O título destas linhas deve-se, à passagem, recente, do centenário da morte de Raimundo António Bulhão Pato, natural de Bilbau, no país Basco espanhol, onde nasceu a 3 de Março de 1828 e cuja morte ocorreu na Torre, freguesia de Caparica, em 24 de Agosto de 1912.
O prédio onde viveu, foi recuperado e situa-se frente à sede actual da freguesia, exibindo placa registando a efeméride.
Embora o nome da iguaria se deva ao poeta, o autor da proeza terá sido o célebre João da Mata, conhecido e afamado cozinheiro lisboeta do sec. XIX, talvez o maior. João da Mata publicou, em 1876, a Arte de Cozinha, com prefácio de Alberto Pimentel, livro que teve grande sucesso e várias edições.
Mas não foi por não ser criador das ditas ameijoas que que o poeta deixou de criar outras de igual valia.
Já referi Paul Plantier, que editou o Cozinheiro dos Cozinheiros, a quem Bulhão Pato enviou, a pedido do citado, quatro receitas que constam daquele livro: Açorda à Andaluza, Perdizes à Castelhana, Arroz opulento e Lebre à Bulhão Pato. Hoje, com a dificuldade de obter a matéria prima a execução fica … para os caçadores e priveligiados.
Não resisto a deixar, aqui, a magistral caricatura que do poeta da Paquita fez o “vosso” Rafael Bordalo Pinheiro:
“Nenhuma figura de homem reveste em Portugal mais amplamente o tipo da sua nacionalidade e da sua raça. A afirmação dum carácter, Vestissem-lhe o gibão de veludo preto dos velhos holandeses e teriam um dos síndicos de Rembrandt. Pusessem-lhe uma armadura e surgiria NunÁlvares. O seu gesto é largo, em curva, ampliado, castelhano, excessivo, como o dos tipos das comédias de Moreto; a palavra escandida, batida às vezes numa secura de matraca, outras vezes plástica, redonda, cheia, num jeito de declamação cantada onde se apercebe o exagero simpático dum herói de Cervantes. Depois da caça, a sua paixão é a cozinha, uma cozinha toda de emoções e de colorau picante, uma cozinha declamatória e grandiosa, cortada de especiarias e drogas como um colóquio de Garcia de Horta e puxando a lágrima à força de pimentão como um sermão do padre Lagosta. Todo o bom português leu um dia a Paquita ou comeu ao menos uma vez na vida lebre à Bulhão Pato”.
E deixo, também registada, a receita das ameijoas: é, a mais simples, a que prefiro e executo, mas o bom resultado depende da qualidade das “ditas”. Por isso deverá escolher as de conchas escuras, conhecidas por cristãs.
Para quatro pessoas proponho 1 kg de ameijoas, que estiveram de molho em água e bastante sal (melhor se for água do mar), para perder a areia. Ainda assim lavá-las por várias águas. Levam-se ao lume duas colheres de sopa de azeite. Uma vez quente deitam-se dois dentes de alho que devem alourar.Em seguida junte as ameijoas e um molho de coentros picados finamente e tempere de sal e pimenta. Vá mexendo o recipiente. Quando abertas regue com o sumo de meio limão e sirva com o restante cortado em meio gomos. Bom apetite
João Reboredo
joaoreboredo@gmail.com
As ameijoas à Bulhão Pato
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