A Caixa Central demitiu a administração da Caixa de Crédito Agrícola das Caldas da Rainha, Óbidos e Peniche e colocou dois administradores a gerir os destinos deste banco regional.
Em causa está uma súbita inversão dos resultados, que eram positivos, para prejuízos de 1,4 milhão de euros em 2013, bem como uma alegada incompatibilidade de anteriores administradores e desentendimentos entre os próprios órgãos sociais.
A gestão directa da Caixa Central tem um prazo de um ano até que seja reposta a normalidade na Caixa Agrícola. Dos seus órgãos sociais, só a mesa da Assembleia Geral continua a funcionar, estando marcada uma reunião para 15 de Dezembro.
De 2012 para 2013 a Caixa Agrícola passou de lucros no valor de 662 mil euros para prejuízos de 1,4 milhões de euros. Parte desses resultados negativos são explicados por imparidades, ou seja, pela perda de valor dos seus activos, o que significa que casas, armazéns, lojas e outros imóveis que a Caixa possuía, passaram a valer menos, o que teve impacto negativo no seu balanço. Por outro lado, há crédito malparado, situação que é idêntica à da restante banca portuguesa.
Apesar de, simplisticamente, estes prejuízos terem uma origem contabilística – e por imposição do Banco de Portugal que obriga os bancos a constituírem mais reservas nestes tempos de crise – a situação foi suficientemente grave para que o Conselho Fiscal da Caixa Agrícola das Caldas da Rainha, Óbidos e Peniche passasse a olhar com mais atenção para as contas e nelas descobrisse indícios de má gestão.
E não só má gestão, como uma alegada incompatibilidade de um dos administradores, Luís Ganhão, por ter empresas suas a fazer obras para a própria Caixa de Crédito Agrícola.
Um parecer de um especialista em Direito Societário da Universidade de Coimbra – que foi contundente ao declarar que os factos averiguadas indiciavam incompatibilidade de funções -, levou o Conselho Fiscal a propôr a substituição desse administrador.
Um processo que chegou a ter o aval do Banco de Portugal, mas que foi ultrapassado pela Caixa Central que, após realização de uma auditoria, concluiu pela suspensão da administração (presidida por José Tibúrcio Sobreito). No seu lugar nomeou dois administradores enviados de Lisboa para as Caldas, a fim de tomarem conta da Caixa Agrícola local.
Contactada pela Gazeta das Caldas, a Caixa Central respondeu através de uma agência de comunicação, que a intervenção em curso “decorre com toda a normalidade” e que visa “garantir as necessárias condições de estabilidade para o exercício da instituição”.
Os dois administradores – Nuno Bartolomeu Cordeiro e Ana Fiúza Martins – devem agora “proceder a uma avaliação do modelo de funcionamento da Caixa e promover as reestruturações que sejam consideradas adequadas ao bom e regular funcionamento da instituição”.
A mesma fonte oficial diz que estas intervenções da Caixa Central não são frequentes e ocorrem apenas quando necessárias no âmbito da monitorização que é feita ao universo das Caixas Agrícolas.
“Logo que estejam asseguradas as condições necessárias ao exercício de uma gestão autónoma, localmente eleita, serão desencadeados os mecanismos adequados para o efeito”, conclui.
À partida esta intervenção deverá demorar um ano, embora a lei preveja que possa ser encurtada ou prolongada.
Gazeta das Caldas tentou, sem êxito, falar com Luís Ganhão, que remeteu para mais tarde explicações sobre este assunto.
Por seu turno, o recém-nomeado administrador Nuno Cordeiro também não quis prestar declarações relacionadas com o controverso processo que levou à sua vinda para a cidade. O gestor limitou-se a assumir uma ruptura com o passado e reforçou que a Caixa Agrícola é um banco local, com um forte entrosamento na comunidade e que pretende estar virado para os três concelhos onde opera, reforçando laços com as instituições da região.
Prova disso é um anúncio que fez publicar onde felicita a Escola Secundária Raul Proença e o Colégio Rainha D. Leonor pelos bons resultados obtidos nos rankings dos exames nacionais. Já em Outubro, a Caixa apoiou as comemorações dos 50 anos do novo edifício da Escola Secundária Bordalo Pinheiro.
ÓRGÃOS SOCIAIS DESCONTENTES
A vinda de administradores de Lisboa para as Caldas não foi, porém, pacífica, sobretudo entre os elementos dos órgãos sociais que foram suspensos (Administração e Conselho Fiscal). Entre eles, há quem considere que a Caixa Central reagiu desta maneira porque se sentiu ultrapassada e desautorizada pelo facto de o Banco de Portugal estar em sintonia com a administração cessante. Em causa estava apenas a substituição de Luís Ganhão, como era pretendido pelo Conselho Fiscal que via, assim, validada a questão da perda de idoneidade do administrador.
Mas também é certo que as relações entre os membros destes órgão se degradaram, tendo havido momentos de tensão motivados por razões pessoais e de exercício de poder.
O certo é que em Agosto a Caixa Central resolve intervir directamente e coloca nas Caldas os dois administradores. Um deles, Ana Fiúza Martins, já tinha participado na auditoria.
Numa entrevista ao jornal Oje, de 18/09/2014, o presidente da Caixa Central, Licínio Pina, respondendo a uma pergunta sobre o caso da Caixa das Caldas, afirmou que, perante os problemas existentes “a Caixa Central chegou e varreu tudo, substituindo os antigos titulares por administradores provisórios”. E acrescentou: “as administrações [das Caixas] têm que nos dar garantias de que são prudentes. Se não as dão, intervimos”.
A mesma entrevista era titulada com uma frase do administrador que dizia: “Quem é banqueiro não pode ter negócios”.
Problemas maiores em Óbidos e Peniche
É nos concelhos de Óbidos e de Peniche que estão os maiores problemas da Caixa de Crédito Agrícola. No caso de Peniche a instituição sofreu com uma exposição excessiva aos Estaleiros Navais de Peniche, da qual tem sido financiadora.
A Caixa Agrícola já tinha tido um susto com um empréstimo aquela empresa, mas, uma vez recuperado o dinheiro, a administração voltou a conceder outro empréstimo, ficando novamente o banco numa situação muito difícil.
Os 1,4 milhões de euros de prejuízos da Caixa de Crédito Agrícola das Caldas da Rainha, Óbidos e Peniche escondem realidades diferentes se forem vistos ao nível de balcões. No concelho das Caldas a instituição até teve lucros de 951 mil euros, mas na Usseira teve prejuízos de 492 mil euros, um número, ainda assim, muito inferior aos 977 mil euros de prejuízos que teve em Peniche. O balcão da Atouguia da Baleia foi o mais problemático com 1,1 milhões de resultados negativos.
A Caixa de Crédito Agrícola caldense remonta a 1913 quando foi criada em Alvorninha. Em 1918 passa a chamar-se Caixa de Crédito Agrícola Mútuo dos Vidais e passa a ter sede naquela freguesia. A sua vinda para as Caldas da Rainha, com respectiva mudança de nome dá-se em 1926. Em 1996 junta-se-lhe a Caixa de Crédito Agrícola de Óbidos e em 1999 a de Peniche.
Este banco regional tem 13 balcões onde trabalham 69 pessoas. Há quatro anos teve 1,2 milhões de euros de lucros, valor que baixou para 425 mil euros em 2011 e para 669 mil em 2012.
Dos prejuízos de 1,4 milhões registados no ano passado, 1,1 milhões devem-se a imparidades.
Carlos Cipriano
cc@gazetadascaldas.pt






























