Este texto poderia ser sobre a violência doméstica e sobre a cobardia dos seus autores, e também sobre o enorme esforço que foi preciso fazer (e ainda é) para que a comunidade, e as próprias vítimas, levantem o manto de silêncio que impede muitas vezes o conhecimento público e a penalização do ato criminoso. Todos concordamos que tal comportamento, vil e ignóbil, não pode deixar de ser denunciado às autoridades, protegendo as vítimas e punindo severamente os agressores.
Mas este texto não é sobre a violência doméstica mas antes sobre a inqualificável ação de um deputado da Assembleia Municipal de Óbidos, no dia 26.06.2019 em A-dos-Negros, numa conduta indigna para com a Vereadora do Partido Socialista, ali presente em representação da autarquia naquela reunião pública. O deputado, durante a sua intervenção e de microfone na mão, deslocou-se até junto da Vereadora numa atitude agressiva, dirigindo-lhe palavras grosseiras, numa evidente falta de respeito, calúnia, atentado à honra pessoal, ameaça, e que poderia ter terminado em agressão física, não fora a intervenção do Presidente da Assembleia.
Bem sabemos que a disputa política pode toldar a razão dos menos preparados, mas é inadmissível este tipo de comportamento, apenas disponível por parte de quem faz da agressividade e da ameaça o fundamento da sua opinião. Quando não se conseguem combater os argumentos, combatem-se as pessoas. Já foi assim num Portugal distante. Não nos revemos neste tipo de comportamento, e julgamos que os eleitores de Óbidos não votaram nos seus representantes para que estes insultem e desrespeitem, de forma tão grosseira, outros representantes eleitos.
Mas ainda que tenha sido uma atitude irrefletida, admitir-se-ia uma tomada de posição do próprio ou dos seus colegas eleitos ou da estrutura do seu partido, com um pedido de desculpas pelo sucedido, o que não aconteceu no local à própria hora, mas que infelizmente também não chegou mais tarde.
Se o ato em si é reprovável, o que dizer do silenciamento e branqueamento do caso? Talvez ainda mais reprovável. Finge-se que nada acontece, “não me apercebi”, ou que “não foi nada de mais”. Não se fala no assunto, porque “a política é mesmo assim”, não vale a pena exagerar “porque ninguém agrediu ninguém”, ou o já célebre “não sejam piegas”.
Não queremos imiscuir-nos na questão da ofensa pessoal, na pessoa da Vereadora, e que diz apenas respeito à própria e à sua família, cabendo-lhes em exclusivo o direito de reagir a tal atitude. O que nos diz respeito, enquanto cidadãos eleitores e vereadores eleitos, é a questão da ofensa inusitada dirigida a uma simples pessoa, mas agravada por se tratar de um membro de órgão autárquico, feita em local público e no exercício das suas funções cívicas e de representação eleitoral. Na política como na vida, não vale tudo, e antes de bons políticos, devemos pugnar por ser pessoas sérias e respeitadoras dos outros e das ideias dos outros, afinal, do sistema democrático.
Nota 1: os autores deste texto, Paulo Gonçalves e Vítor Rodrigues, vereadores do PS na oposição, não se encontravam na sala no momento da agressão. Se estivessem, talvez a agressão não acontecesse.
Nota 2: as sessões da Assembleia têm registo áudio de todas as intervenções, o que pode ser útil para os mais céticos quanto à descrição aqui feita por nós.
Nota 3: a violência, a grosseria e atitudes afins não têm cor política, nem fazem parte de nenhum programa eleitoral, pelo que não temos nenhuma teoria político-partidária ou ideia de conspiração. Foi apenas um ato inqualificável de uma pessoa sobre outra pessoa, ambos eleitos locais.
Nota 4: tal ato, indigno, deveria, já, motivar o abandono do cargo que lhe foi confiado pelas pessoas sérias de Óbidos que nele votaram. Não o fazer, é desrespeitar todos os eleitores e todos os eleitos, entre os quais nos incluímos.
Paulo Gonçalves
Vítor Rodrigues
Vereadores do PS
































