Capital psicológico / Mara Correia – A essência da aparência

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imagem-capital-pricologicoSomos (d)a terra do Zé Povinho. Aquele que vive trôpego e confuso no seu próprio paradoxo.
Como o retratou João Medina (1992), o Zé Povinho, ou seja, o português “é paciente, crédulo, submisso, humilde, manso, apático, indiferente, abúlico, céptico, desconfiado, descrente e solitário” e simultaneamente “incrédulo, revoltado, resmungão, insolente, furioso, sensível, compassivo, arisco, activo, solidário, convivente”, o que revela que está “em constante contradição consigo mesmo”.
Pensamos, mas não dizemos.
Queremos, mas não mostramos.
Resmungamos, mas não agimos.
Calamos, mas não concordamos.
Indiferentes por fora, roídos por dentro.
Fazemos nas costas o que gostaríamos de fazer cara a cara.
Falta-nos coragem – digo eu. Não para ir além-mar, que isso nós já fizemos e não é disso que precisamos.
Coragem para sermos nós próprios e gostarmos disso mesmo. Mas sobretudo coragem para conhecermos e aceitarmos as nossas vulnerabilidades – e isso é um calcanhar de Aquiles.
Nós, seres humanos, temos uma tendência natural para gostar daqueles que “gostam” de nós, ou melhor, daqueles que nos mostram concordância – e não discordância. Aliás, preferimos aqueles que concordam connosco e que são amáveis, mesmo que muitas vezes isso corresponda a não falar a verdade. Mas por outro lado, se por acaso descobrimos que nos mentiram, revoltamo-nos. Portanto, temos uma certa tendência para – sendo “zé povinhos” – não gostar dos da “nossa espécie”.
Isto significa que construir uma cultura onde as pessoas são “recompensadas” por identificar vulnerabilidades (pontos a melhorar, problemas, etc…), por dizer a verdade e, melhor ainda, por propor soluções, não é fácil. Mas dizer a verdade e admitir a ignorância são requisitos essenciais ao sucesso das organizações, das nações e da Humanidade.
A transparência é uma temática crítica para quem tem à sua frente o desafio de liderar – seja uma pequena ou grande equipa, seja uma organização, seja um país ou uma zona geográfica. A começar, não pela equipa, organização ou cenário que tem pela frente, mas a começar por si. Por isso, aprender sobre si, sobre o seu desenvolvimento pessoal, sobre os seus pontos fortes e sobre os aspetos que tem a melhorar é algo a que o líder se deve dedicar, continuamente, ao longo da viagem. Não se trata de avaliar o seu desempenho, mas de o gerir. Ter consciência, pedir ajuda, delinear planos e implementar ações.
Isto, nem todos o irão assumir, mas provavelmente todos o irão pensar porque, lá está, somos Zé Povinho.

maracastrocorreia@gmail.com

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