

Fevereiro é mês de Carnaval, salvo muito raras excepções quando o calendário nos atira o dito para o marciano mês de Março, em tempos idos o primeiro mês do ano na Roma Antiga.
A etimologia da festa dionisíaca, perde-se de razões nas hipóteses do latim “carne vale” ou “carnelevare”. O que vale mesmo é que o mote é dado pela palavra “carne”. Se em ambas o significado anda pela vontade de anulação da dita, antecipando, num calendário religioso, o jejum da Quaresma, o que vale mesmo, reitero, é que a carne no Carnaval vale. Assim seja!
Venha de lá nas mais variadas apresentações, neste período, metáfora da desbunda, onde as permissões se soltam sem vénia à censura, onde os mundos se desorganizam para se refrescarem e fazerem a catarse individual e colectiva, tão necessária à recuperação da sanidade. É a higiene mental, senhoras, senhores e tudo o mais.
É o tempo das inversões, do mundo ao contrário, onde os valores, se afirmam pela ousadia, transgressão e outras partidas. Salvaguarde-se a segurança!
Este período é refrescante, “ninguém leva a mal”! As máscaras sociais caem e dão lugar às máscaras carnavalescas, “lato sensu”, ao figurino, à vestimenta, que afina a composição da personagem real, irreal ou surreal que cada vivente se deslumbra a arrumar para fazer jus ao avatar que nesses dias vai fazer vingar na passerelle pública.
Haja abundância de disparate, na comemoração e afirmação de um universo, por vezes, de práticas surrealistas, que em momentos beijam a Utopia. É disto que estamos necessitados. UTOPIA!
Os tempos desconcertantes que atravessamos, prenhes de disparate, vorazes no chorrilho de casos e casinhos, a maior parte só para ruído e obedecendo a agenda instruída, cujo crivo da razoabilidade e da sanidade já foi cirurgicamente abolido, algures numa redacção de “media”, visando a anestesia de leitura crítica, no desafio à inteligência individual e colectiva. Cuidado, minhas senhoras e meus senhores, a promoção do barril de pólvora societário está a soldo e em saldo. Não adoeçam de forma tão generosa e diligente a DEMOCRACIA. A pólvora não serve só um fim. Já o seu inventor, Alfred Nobel (1833-1896) nos alertou.
É urgente o Amor! Urge fomentar o sonho, acreditar no inantingível, dar eco ao intangível.
Venha daí o Hieroymus Bosch (1450-1516), com obra universal espalhada pelos quatro cantos do Mundo, o seu “Jardim das Delícias” a ocupar o Museu do Prado em Madrid. Cá no nosso rectângulo, à beira-mar instalado, podemos ver no Museu Nacional de Arte Antiga o tríptico “Tentações de Santo Antão” e desse modo higienizar a nossa saúde mental, que nos últimos tempos, anda parca de posologias qualitativas.
A agenda deve (des)arrumar-se, provocando estímulos disruptivos, acções “fora da caixa”.
Bertold Brecht (1898-1956) e Kurt Weil (1900-1950) criaram em 1933 o bailado cantado no Théatre des Champs-Elysées dos “7 Pecados mortais dos pequeno-burgueses”.
Permissão à exaltação dos 7 Pecados Capitais, glorificando-os, tornando-os, os 7 Bocados Capitais.
Viva a Gula, saboreemos os prazeres bem comidos e bebidos, vendo, ouvindo e lendo. A Preguiça nos tome de assalto e deixe o tempo vadiar, dado o tom na ausência de compromisso. Haja Inveja! A Luxúria nos ataque de saudável crise epicurista recheada de prazeres vertiginosos. Os tempos estão de poupança, já nos vão dando a receita, fomentemos a Avareza, no modo de cautela do futuro. Vociferemos contra todos os dislates e injustiças que nos atropelam em cada momento, na exaltação da Ira! Por fim o Orgulho nos arrebate na emancipação dos Pecados!
Haja Paciência! Haja Saúde! Na maré carnavalesca afastemos os dissabores e outras dores. Saibamos encontrar as mezinhas para inverter decisões, anunciadas que o futuro Centro Hospitalar será arredado da terra que viu nascer o Hospital Termal mais antigo do Mundo. ■ (1) Verso do poema José de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)

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