Joana Beato Ribeiro
Arquivista
Prometi uma pequena viagem pela história e pelos arquivos, por isso hoje escrevo sobre o nascimento da minha paixão por documentos, que se confunde com o exato momento em que percebi a importância que eles têm para a aturada conceção patrimonial de pertença, identidade. A certeza de que não podia deixar de fora o tema desta crónica foi-se afirmando ao longo da última semana e tornou-se clara quando vi, na TV, a atuação do Rancho Folclórico e Etnográfico do Reguengo da Parada, na Madeira. Todos aqueles rostos familiares, de pessoas que admiro e cuja força de trabalho e entrega à comunidade conheço, fizeram-me sentir, através desse mar de distância, que parte da minha história estava ali a ser cantada e dançada, ou não tivesse sido, também, por baixo das oliveiras dessa aldeia que os meus avós, Josefa e Francisco, travaram conhecimento.
Pode parecer que me estou a desviar do objetivo, mas não, de todo: o primeiro arquivo que reuni e ao qual procurei dar sentido, foi o do meu avô, Francisco João Beato (1929-2016).
Quando perdi o meu avô, tive a certeza de que deveria resgatar todas as peças de um pequeno quebra-cabeças que, a longo prazo, seria reconstituir a sua vida. Com ajuda, vasculhei em tulhas antigas, reuni tudo o que consegui. Livros de contas, alguns documentos e objetos pessoais. Tudo o que, a meus olhos, me aproximasse do seu negócio e daquele homem que foi um para mim, mas que, como no livro de Luigi Pirandello, pode ser ninguém ou ainda cem mil para outros – o moleiro, o vendedor/ comerciante, o taberneiro, o excursionista, o fadista, o dançarino, o agricultor…
Ainda não retirei deste conjunto documental todo o potencial da sua informação, da sabedoria do meu avô aí reunida, mas hoje sei muito mais sobre a minha história familiar e essa pesquisa, lenta, complexa e cheia de pessoas e contributos preciosos, tem sido o meu alimento para continuar.
Trabalhar com este e outros arquivos, tem-me feito, não só dar corpo à minha identidade, mas procurar ajudar familiares e amigos a definirem as suas. Muitos têm recebido mensagens minhas, quando passo pelos seus apelidos entre documentos (espero que me perdoem!). Isto mesmo aconteceu, por exemplo, quando, em julho passado, visitei o Museu Marítimo de Ílhavo e tive acesso ao seu portal “Homens e Navios do Bacalhau”, em que encontrei muitos caldenses. Se tiverem curiosidade, recomendo a pesquisa online.
Aos meus Avós, agradeço e deixo uma singela homenagem, por terem criado em mim o amor às histórias e às pessoas que nos rodeiam.

































