Guilherme José
Livreiro “Malfeitor”
A política, na minha perspetiva, caiu redondamente numa crise que deve ser entendida, em última análise, de acordo com uma matriz metafísica, ou seja, segundo instâncias que aparentemente ocorrem por detrás da experiência quotidiana. Para todos aqueles, quase todo o Ocidente, que tendem a achar que só a componente material e financeira importa realmente no que diz respeito à política e ao modus operandis, seria bom que dessem uma especial atenção ao pensamento Tradicionalista, Religioso e espiritual milenar, para além do punhado de julgamentos supérfluos que por norma se rotulam essas práticas.
No pensamento de um Tradicionalista, jamais repousa a ideia de que o elemento coletivo caminha sobre a força do evolucionismo ou do progresso. Pelo contrário, os tempos atuais são representativos da decadência e degeneração, uma vez que surgem mergulhados numa ideia de hiperindividualismo desenfreado, no qual o indivíduo se emancipa através da esfera meramente material. Isto é, na medida em que vê os seus caprichos realizados, as suas satisfações básicas sucumbem temporariamente até que outros desejos surjam em sua substituição e assim por diante. Podemos até mesmo dizer que é desse indivíduo fortemente viciado que se alimenta o neoliberalismo e o capitalismo. É do comportamento desleixado e da falta de autodomínio que esses mesmos sistemas subsistem.
Em qualquer Tradição, o elemento mundano é representado nos mitos cosmogónicos pela consequência da queda, e encerra-nos temporariamente na esfera mais baixa. É assim entre os Sufis, por exemplo, na via Sohravardîana, onde o plano físico-sensível (Mulk) é apenas o primeiro estágio. É assim ainda no Budismo Vajrayana, onde o mundo material, a esfera do devir, a roda de samsara, nos impede de ver o Dharma e despertar.
Agora, e no cenário atual estritamente secular, tanto as correntes políticas de direita como de esquerda restringem o indivíduo ao seu aspeto exclusivo de cidadão, e nenhuma delas lhe oferece a possibilidade de uma fuga do pensamento único e exclusivamente socioeconómico. Algo que não era comum nos primeiros teóricos de política, como Platão e Aristóteles, mas tornou-se vulgar com as correntes pragmáticas de Maquiavel e Hobbes. Tão vulgar ao ponto de, para o cidadão comum ocidental, a matéria e a realidade externa serem agora a única realidade possível e viável, o único meio no qual valem todos os esforços e fins. ■

































