Muitas revoluções começam com uma “vaga de fundo”, um movimento que vem da base da sociedade e que aos poucos vai tomando força e dimensão tais que acabam por impor ao mundo um novo regime, novas mentalidades, novas moralidades, uma nova visão da vida.
Foi o que se passou, primeiro no mundo ocidental e, depois e ainda, em inexorável expansão mundial, com a relação entre as mulheres e o trabalho.
As novas realidades resultantes das profundas transformações sociais e económicas trazidas pela Revolução Industrial, em especial a procura de mão-de-obra para as fábricas, abriram o mundo do trabalho às mulheres, que assim saíram dos seus limitados “reinos” domésticos. A par das dificuldades que as levaram a ajudar à subsistência da família, quando os seus homens (pais, maridos, filhos) não tinham trabalho ou quando os salários não eram suficientes para alimentar todas as bocas da casa.
Para os donos dos meios de produção, as mulheres eram vistas com machista desconfiança, em especial se se candidatassem a trabalhos até aí exclusivos dos homens. Esses pruridos só eram compensados pelo facto de as mulheres serem, afinal, mão-de-obra mais barata. Durante muitos anos, para o mesmo trabalho, o homem foi (e, em larga medida, continua a ser) mais bem pago do que a mulher, com base no preconceito de que a sua produtividade era menor, por ser fisicamente mais fraca ou porque tinha de suportar a maternidade.
Com a 1ª e a 2.ª Guerras Mundiais, face à necessidade de substituir nos postos de trabalho os homens que haviam partido para a guerra, as mulheres têm a “oportunidade” – certamente, em muitos casos, a contragosto – de assumir-se como candidatas ao mercado de trabalho. Lugar que já não vão deixar mais. A acrescer a este fenómeno, as mulheres vieram demonstrar que nalguns trabalhos, nomeadamente se exigindo mais concentração e habilidade manual, eram tão boas ou mesmo superiores aos homens.
Atualmente, em Portugal, as mulheres são a maioria da população empregada. Só falta, ainda hoje, respeitar a justa máxima “a trabalho igual, salário igual”, pois as estatísticas continuam a demonstrar que o salário médio das mulheres ainda não igualou o dos homens. Neste aspeto, lamentavelmente, Portugal continua a ser dos países da Europa em que é maior a diferença entre os salários de homens e de mulheres.
Outro fator incontornável, pela enorme influência que veio impor ao papel familiar e social da mulher e, por esta via, ao mundo do trabalho, foi a generalização do planeamento familiar. Os métodos contracetivos, práticos e eficazes, que rapidamente entraram nas rotinas dos casais, libertam a mulher da “obrigação” da maternidade, revolucionam a composição das famílias e os seus valores, e abrem definitivamente a porta de entrada das mulheres no mercado de trabalho.
Esta nova liberdade, esta emancipação das mulheres, veio “empurrar” os homens para as tarefas domésticas até aí exclusivas, ou quase, das mulheres, como cozinhar, cuidar dos filhos e dos velhos. Uma nova revolução de mentalidades está já em curso. O tempo está a fazer o seu trabalho.
Sem ser necessário fazer futurologia, é previsível que, nas próximas gerações, mulheres e homens, no que respeita à sua preparação e inserção no mundo do trabalho, se distingam apenas fisicamente (“Vive la diference!”) e não por um conjunto de preconceitos que estabelecem o que é que, na família, profissional e socialmente, compete a cada um.
João Godinho Soares

































