“O Sindicato dos Maquinistas excepcionou os efeitos da greve na linha do Oeste”, diz António Medeiros

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António Medeiros, presidente do Sindicato dos Maquinistas (SMAQ), nega quaisquer responsabilidades na redução de passageiros na linha do Oeste devido às greves e acusa a administração da CP e o governo de quererem desmantelar o serviço público ferroviário de passageiros.
Numa curta entrevista, dada por escrito, à Gazeta das Caldas, o dirigente diz que excepcionou dos pré-avisos de greve a linha do Oeste, pelo que coube à CP a responsabilidade de suprimir os comboios nesta linha.

GAZETA DAS CALDAS – A greve ao serviço extraordinário decretada pelo sindicato a que preside tem como consequência que a CP suprima comboios regionais para assegurar serviços no longo curso. Esta prática continuada tem levado a uma debandada de clientes na linha do Oeste. Qual a posição do Sindicato dos Maquinistas em relação a esta realidade?
ANTÓNIO MEDEIROS – Considerando os argumentos da administração da CP, cumpre-nos sublinhar, com todo o rigor, que as mesmas correspondem a uma atitude de auto-desresponsabilização, porém sem correspondência à veracidade dos factos.
Em nota enviada pelo SMAQ à empresa, em Março de 2012, e em resultado de ter constatado que a administração apostava na greve e no arrastamento do conflito laboral, com a qual fundamentava a supressão de comboios nas linhas mais desfavorecidas da rede ferroviária, entre as quais a linha do Oeste, o sindicato excepcionou os efeitos da greve nesta mesma linha do Oeste, logo não se justificando a supressão de comboios (assim como aconteceu nas linhas da via estreita, Douro, Beira Baixa, Alentejo, etc.

GC – O governo assumiu o encerramento da linha do Oeste a norte das Caldas da Rainha em documento público (PET) em Outubro do ano passado. Um ano depois, mercê da contestação das populações e de autarcas, a linha mantém-se aberta. Mas é diminuto o número de comboios que nela circula em virtude das greves dos maquinistas. Receia que a linha acabe mesmo por encerrar? O encerramento da linha do Oeste é indiferente para o Sindicato dos Maquinistas?
AM – Verificámos, através de ofícios da administração a diversas entidades, a que o SMAQ teve acesso, que a desculpa continua a ser a convocação de greves na empresa, mormente pelo SMAQ. Mas porque sempre defendemos o incremento do Caminho de Ferro, sem ambiguidades, com melhor serviço às populações, pretendemos afirmar que presenciamos mais uma desculpa “esfarrapada” e falsa, dado que as causas da supressão de comboios são efectivamente:
a) Unidades motoras inoperacionais e/ou em número insuficiente, situação que resulta do negócio ruinoso feito pela administração da empresa com o aluguer das “automotoras espanholas” e abate imediato das UTD´s nacionais, sabendo que não tinha capacidade de resposta para o serviço de transporte nas linhas regionais não electrificadas;
b) Desvio de unidades motoras destinadas aos comboios diários da linha do Oeste e outras para a realização de comboios turísticos e outros;(
c)  Plano de supressão sucessiva de comboios regionais, desfasando horários e até desinteresse manifesto na sua realização, alguns deles com Maquinista, Revisor e Passageiros a aguardar a partida, sendo confrontados com a supressão injustificada e em desrespeito dos utilizadores, utilizando como “bode expiatório” a existência de greve dos Maquinistas;
d) Não correcção das escalas de serviço dos Maquinistas e respectivos horários, negando deste modo a criação de melhores condições de trabalho, importantes para garantir a circulação dos comboios.

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GC – O SMAQ ponderou a realização de greves mais “criativas” que não tenham como consequência a diminuição do já escasso serviço dos regionais em linhas como a do Oeste?
AM – Os Maquinistas têm por função nuclear a condução dos comboios, salvo algumas tarefas residuais. Logo, o exercício do direito à greve implicará sempre a supressão de comboios.
O Sindicato, deu mais um exemplo em que excepcionou os serviços regionais da greve de duas horas, no início do período de trabalho, designadamente na Linha do Oeste, de 1 a 4 de Outubro de 2012.

GC – Há quem considere que o SMAQ está ao serviço do governo ou de interesses menos claros ao permitir a supressão sistemática de circulações na linha do Oeste, ajudando a que esta encerre à míngua de clientes. Independentemente das escolhas da CP  – cuja actuação nesta linha nunca primou por uma gestão pró-activa de captação de mercado, antes pelo contrário – o SMAQ não considera que está a preparar o terreno ao gradual encerramento desta linha?
AM – Esta questão não pode, com honestidade, atribuir-se ao SMAQ. A actuação do SMAQ não permite qualquer tipo de dúvida ou especulação quanto à sua postura, em defesa do Caminho de Ferro e do serviço que deve assegurar às regiões e populações do país.
Chama-se, assim, a atenção para as centenas de quilómetros da rede ferroviária objecto de supressão por parte do Governo e da administração da CP, de acordo com o seu plano de desmantelamento do serviço de transporte ferroviário de passageiros, e até de mercadorias, sem que tenha ocorrido qualquer greve dos maquinistas para sua fundamentação. Por isso, o SMAQ só pode lamentar e repudiar tais comentários, considerando que as responsabilidades decorrem do poder de gestão e políticas para o sector, apenas pertencentes ao Conselho de Administração da CP e ao governo.
Por último, reafirmamos, como sempre, a disponibilidade, com os Maquinistas, para a realização de todos os comboios, designadamente os regionais, e pacificar as relações de trabalho na empresa, disponibilidade sempre manifestada à Secretaria de Estado dos Transpores e à administração da CP, pelo que se repudiam as falsas justificações transmitidas, que apenas pretendem criar “bodes expiatórios” para o seu plano de diminuição do serviço de transporte ferroviário de passageiros, em prejuízo do caminho de ferro com um  futuro melhor.

Carlos Cipriano
cc@gazetadascaldas.pt

Suprimidos 564 comboios em três meses

Entre Agosto e Outubro, devido às greves, foram suprimidos na linha do Oeste 564 dos 2560 comboios que deveriam ter sido realizados.
A informação é da CP que realça que os números do quadro acima “são unicamente supressões decorrentes das greves e não por outros motivos”.
Recorde-se que, num artigo publicado a 14/10/2012 no nosso jornal, o caldense e especialista em ferrovia, Nelson Oliveira, referia que o resultado da greve dos maquinistas tem sido “a sistemática supressão dos comboios de forma casuística e sem aviso prévio”, o que conduz ao afastamento das pessoas do modo ferroviário porque um dos factores mais dissuasores da procura de transporte é a incerteza e a falta de fiabilidade do serviço prestado.
O também autor do estudo sobre a linha do Oeste recordava ainda a forma como os municípios, o tecido empresarial e a sociedade civil da região se mobilizaram para evitar o fecho da linha, objectivo que foi conseguido, mas que está agora comprometido devido às greves.
“Muitas têm sido as atrocidades que, por negligência e incompreensão de sucessivas equipas de gestão do operador ferroviário, têm sido feitas à linha do Oeste, mas, se a linha encerrar com base em, agora sim, real ausência de procura, a machadada final só tem um responsável e um motivo: o Sindicato de Maquinistas”, escreveu na altura.
A administração da CP tem justificado a supressão de circulações no Oeste com a transferência de maquinistas para a condução de comboios Intercidades e Alfa Pendulares – em detrimentos dos regioinais – que têm mais procura e proporcionam maior receita.

C.C.

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2 COMENTÁRIOS

  1. Este título é claramente falacioso e deixa até entender que o sindicato de maquinistas é o capuchinho vermelho desta história, deixando o papel de lobo mau à CP. Desengane-se, pois, quem pensa que julga que o sindicato dos maquinistas não tem qualquer culpa na supressão de comboios nas linhas do regional
    A CP, como outras empresas, vive de trabalho extraordinário. A CP precisa de, pontualmente, trabalho extraordinário para garantir a totalidade da oferta dos serviços, neste caso Longo Curso e Regional. Como existe greve ao trabalho extraordinário, a CP prefere garantir os comboios do Longo Curso em detrimento do serviço regional. Goste-se ou não, é uma medida de gestão legítima, pois é daí que (ainda) vem algum dinheiro. Com as “sobras” de pessoal, faz alguns comboios do serviço regional.
    O sindicato dos maquinistas sabe que há mais de um ano está a fazer o jogo da empresa com este tipo de greve, que se ajusta como uma luva aos objetivos da CP, da tutela e do PET: não faz um serviço que lhe dá prejuízo (o Regional) e não gasta dinheiro em serviço extraordinário com os maquinistas. É, portanto, uma greve que a empresa agradece que se faça. Por muito que isso custe a muitos sindicalistas, associados e outros “fundamentalistas” que julgam estar a atingir a empresa. Desenganem-se, a CP agradece que assim se continue.
    Solução? Existe, sim. Levantando a greve ao serviço extraordinário, a oferta de serviço no Longo Curso e Regional seria cumprida na sua totalidade, os maquinistas (que quisessem, claro!) receberiam algum dinheiro “extra” por trabalhar em dia de descanso e a empresa teria de abrir os cordões à bolsa para pagar um serviço deficitário, mas que serve as populações que mais necessitam, e ainda pagaria dinheiro extra para garantir esse serviço.
    Obviamente que, para quem apenas consegue ver a árvore em vez da floresta, tudo isto parece complicado…

  2. Como maquinista que sou, e desalinhado com está estratégia de sobrevivência sindical preconizada pelo SMAQ que leva esta direção a tomar medidas de todo incongruentes e lesivas do interesse da própria carreira que representa para além do desprezo pelo interesse nacional e defesa das populações que querem e têm direito ao transporte ferroviário, deixo uma simples e ingénua pergunta ao incontestado líder sindical, a saber:
    – tal como deixou ao critério de cada maquinista fazer ou não greve no serviço regional em turnos de mais de oito horas (ideia peregrina que mais confusão acrescentou, ma medida em que as consciências não são todas iguais), porque não permite que se faça serviço extraordinário nessas linhas, caso os maquinistas o queiram fazer? E já agora, porque não proíbe no pré-aviso de greve que os maquinistas possam ser desafectados da sua escala de serviço e assim sejam deslocados do regional para o longo curso, fazendo o “frete” à CP?

    Como maquinista que tem feito muito serviço extraordinário nesta linha, ainda que isso me tenha trazido o ostracismo de colegas de trabalho alinhados com esta direção sindical, peço desculpa e perdão a estas populações que têm sido vítimas de tão infames “lutas”…