A propósito do Relatório Final – ISCTE – IUL – Um contributo do Mário Gonçalves – Médico Cirurgião e 1º Presidente do Conselho

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Na sequência da publicação dos principais aspectos do Relatório realizado sobre as termas das Caldas pelo ISCTE e das declarações à Gazeta das Caldas do seu coordenador, o cirurgião caldense Mário Gonçalves enviou-nos este testemunho em que questiona parte das conclusões daquele documento.
Achamos que o tema está em aberto, pelo que desafiamos outros leitores que tenham opinião formado sobre o tema a darem a sua contribuição pública para o debate.

É proverbial dizer-se que “Palavras, leva-as o vento; o que fica escrito, o vento não pode levar”. Trata-se de um ditado que o cidadão comum adopta, sem objecção. No entanto e por paradoxo, é a nível institucional, representativo, que as palavras escritas mais frequentemente tendem a cair no esquecimento, mesmo quando, sobre um determinado tema, procuram transmitir ideias ou firmar propostas válidas, incentivadoras de uma reflexão aprofundada por parte dos seus destinatários, responsáveis mais directos.

Esta incongruência tornou-se recorrente nas Caldas da Rainha, quando se trata de considerar a possível expansão do Termalismo, assunto que, por ser obrigatório, não admite ser tido como inexequível.

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Os Objectivos do Estudo

O Relatório encomendado ao prestigiado ISCTE – IUL (Instituto Universitário de Lisboa), teve por finalidade o “Estudo de Avaliação Gestionária, Económica e Financeira sobre o Hospital Termal, Visando um Modelo de Gestão Autónoma”. Na generalidade, este trabalho cumpre os seus objectivos, ao enunciar os rumos que poderão propiciar a resolução do problemático assunto do Termalismo, na nossa Cidade. Talvez por precaução, ou por premonição, o(s) seu(s) Autor(es), sublinha(m) algumas das dúvidas que subsistem no respeitante à sua concretização, as quais se centram não só nas dificuldades geradas pela grave conjuntura económico-financeira actual, mas ainda na referência feita, de forma breve, aos insucessos que têm inviabilizado a concretização das diversas propostas surgidas com o propósito de dinamizar o Termalismo nas Caldas da Rainha: “alguma tradição nacional sobre Estudos, confirmam a possibilidade do presente Estudo do ISCTE – IUL não ser implementado e ser arquivado”.

Honrar o passado, perspectivando o futuro, foi a expressão do desígnio que coube afirmar em 22 de Janeiro de 1985, na Sessão Solene que marcou o início das Comemorações do V Centenário da Fundação do Hospital Termal e das Caldas da Rainha. Ao finalizar a sua intervenção, o representante do CHCR, concluía, em forma de apelo: “Projectos parcelares, projecto global, serão só compromissos que não se cumprem?

O proveito destes índices para o progresso da comunidade não é ilusório. Sendo o benefício comum, muitos terão que se comprometer, trabalhando… A Cidade das Caldas da Rainha pode e deve ser diversificada, mas de forma criteriosa que não inviabilize a sua principal vocação… Pensar o futuro num País em crise, poderá ser frustrante, mas só para quem não acreditar que os objectivos válidos são alcançáveis, com perseverança.

Quem transforma o desejo em realidade? Quando?

Queremos que sejamos todos e a partir de hoje!”

O primeiro e talvez o único Estudo

É verdade que “o que fica escrito, o vento não pode levar”, asserção necessariamente aplicável não só ao Estudo em apreço, mas também aos projectos que foram gizados com idêntico objectivo, criando expectativas, entretanto goradas por motivos nem sempre esclarecidos, entre eles, o caso do projecto denominado “Conjunto Turístico das Termas das Caldas da Rainha”, afinal o primeiro e talvez o único, que nas últimas três décadas, mereceu o Despacho do Senhor Secretário de Estado da Saúde, na data de 10 de Julho de 1996: “Concordo com a proposta de convencionar a expansão do Termalismo. Sugiro, todavia, uma redução do prazo contratual para 25/30 anos”. a) José Arcos dos Reis.

O Despacho foi exarado, significativamente, no ano em que o Centro Hospitalar das Caldas da Rainha (CHCR), solenizou o Centenário da Morte de Rodrigo Berquó, ocorrida em 18 de Março de 1896, o “Arquitecto das Termas”, que firmou o tempo de programar a expansão do Termalismo nas Caldas da Rainha, no final do século XIX. Devemos a Rodrigo Berquó o traçado de uma perspectiva de progresso para a nossa comunidade, tendo como fulcro o desenvolvimento do Termalismo. O seu projecto ficou bem patente nas obras que edificou com base nos planos que estabeleceu e que não pôde concretizar porque a morte o surpreendeu no exercício do seu cargo de Administrador do Hospital Termal Rainha D. Leonor.

Na sequência das diligências iniciadas em 1982, com a criação do “Grupo de Trabalho Interdepartamental para Estudo e Proposta de Medidas de Recuperação para o Hospital Termal Rainha D. Leonor”, o CHCR procurou dar cumprimento ao apelo público lançado em 22 de Janeiro de 1985, consubstanciado na elaboração do projecto que propunha instalar em dois edifícios, concretamente, nos Pavilhões D. Carlos I e na Casa da Cultura, um estabelecimento hoteleiro termal de 4*, incluindo “health center” e um empreendimento de animação cultural, respectivamente.

Atendendo ao facto de a água mineral natural constituir, neste contexto, o Bem essencial, em 7 de Fevereiro de 1995, foi assinado um contrato com o Estado, através da Secretaria de Estado da Indústria, para atribuição ao CHCR, de uma área para exploração de água mineral natural para fins termais, no qual está contemplada a obrigação do concessionário, de “Desenvolver outras iniciativas conducentes à expansão do termalismo nas Caldas da Rainha, promovendo, designadamente, a criação de uma clínica termal a explorar por terceiros, com base nos excedentes de água mineral produzida na área de concessão”.

Para a concretização do projecto, foi obtida a insubstituível participação da Direcção Geral do Turismo (DGT), que aprovou a localização tanto do hotel como do empreendimento de animação, depois de ouvidos o Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico (IPPAAR) e a Comissão de Coordenação da Região de Lisboa e Vale do Tejo, que, em Dezembro de 1995, deram pareceres favoráveis.

Oportunamente consultada, a Câmara Municipal das Caldas da Rainha (CMCR), não se pronunciou dentro do prazo estabelecido, apesar de ter sido solicitado ao seu Presidente, em carta de 27 de Julho de 1993, o seu melhor empenhamento no desenvolvimento contínuo e efectivo do projecto, considerando o seu interesse para o Concelho e para a Região. Assim, e nos termos legais, foi considerado pela DGT, que a CMCR nada teria a opor à localização do projecto. Por Despacho do Senhor Secretário de Estado do Turismo de 23 de Junho, publicado no Diário da República, II Série, n.º 152 de 4 de Julho de 1994, os Pavilhões D. Carlos I e o Clube de Recreio/Casa da Cultura, foram declarados, a título prévio, de Relevante Valor Arquitectónico e Histórico-Cultural.

Na circunstância, foi também preciosa a participação da Região de Turismo do Oeste (RTO), da Direcção Geral das Instalações e Equipamentos da Saúde (DGIES) e de um grupo de trabalho criado institucionalmente, cujo contributo foi por demais valioso, tendo em vista a caracterização da proposta apresentada. O projecto, elaborado a custo zero, contendo todos os elementos necessários, incluindo o caderno de encargos, o anúncio e o respectivo programa de concurso público, mereceu, como acima referido, o Despacho de concordância do Senhor Secretário de Estado da Saúde.

Não estava então em causa, a continuidade da integração do Hospital Termal Rainha D. Leonor na esfera do SNS.

A arrogância que inviabilizou o prosseguimento do processo e depois…

Depois da arrogância que inviabilizou o prosseguimento do processo em causa, tanto a Direcção Geral de Turismo (DGT) como a Região de Turismo do Oeste (RTO), através dos seus legítimos representantes, manifestaram formalmente a sua preocupação pelo facto de, “do ponto de vista Turístico, se perder a oportunidade de concretização de um espaço termal Saúde/Turismo privilegiado, por reunir, no panorama das Termas Portuguesas, um lugar de destaque” e, na expressão do Ex.mo Presidente da RTO, pelo que “significa de inovador, de criador de uma nova filosofia de hotelaria termal”

Decorridos quinze anos, a problemática do Termalismo nas Caldas da Rainha continua a aguardar a resolução que seja consentânea com a salvaguarda dos valores históricos que enobrecem a nossa comunidade fundada no século XV com uma intenção de reforma, de inovação no domínio assistencial e social, facto que deverá ser o orgulho do nosso Concelho, tal como o é de todo o País.

O assunto é por demais relevante, considerando a complementaridade que é possível estabelecer entre a Cidade Termal e as restantes fontes de atracção turística da nossa Região. Lembremos a sua localização na zona central do País, próxima da área metropolitana de Lisboa, a proximidade das praias, a sua inserção numa zona de turismo privilegiada que contempla Óbidos, Nazaré, Alcobaça, Batalha, incluindo o circuito turístico que conduz a Fátima.

A sua acessibilidade favorece o acolhimento das pessoas provindas do Centro e Sul do País para quem a maioria das Estâncias Termais, situadas a Norte, é menos atraente. A captação do mercado internacional é uma possibilidade estratégica indiscutível, tal como a própria História o confirma.

Alguns comentários sobre o Estudo do ISCTE

Como cidadão comum, nascido nas Caldas da Rainha, permiti-me rememorar aquele dos projectos que, tendo sido iniciado na década de 1980, melhor conheço. Para tanto, considerei o incentivo que está contido no Relatório Final do ISCTE – IUL, no âmbito das Propostas da Sociedade Civil Caldense, entre outras,”o admitir, com mais ou menos entusiasmo, uma Concessão dos Pavilhões, com ou sem Edificação Nova, a entidade privada”. Esta é uma virtude, de entre aquelas que o Estudo nos apresenta, quando convoca os caldenses para uma participação efectiva nos debates que vierem a público.

Do que “fica escrito”, devo assumir desde já o meu compromisso: admito, não com menos mas com mais entusiasmo, uma concessão dos Pavilhões, sem Edificação Nova?

Sendo relevantes os méritos do Estudo, é desejável, por isso, que seja o último, sinal de que as propostas nele contidas, mereceram, com os necessários ajustes, o “ímpeto dinamizador” que o mesmo Estudo impõe às Instituições mais directamente responsáveis pela sua concretização.

Os primeiros capítulos do Estudo são inteiramente pertinentes, no entanto, algumas das considerações aí produzidas, carecem de rigor, talvez por insuficiência da informação obtida.

O movimento assistencial do Hospital Termal, no decorrer do século XX, viveu três períodos diferentes: até meados da década de vinte, o número de Doentes tratados variou entre quatro e cinco mil; o segundo período prolongou-se até 1976, tendo o Hospital tratado anualmente entre três a quatro mil Doentes. É o período de estagnação do Hospital. Nem a abertura durante todo o ano, a partir de 1963, teve efeitos imediatos sobre a procura; o terceiro período desenvolve-se a partir de 1976, ano em que foram tratados 4692 Doentes.

O acréscimo do movimento assistencial a partir de 1976, ficou a dever-se em parte ao aumento da frequência termal em Portugal, motivado ainda pelo início da comparticipação financeira na estada nas estâncias termais, por parte dos Organismos da Segurança Social. Após este ano, seguiu-se um crescendo de frequência, que culminou, no final da década de 1980, no tratamento de mais de 9.000 Doentes, demasiados para o espaço físico disponível.

Em 1995 foram tratados 8131Doentes, dos quais 3102 permaneceram no próprio internamento que existia no Hospital Termal e 5029 frequentaram a Estância por via do ambulatório. No mesmo ano de 1995, os Doentes tratados no Hospital Termal foram provenientes de dezanove distritos do País e do total, 3055 fizeram tratamentos pela primeira vez (270 no internamento e 2785 no ambulatório).

Sendo assim, é inapropriado afirmar-se no Estudo, que “Durante estes cerca de sessenta anos, [desde 1950 a 2008/2009] as Termas das Caldas da Rainha, não acompanharam o Renascer das Termas a partir de meados da década de 1980, com grande e singular destaque para o caso, quase único, das Termas de S. Pedro do Sul”; precisamente, as Termas das Caldas da Rainha, em termos de frequência e na década de 1980, foram as segundas do País, logo a seguir às de S. Pedro do Sul, situação que se manteve até ao encerramento do Hospital e da Estância, em 30 de Janeiro de 1997, por motivo da contaminação bacteriológica da rede de distribuição da água mineral natural. A esta fatalidade, junta-se agora a cruel afirmação de que “Vários indicadores apontam para o facto do Hospital Termal só não encerrar, por pertencer ao Estado”. Tão grave depreciação não acrescentou mérito ao Estudo e, por inadequada, bem poderia ter sido dispensada.

Uma vez debelada a contaminação bacteriana, era expectável que a frequência termal aumentasse progressivamente, considerando o crédito estabelecido, por razão do reconhecido valor terapêutico da nossa Água Termal. É um facto que, no decorrer da primeira década do século XXI, o Hospital Termal acolheu, no máximo, 1775 Doentes, no ano de 2006. Nas nossas Termas, talvez não haja memória de uma tão baixa frequência.

Cinco acções para o Projecto Integrado

O Capítulo IV do Relatório Final, contém o ponto que domina todo o Estudo: nele se encontram caracterizadas as cinco acções que compõem o denominado “Projecto Integrado”. As dúvidas e/ou discordâncias que a sua apreciação suscita, não deslustram as linhas mestras traçadas, que orientam o percurso, tal como está concebido.

A análise SWOT, contida na página dez do Relatório, merece particular referência: as forças e as oportunidades contrastam com as fraquezas e as ameaças. Na circunstância, será oportuno seguir o conselho de Sun Tzu (500 A.C.): “Concentre-se nos pontos fortes, reconheça as fraquezas, agarre as oportunidades e proteja-se contra as ameaças”. Esta sabedoria, para ser posta em prática, exige, no plano interno, organizacional, uma plena identificação com os objectivos que se pretende alcançar, sem descurar a prevalência da perseverança, da boa fé, e da confiança mútua, a prosseguir em todas as etapas de execução do Projecto.

Neste sentido, o Estudo estabelece a correspondente dinâmica, graduando as sucessivas diligências que urge empreender, responsabilizando sobretudo os parceiros a quem cumpre desencadear e promover o mesmo Projecto.

O Estudo vem assim assumir um papel equivalente ao da “troika”, ditando do exterior o que deve ser feito cá dentro, insistindo para “as partes interessadas entenderem que nada de verdadeiramente bom se fará para valorizar o Património do Hospital Termal, se não criarmos esta Parceria”.

Com certeza que a sociedade civil caldense não deixará de apoiar este ditame, que tem como principais destinatários o Estado, ou seja, o Centro Hospitalar Oeste Norte (CHON) e o Município, que representa a Comunidade.

Caldas da Rainha deve a sua existência ao Hospital Termal

Caldas da Rainha deve a sua existência à Fundação do Hospital Termal, inédita no Mundo; foi também nesta Cidade, de tão recuadas tradições no domínio hospitalar, que foi criado o primeiro Centro Hospitalar do País, o Centro Hospitalar das Caldas da Rainha, (Decreto-Lei n.º 84/71 de 19 de Março), destinado a integrar os estabelecimentos hospitalares aqui existentes. Desde a década de setenta, os ajustamentos sucessivos do quadro de Pessoal do CHCR, dotaram-no com os recursos humanos qualitativamente adequados, a fim de dar resposta às crescentes responsabilidades, que são as resultantes da sua progressiva e irreversível diferenciação. Esta circunstância, deu ensejo à integração no seu quadro comum, de áreas funcionais as mais adequadas ao desempenho da sua missão assistencial.

No quadro de Pessoal do CHCR, formalmente aprovado pela Portaria n.º 541/96 de 3 de Outubro, figuram vinte e quatro Especialidades Médicas, de entre as quais se encontram e não por acaso, aquelas cujo exercício, numa perspectiva de complementaridade, se coadunam com os actos clínicos e terapêuticos, que se realizam no HT.

O Hospital Termal possui o Estatuto de Hospital Central Especializado, o único que, com a sua vocação, se encontra tutelado pelo Ministério da Saúde. Não se trata de uma designação honorífica, antes confere a garantia de que os Doentes não podem ser admitidos a tratamento sem a prévia e obrigatória avaliação médica, a qual, sendo especializada, assegura que as respectivas prescrições preenchem os critérios clínicos adequados, considerando as patologias de que os Doentes são portadores. A confiança firmada na eficácia terapêutica da sua Água Mineral Natural, fundamenta o recurso às técnicas de Crenoterapia, as quais, complementadas com as de Medicina Física e de Reabilitação, se encontram clínica e cientificamente certificadas, firmando a reputação do Hospital Termal das Caldas da Rainha.

O controlo bacteriológico da Água Mineral Natural, é realizado semanalmente e a sua composição físico-química avaliada com periodicidade estabelecida, de acordo com os programas anuais da Direcção Geral da Geologia e Energia (DGGE).

 Incursão retrospectiva sobre a história recente

Importava fazer uma incursão retrospectiva, incidindo sobre os factos que, nas últimas décadas, qualificaram e tentaram prestigiar o Termalismo nas Caldas da Rainha. O intuito é apenas o de propiciar à Sociedade Civil alguns elementos que favoreçam o seu esclarecimento sobre as circunstâncias que têm condicionado o desenvolvimento das nossas Termas.

É relevante que, no quadro do Estudo em apreço, seja excluída “a hipótese de, por opção política e/ou ideológica diferente da actual, a exploração do Hospital Termal poder vir a ser cedida a entidade privada, com ou sem ligação institucional ao CHON”. Esta intenção deve ser tida com determinação, mesmo reconhecendo que a sustentabilidade do funcionamento do HT, visando um Modelo de Gestão Autónoma, exige a ponderação que o próprio Estudo regista, em conformidade com os objectivos que lhe foram fixados.

O HT cumpre os preceitos do Termalismo Clássico que tem sido, afinal, o seu desígnio, satisfazendo ainda as exigências do denominado “Turismo Médico”. Deve ser tido em conta que, no HT, a medicinalização das Termas tem sido uma constante na sua evolução, mantendo as características que marcam o seu aparecimento pioneiro, acompanhando o movimento científico na esfera da sua actividade, de uma forma adaptada ao saber de cada época. Tem sido assim desde a sua fundação. Neste aspecto, a criação do CHCR concedeu ao HT um forte contributo, tendo em vista o encontro com um novo fulgor, científico e técnico. O inter-relacionamento assim estabelecido, encontra-se consolidado, sendo susceptível de ser aprimorado, no momento em que se pretende implementar a autonomia gestionária do próprio HT.

A continuidade da sua integração no Centro Hospitalar (CHON), não deve ser tida como um nó górdio, ainda que se reconheça que para o cortar, é necessário ir ao encontro de soluções as mais adequadas às novas circunstâncias, designadamente no aspecto da sua regulamentação, considerando não só a sua condição de Instituição Pública, como a especificidade da sua própria actividade. Esta medida deve ser tida como prioritária

De há muito tempo que vem sendo proporcionada a visita pública dos elementos patrimoniais relevantes que se situam no r/c do HT, com excepção dos banhos e seus anexos, que, quando em actividade, não podem ser incluídos, por rotina, nessa “utilização” nova. O que parece evidente visto de fora, tornar-se-á porventura perceptível, se os espaços forem visitados com o intuito de avaliação das condições que são o objecto do Estudo.

A Frequência das termas
 

 

 

A frequência das Termas gera uma população flutuante, que, para além da sua natureza sazonal, é influenciada, em contínuo, pelo ciclo das curas termais, que, para cada Utente, tem, em geral, a duração de duas semanas. Como antes mencionado, o apogeu da frequência no HT, ocorreu, em 1988, ano em que foram tratados mais de 9.000 Utentes. Num ambiente que se deseja naturalmente sereno, esse ano foi de alguma turbulência motivada pela elevada densidade humana num espaço que então se revelou exíguo. Estas circunstâncias podem constituir aviso, perante a pretensão de incentivar a procura de modo a prover os respectivos encargos.

Está escrito algures que o respeito pela tradição não deve envolver uma ideia anquilosante, mas constituir um motivo de reflexão.

Desde logo, a acção terapêutica da Água Mineral Natural das Caldas da Rainha, constitui, obviamente, o alicerce que dá fundamento a todas as diligências que permitam recriar a capacidade atractiva das nossas Termas, conforme a tradição demonstra de forma inquestionável.

A denominada Edificação Nova é tida pelo Estudo como indispensável, sendo considerada como um elemento essencial para a viabilização económico-financeira do Projecto Integrado, constituída por 120 unidades de alojamento destinado a uma finalidade turístico-residencial, leia-se, com o recurso à modalidade de utilização que caracteriza o time-sharing.

Considerando a expectativa de que a promoção do Empreendimento Multi Usos será viabilizada, com a eventual criação de mais-valias, através da venda em direito de superfície, por tempo determinado, das unidades de alojamento, é previsível que, das cinco modalidades mencionadas no Estudo, venham a ser privilegiadas a de cedência de utilização exclusiva à exploração turística, em [time-sharing?] com total transparência de obrigações e direitos; e a combinação de utilização e cedência à exploração turística, em [time-sharing?] com total transparência de obrigações e direitos.

O time-sharing, em princípio, não representa um investimento financeiro para o adquirente; em Portugal, pode ter uma duração mínima de 15 anos ou ser vitalício. Na circunstância é apropriado salvaguardar a total transparência de obrigações e direitos, sobretudo no respeitante à combinação de utilização e cedência à exploração turística,…de modo a evitar criar expectativas de rendimento que não se concretizam.

Quanto mais se avança na consideração das modalidades de utilização do Empreendimento Multi Usos e da sua viabilização, melhor se compreende o motivo do sublinhado da frase não vai ser fácil encontrar este parceiro privado, dada a dificuldade em justificar a rentabilidade do investimento.

A dificuldade resulta ainda mais convincente, face à insistência contida no pressuposto da sua promoção, segundo o qual, a primeira edificação é a reutilização dos Pavilhões do Parque e da Casa da Cultura, acrescentando que A razão desta imposição deve ser explicitada. Esta explicitação terá que ser muito bem fundamentada, de modo a persuadir o Promotor de que a reabilitação do edificado e a sua exploração futura, justificam tão vultoso investimento, provavelmente superior ao necessário para a Edificação Nova.

Os Pavilhões do Parque podem deixar de ser um problema, passando a fazer parte da solução?
 

 

Na Nota Prévia sobre a reabilitação dos Pavilhões do Parque, está escrito, em caixa, citando o Arquitecto Caldense Jorge Mangorrinha, que a sua reutilização deve ser realizada de forma “exemplar, útil e qualificada”. Esta exigência está consagrada no Estudo, sendo colocada ao Promotor como condição, antecedendo o início de qualquer outra obra indicada no Projecto Integrado, isto apesar de ser reconhecido que a Conservação/ /Reutilização dos Pavilhões do Parque “tem aspectos positivos, mas, globalmente, representa um passivo e um obstáculo”.

No Estudo, a utilização futura dos Pavilhões não está tão bem caracterizada quanto aquela que está destinada à Edificação Nova, sendo mesmo colocada a interrogação sobre a procura de uma solução tipo silver bullet, de modo a autonomizar, [no Projecto Integrado]:

.a Conservação/Valorização dos Pavilhões do Parque;

.a Promoção do Empreendimento Multi Usos.

Teríamos que procurar, no mercado nacional e internacional, uma proposta criativa e inovadora para a Conservação / Reutilização dos Pavilhões do Parque.

Em caso de sucesso, o Empreendimento Multi Usos não incluiria este elemento do Património e as condições da Concessão teriam de ser revistas

Esta sugestão, assim formulada, fornece, de facto, uma solução: os Pavilhões do Parque podem deixar de ser um problema, passando a fazer parte da solução.

Existe, no entanto, uma questão prévia incontornável: As peritagens efectuadas pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) aos edifícios dos Pavilhões do Parque, têm destacado a progressiva deterioração das suas estruturas. Aquela que foi efectuada em 1994, dois anos antes da DGT aprovar a localização nos Pavilhões, de um Hotel de 4* com health center, as deficiências apontadas, sendo relevantes, não eram impeditivas para a viabilização do projecto. Decorridos os anos, o espaço circundante dos Pavilhões está vedado ao trânsito pedonal!

Nestas circunstâncias, parece imperioso que seja efectuada uma avaliação técnica aprofundada, a fim de que seja firmada a possibilidade da sua reabilitação física, estrutural, tendo em vista uma utilização futura, designadamente, a sua adaptação a um estabelecimento hoteleiro.

Se esta avaliação técnica lavrar uma sentença negativa, sem perspectivas de recurso, então e muito a contra gosto, é devido reconhecer que os Pavilhões representam um efectivo obstáculo, providenciando-se o encontro de uma solução alternativa que viabilize a expansão do Termalismo.

Mas se, como é desde sempre pretendido, a utilização dos Pavilhões for realizável, poderemos então voltar ao final do Século XIX, para lembrar, por quantas vezes for necessário, a herança de Rodrigo Berquó, valorizando o projecto que concebeu e o Património que, em concordância, nos legou. O seu plano permite, passados 115 anos sobre a sua morte, perspectivar o futuro, conferindo-lhe o toque de modernidade e de inovação que a evolução do tempo nos impõe, preservando assim, as medidas que foram traçadas por Berquó, inclusive no respeitante ao objectivo de captar os estratos sociais mais favorecidos economicamente, os então designados “banhistas ricos”.

Que promotor Privado para o Hospital Termal?
 

 

 

Ainda que numa perspectiva diferente, o Estudo admite o caminho para uma solução: “procurar, no mercado nacional e internacional, uma proposta criativa e inovadora para a Conservação / Reutilização dos Pavilhões do Parque”.

A procura de um Promotor Privado deverá ser efectuada mediante concurso nacional e internacional, que, obviamente, contenha todos os elementos que definam a natureza e o objecto do concurso e todas as demais normas de procedimento que caracterizam um processo desta natureza. O objecto, na circunstância, terá que contemplar a adaptação dos Pavilhões do Parque e dos espaços envolventes que lhe estão atribuídos, bem como do Clube de Recreio/Casa da Cultura, ao modelo de exploração que melhor sirva o propósito do Projecto Integrado. E, no caso em apreço, a intenção não pode ser ambígua, antes claramente determinada. Com todo o respeito pelas opiniões diferentes, deverá ser destinada à concessão para exploração privada, por tempo determinado, envolvendo a localização de um estabelecimento Hoteleiro Termal e de um Empreendimento de Animação, respectivamente.

A notável volumetria do edificado, tendo em consideração o seu Valor Arquitectónico e Histórico-Cultural, representa um desafio que, sendo lançado, será com certeza aceite pelos potenciais Empreendedores, os quais, por associarem a colaboração de Profissionais Especializados, se encontram inteiramente identificados com as exigências estruturais, técnicas e organizativas, que caracterizam o moderno Termalismo, nomeadamente, a localização das instalações e dos equipamentos indispensáveis para a sua promoção idónea, competitiva. Se o mesmo concurso tiver o esperado sucesso, estarão criadas as condições para a apreciação das propostas e subsequente aprovação daquela considerada a mais criativa e inovadora.

No plano do Termalismo, o Hotel Termal corresponde ao objectivo de promover a qualificação e o aumento da frequência da Estância Termal, dada a sua condição de estabelecimento residencial que recebe hóspedes em permanência variável, realidade que se enquadra nas exigências impostas pela mobilidade, pelos padrões de procura e de utilização, em função das necessidades da população considerada.

O HT, numa perspectiva de sustentabilidade e de competitividade em mercado aberto, através da inovação e da melhoria dos seus serviços, necessita do pleno uso dos espaços hospitalares. O imperativo categórico de compatibilizar a quantidade e a qualidade, suscita a dúvida sobre se o espaço físico disponível será suficiente para acolher o número de Utentes necessário para assegurar a esperada sustentabilidade económica e financeira do HT.

No entanto, nesta perspectiva de aumento substancial da procura Termal e perante a exigência de uma gestão pública e autónoma do HT, a sustentabilidade do seu funcionamento ficará melhor assegurada se forem estabelecidas condições de relacionamento privilegiado, de complementaridade, no domínio do apoio clínico e terapêutico, entre o HT e um Hotel Termal, de modo a assegurar a todos os Utentes, as adequadas condições de acolhimento, que permitam oferecer em todas as estações do ano e de forma coincidente, o tempo dedicado à “cura Termal” e os tempos de Saúde/Lazer que a frequência das Termas proporciona. Existem actualmente condições físicas instaladas, que permitirão que os Utentes do Hotel usufruam da vantagem de acesso ao HT e ao Balneário Novo, sem necessidade de passar pelo espaço público.

Afigura-se assim menos difícil justificar a rentabilidade do investimento a realizar, tanto na adaptação dos Pavilhões a estabelecimento hoteleiro termal e sua exploração, incluindo os espaços envolventes que lhes estão atribuídos, com Spa/Balneário moderno e Day/Spa, como na adaptação do Clube de Recreio a um centro de animação cultural e social e sua exploração.

Neste contexto, a necessidade de uma nova Edificação justificar-se-ia, mas num enquadramento muito diferente: se a reabilitação estrutural dos Pavilhões se revelasse tecnicamente impossível de realizar, ou se o estudo de viabilização económico-financeira deste Empreendimento conjunto, não viesse a confirmar as esperadas vantagens da sua contínua exploração, factos que desejamos se revelem, de todo, improváveis.

Será com certeza dispensável referir que as acções a promover só poderão ter sucesso, se os principais decisores reatarem relações formais com as Instituições e as Entidades que têm por missão tutelar e/ou participar na orientação de projectos de índole Ambiental, Geológica, Patrimonial, Termal e Turística. Neste domínio, o rol é extenso.

Mas é sobretudo indispensável que, a nível local, os decisores principais cumpram o verdadeiro contrato de parceria, que lutem pela concretização de objectivos de interesse comum, os que representam, tão-somente, um benefício essencial para as populações que se obrigaram a servir. Porém, nunca o(s) contrato(s) de parceria a subscrever, deve(m) conter no seu articulado, qualquer item que possa indiciar a outorga de uma qualquer parcela do Património, natural ou edificado, afecto ao CHON.

Persistirá a interrogação: “Projectos parcelares, projecto global, serão só compromissos que não se cumprem?… Seguindo o bom conselho contido no Estudo, teria muito significado se, pelo menos, os protocolos a celebrar entre o Estado e o Município, no âmbito do Projecto em apreço, fossem subscritos por ambas as partes, no decorrer das Solenidades Comemorativas do V Centenário do “Livro do Compromisso”, assinado pela própria Rainha D. Leonor, em 18 de Março de 1512. Representaria, de facto, uma forma perene de firmar mais um compromisso, o de se cumprir o prosseguimento das acções que, numa linha de coerência, permitam a revalorização dos mútuos interesses que envolvem a Urbe e o seu Hospital Termal.

Neste aspecto, não é demais realçar, o mesmo Estudo contém os argumentos e os incentivos que responsabilizam sobremaneira aqueles que representam os principais interessados. Esta circunstância, só por si, confere-lhe merecimento.

Considerando os antecedentes, o desígnio deve ser o de pugnar para que o prognóstico, sendo à partida tão reservado, tenda a evoluir, finalmente, para a fase de resolução de tão momentoso assunto. Para tanto é indispensável o citado “ímpeto dinamizador”.

Mário Gonçalves

PS – Os subtítulos são da responsabilidade da redacção.

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