
A paixão de Tiago Silva pela cultura dos Estados Unidos da América e o jeito que revela desde os 13 anos para restaurar automóveis e objectos antigos resultaram, no início deste ano, na abertura da oficina American Dream, no Campo. Este negócio explora um nicho pouco trabalhado em Portugal, mas muito em voga nos Estados Unidos. Nos primeiros meses Tiago Silva tem trabalhado mais na recuperação de automóveis, mas quer focar-se em tudo o que é vintage.
Aos 13 anos Tiago Silva começou a dar forma à arte de “transformar o velho em novo, e a sucata num exemplar digno de colecção”, descreve o próprio. Começou a fazê-lo como aprendiz de bate-chapa na oficina de um amigo da família, Jorge Gomes. Aí desenvolveu e aperfeiçoou os seus conhecimentos nessa área, mas para dar seguimento ao negócio da família, teve de abdicar para assumir com o irmão a gerência da Leandro dos Pneus, Lda.
Continuou, porém, a fazer restauros a pedido de amigos e a adquirir e a recuperar alguns clássicos para a sua colecção pessoal, como são exemplos um Ford Mustang de 1966, uma pickup de 1948 única em Portugal, ou um Chevy Roadster de 1928. Todos estes estão actualmente disponíveis para aluguer.
Na Leandro dos Pneus, Tiago Silva também tinha clientes a pedir-lhe para fazer restauros nos seus automóveis. “Rejeitava vários por falta de tempo, mas sentia que era um desperdício”, conta.
A concorrência crescente no mercado dos pneus levou-o a avançar com o novo projecto, como complemento da actividade na Leandro dos Pneus.
Assim nasceu, no início de 2016, a American Dream (sonho americano), para concretizar o sonho que Tiago Silva tinha de voltar à profissão inicial aliado à paixão pela cultura dos EUA, país que visita com frequência. Curiosamente, Tiago Silva recuperou também a ligação ao primeiro patrão, Jorge Gomes, que é hoje o encarregado da American Dream by Tiago Silva, Unipessoal, Lda.
O VINTAGE ESTÁ NA MODA
Abrir uma empresa deste género não foi um tiro no escuro. Além das solicitações de clientes e amigos, Tiago Silva adianta que já tinha percebido a existência de um nicho de clientes suficiente para gerar um negócio. A procura foi imediata e até está a superar as expectativas iniciais. “Não estávamos à espera do impacto que está a ter pois temos muitos carros actualmente e não era essa a ideia, era mais trabalhar os outros artigos”, revela o empreendedor.
A aposta nesses artigos ganha força porque “o vintage está muito em voga”, sustenta Tiago Silva, e porque a maior parte do que se encontra são réplicas feitas em fibra de vidro, que acabam por perder um pouco do significado. “Cada vez se procuram mais peças originais”, afirma.
A American Dream trabalha esta vertente de duas formas diferentes. Uma passa por restaurar objectos dos próprios clientes. A outra consiste em adquiri-los e vendê-los já restaurados. “Nos EUA gosto de ir a feiras, compram-se lá muitas peças que cá não existem, o material vem sobretudo de lá”, conta. Os lotes são o mais variados possível e o elo de ligação é serem antigos. Podem ser bicicletas, triciclos, brinquedos, geleiras, frigoríficos, extintores, bombas de gasolina, candeeiros, espelhos, toalheiros e outros artigos de decoração construídos com peças de carros ou motos. Tudo quanto se possa imaginar pode ser feito. Até um baú a partir da bagageira de um velho Chevy, ou uma secretária com a frente de um Jeep.
Tiago Silva não tem uma ideia do valor que investiu para montar o negócio, até porque muitas das ferramentas e maquinaria já as tinha anteriormente. Para montar a oficina teve de adquirir três elevadores e mais algum equipamento de bate-chapa. Também investiu num forte sistema de vigilância e segurança. De resto, a American Dream tem uma particularidade. Não é uma loja aberta ao público. Ali trabalha-se de portão fechado e o acesso é controlado e monitorizado. Aceder ao showroom só é possível com marcação.
A oficina dá emprego a cinco pessoas, duas delas colocadas através do Centro de Educação Especial Rainha D. Leonor. “A preocupação que tivemos foi dar emprego a quem não o tinha”, revela Tiago Silva.
Um dos problemas em encontrar mão-de-obra é a falta de especialização em áreas como bate-chapas, mecânica convencional e pintura.
Outra vertente de negócio que a American Dream quer começar a explorar é o aluguer de automóveis antigos para eventos, filmagens, ou ocasiões especiais. A frota já tem alguns carros e Tiago Silva está a preparar uma limusina Cadillac Fleetwood – o carro que o presidente John F. Kennedy utilizava.
A empresa vende ainda, através da Internet, peças de automóveis. “Por vezes é preciso comprar um carro só para utilizar peças e vende-se o resto, para rentabilizar”, explica Tiago Silva.
O objectivo da empresa é crescer em todas estas vertentes de negócio, pois na recuperação de automóveis antigos já atingiu a capacidade e tem lista de espera. “São trabalhos que, para serem bem feitos, ocupam muito tempo, requerem muita atenção e pesquisa e é preciso controlar bem todas as fases. Por isso não podemos fazer mais que três ou quatro por ano”, afirma.
UM VERDADEIRO PUZZLE
Contudo, a procura da empresa para o restauro de automóveis tem sido muito grande. O que acontece é que os coleccionadores não têm em Portugal muita escolha para recuperar ou fazer reparações nos seus clássicos. Muitas vezes acabam por recorrer a oficinas convencionais, onde estes trabalhos são deixados num segundo plano, por serem demorados e muito exigentes.
Quando Tiago Silva, que já era conhecido no meio, abriu a American Dream, rapidamente reuniu clientes. “O maior cliente é a Interclássicos, o maior vendedor de automóveis clássicos a nível nacional. Alguns dos carros têm sido restaurados ou revistos aqui antes de serem postos no mercado para venda”, diz Tiago Silva.
Restaurar um automóvel antigo é um desafio, um autêntico puzzle quebra-cabeças. É preciso desmontar tudo até ao último parafuso. Depois é preciso limpar, eliminar a ferrugem, zincar, cromar, pintar e voltar a montar tudo. Muitas vezes é preciso substituir parte da chapa, ou mesmo fabricar painéis inteiros, respeitando as linhas originais. E até fazer peças novas, porque são raríssimas ou já não existem mesmo.
“A pior coisa que me podem dizer em relação a um trabalho é que é impossível”, garante Tiago Silva, que logo trata de provar o contrário. Um dos exemplos da perseverança deste restaurador foi um automóvel que lhe chegou à mão para substituir o motor. O proprietário estava disposto a abrir mão do valor do automóvel ao colocar-lhe um motor diferente do original, porque não havia cabeça do motor para substituição. Ao fim de muita pesquisa e trabalho, foi fabricada uma cabeça nova e o carro saiu da oficina a trabalhar com o motor original.
Outra dificuldade com que se depara é quando existem restauros anteriores mal executados.
Tiago Silva já tem um bom rol de raridades que lhe passaram pela mãos. O mais antigo que reparou foi um Citröen B14, datado de 1926 e cujo revestimento da carroçaria é em napa em vez de chapa. Também já salvou da sucata um Buick de 1928, modelo do qual existem apenas oito exemplares em todo o mundo.
Recentemente saiu da oficina totalmente restaurado o carro de corrida Lotus 69 Formula 2 que pertenceu a Erneste “Néné” Neves, piloto de referência nos anos 60 e 70 em Portugal. “Foi um orgulho ter trabalhado nesse projecto pelo carro que é – foram fabricados apenas oito – e pela história que tem em Portugal pois sempre que foi para a pista ganhou”, refere Tiago Silva.
É possível consultar todo o trabalho da American Dream no website www.americandream.pt.































