Trabalho igual, salário igual?

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Gazeta das Caldas

O princípio enraizado de “trabalho igual, salário igual” emana do princípio constitucionalmente consagrado da igualdade, e significa que o empregador deve pagar a mesma retribuição aos trabalhadores que exerçam funções idênticas, sem discriminações infundadas.
Porém a aplicação do versado postulado não se demonstra tão linear quanto isso, devendo o mesmo ser interpretado com cautela e considerando o circunstancialismo de cada caso em concreto, podendo dessa forma sofrer algumas limitações no seu âmbito.
A aplicação do princípio trabalho igual, salário igual, consagrado nos artigos 59.º n.º 1, al. a), da CRP e 270.º do Código de Trabalho, pressupõe que sejam tidas em consideração a quantidade (duração e intensidade da prestação laboral), natureza (dificuldade, grau de penosidade ou perigosidade) e qualidade do trabalho (exigências técnicas, prática e capacidade do trabalhador), significando assim, que será admitida e plenamente justificada, a atribuição, pela entidade empregadora, de salários diferentes a trabalhadores da mesma categoria profissional, desde que existam diferenças na efetiva prestação de trabalho, em razão de um ou mais dos mencionados fatores.
Fatores esses que se devem pautar pela objetividade, deixando compreensivelmente de lado, toda e qualquer discriminação negativa do trabalhador. Nesses termos só existirá violação do princípio, quando a diferenciação salarial assente em critérios meramente subjetivos e supérfluos, conotados com as qualidades intrínsecas dos trabalhadores, sem qualquer implicação com a empresa em si, como por exemplo a efetuada em função do sexo.
O mesmo não sucederá quando se tiverem por base fatores relevantes para a empresa e sua laboração, exemplos disso serão a antiguidade, o nível de produtividade ou a própria qualidade do trabalho efetuado. Fatores que exigem que se faça uma distinção positiva, que acrescentam um plus à empresa e demonstram que aqueles trabalhadores em concreto, e de forma objetiva, se diferenciam dos seus pares. Há-que ter assim em consideração, como supra já foi frisado, o respeito pelo princípio da igualdade, vertido no artigo 13.º da CRP e desenvolvido no artigo 59.º, nº 1 da mesma Lei Fundamental, reportando-se o mencionado artigo a uma igualdade material, e não meramente formal, e concretiza-se na proscrição do arbítrio e discriminação, devendo assim tratar-se por igual o que é essencialmente igual e desigual o que é desigual! Só nesses termos será admitida a diferenciação salarial, sendo possível obter a justiça material, que surge como pedra angular do nosso ordenamento jurídico.

Será ainda de salientar, que o trabalhador que se sinta alvo de discriminação ao nível salarial, terá, nos termos do artigo 23º, nº5 do Código do Trabalho, de fundamentar a sua situação comparativamente com os restantes trabalhadores na mesma condição, porém não terá de alegar e demonstrar factos relativos à natureza, qualidade e quantidade das prestações laborais em confrontação, pois que, provados os factos que integram o invocado fundamento, atuará a presunção de que a diferença salarial a ele se deve, invertendo-se, apenas, quanto ao nexo causal presumido, o ónus da prova.
Em suma, o empregador poderá promover legitimamente uma diferenciação salarial entre os seus trabalhadores, ainda que estes pertençam à mesma categoria profissional, efetuando trabalho semelhante, se aplicar critérios objetivos, ainda que com conta peso e medida tal como supra se explicitou, que sustentem de forma equitativa tal pagamento desigual. Nesses termos, não existirá qualquer violação dos direitos dos trabalhadores que legitime retaliação por parte destes.


Catarina Luís
Advogada
Lacerda Dias & Associados – Sociedade de Advogados, R.L.

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