Este ano a colheita de ginja em Alcobaça e Óbidos registou pouca quantidade, mas muita qualidade. Há quem atribua este facto aos ciclos naturais, mas também quem aponte às alterações climáticas e às pragas importadas quando se plantam árvores de espécies não autóctones. Apesar da baixa quantidade, são unânimes em afirmar a alta qualidade do fruto que dará origem ao tão apreciado néctar
“Estou ligado às ginjas há 22 anos e nunca houve um ano tão mau”, lamenta-se Vasco Gomes, da Ginja M.S.R., da David Pinto & Companhia, empresa que tem quatro hectares com um total de 3000 ginjeiras com 17 anos no Sobral da Lagoa (Óbidos) e cuja unidade produtiva se localiza em Alcobaça, bem perto do Mosteiro, num edifício construído para esse fim em 1950. Em termos comparativos, analisa, a colheita será “cinco vezes mais baixa do que no ano passado e 12 vezes mais baixa do que a de há dois anos”.
Entre os motivos por trás desta quebra de produção Vasco Gomes aponta não apenas a um, mas sim a uma junção de incidentes. À cabeça alerta para as alterações climáticas e para o facto de as tradicionais quatro estações se esbaterem. “A ginja precisa de horas de frio no Inverno”, faz notar. À falta de horas de frio suficientes no Inverno juntaram-se os meses de Fevereiro, Maio e Junho mais quentes desde que há registo e os muito chuvosos meses de Abril e Maio, seguidos de temperaturas altas. Tudo isto contribuiu para a quebra, uma vez que devido ao calor e ao excesso de água a árvore protege-se, criando mais folhas e deixando cair o fruto.
Mas esta não é a única explicação. É que “nos últimos dois, três anos apareceram novas pragas e doenças”, que presume que sejam resultado da importação de árvores de qualidades de ginja de outras partes do mundo. “Isto pode, no futuro, levar ao fim da já pouca produção”.
Este empresário diz mesmo que muitos dos micro-produtores da região não apanharam fruto este ano porque estava atacado pela praga. No seu caso, salienta, a quebra não esteve relacionada com doenças ou pragas, até porque só produz a variedade Folha-no-pé, que “está totalmente adaptada à nossa região”.
Vasco Gomes realça ainda assim a qualidade da pouca ginja apanhada no seu pomar, que está a caminho da certificação biológica e onde não se utilizam insecticidas.
Relativamente à comercialização, o outro lado do negócio, admite que este é “um ano com muitos desafios, a Covid fez baixar drasticamente as vendas”. Ainda assim, nos meses de Julho e Agosto já sentiu um ligeiro retomar, sendo que “vai demorar a atingir os níveis anteriores”, admitindo que “os próximos dois anos não vão ser fáceis neste sector das bebidas espirituosas”.
Comparativamente com o último ano regista quebras nas vendas entre os 50 e os 60%. A pandemia obrigou também a adiar os festejos dos 90 anos do registo da marca, que se comemoram este ano.
ESPERAR QUE O MERCADO VOLTE A ANIMAR
Marta Pimpão, da Ginja de Óbidos Oppidum, corrobora que este ano praticamente não houve campanha porque não havia fruto. “É relativamente normal”, assegura, fazendo notar que é algo cíclico. “Não é normal se continuar”, afirmou.
A empresa não tem ginjeiras próprias e continua a trabalhar como sempre o fez: a comprar a ginja a cerca de uma centena de produtores da região. Trata-se de uma tradição que foi iniciada há várias décadas e que se vai mantendo de geração em geração. Apesar de um ano mau em termos de colheita, a empresa tem os seus stocks assegurados porque nos anos em que existe muita ginja compram mais do que necessitam, para criar reserva. “Trabalhamos com fruto com, no mínimo, um ano em álcool e agora estamos a trabalhar com fruto há cinco anos em álcool”.
Este é um ano complicado para a empresa. “Não é um ano espectacular e não estamos a vender imenso, esperamos que o mercado volte a animar”, afirmou Marta Pimpão, salientando ainda assim que a empresa tem uma gestão cautelosa, o que permitiu atravessar esta fase sem despedimentos e sem que os salários dos trabalhadores fossem afectados.
A facturação da empresa tem vindo a crescer nos últimos anos, a um ritmo entre os 5 os 10%. A empresária estima que este ano as quebras “vão ser grandes” e admite que estão “preocupados, mas não em pânico”, até porque a empresa tem tudo pago, sem dívidas.






























