ontem & hoje

0
656

Salir do Porto prepara-se, neste momento, para deixar de ser freguesia por uma decisão discutível para não lhe chamar leviana e inapropriada.
Nasci em Salir do Porto, freguesia que tinha um lugar que era os Casais de Salir do Porto com uma placa sinalética indicativa.
Nasci na freguesia de Salir do Porto, fronteira que separa os concelhos de Alcobaça e das Caldas da Rainha onde havia um Presidente da Junta eleito entre os homens considerados idóneos e um Regedor que era a autoridade local.
Nasci na freguesia de Salir do Porto onde havia uma agricultura fundamentalmente efetuada por mulheres, pesca e em que a maioria dos homens válidos eram embarcadiços.
Agora Salir do Porto vai deixar de ser freguesia, vai deixar de ter Presidente da Junta e não vai ter nenhum representante da autoridade.
Em Salir fiz alguns anos da instrução Primária com a senhora professora D. Adélia, aprendi a andar de bicicleta, a construir e a brincar com brinquedos  feitos de canas e de madeira, a nadar no Vau, hoje a praia de Salir do Porto.
Salir do Porto era só a beleza natural: a areola  (hoje as dunas com menor dimensão), a relva (ilhotas que desapareceram pela “ignorância” e insensatez dos homens no perÍodo pÓs 25 de abril) as tramagueiras, a frigideira (que bons banhos de sol!) a água termal da Pocinha, “indicada “ para doenças de pele e alterações do trÂnsito intestinal e que utilizávamos para nos lavarmos a seguir ao banho de mar.
Recordo a D. Amália (filha da “curiosa” Srª Amália, que me ajudou a nascer em casa) a vender  pastéis de nata da pastelaria Concha  na  praia .
Recordo o António “lontra”, que penso ter sido o primeiro banheiro da praia de Salir e que também ajudava as pessoas a atravessar o rio na maré cheia de uma margem para outra e das pessoas a calçarem os sapatos só no apeadeiro quando se deslocavam à sede do concelho, em virtude de não haver ruas alcatroadas.
Recordo o meu amigo Zé Vira, que morava na minha rua, lembro-me da fonte onde ele tomava banho de inverno e de verão e que durante anos serviu para encher os depósitos e cisternas quando não havia água canalizada. Nele recordo todos os meus amigos de Salir que infelizmente não pertencem ao mundo dos vivos.
Fui para Lisboa em 1966 fazer o liceu no Colégio Manuel Bernardes. Vinha passar a maior parte dos fins de semana, todas as férias de Natal, Páscoa e férias grandes e em que tinha o apoio do meu avô Ferreira e de toda a minha família de Salir. Foi nesta altura, nas férias grandes, que iniciámos os bailes de garagem em que ouvíamos e dançávamos ao som da música dos Beatles, do Adamo, da Silvie Vartan, do Cliff Richard, do Tom Jones, do Michael Polnareff, dos Deep Purple, dos Roling Stones, do Cat Stevens, dos  PinK Floid, entre outros.
Pouco a pouco os bailes de garagem foram desaparecendo e deram lugar aos bailes das coletividades de que é bom exemplo o centro Recreativo e Cultural de Salir do Porto, de que fui presidente da Assembleia Geral durante vários anos.
Durante o Verão todos os lugares, freguesias, vilas, cidades de Portugal homenageiam o seu Santo Padroeiro ou Patrono com grandes celebrações, e Salir do Porto não é exceção. O sucesso das festas reside no contributo e empenho dos habitantes, e também dos emigrantes de Salir  que na primeira semana de Agosto rumam à sua terra natal. A festa em honra de Nossa Senhora da Conceição culmina com uma procissão que é considerada a maior procissão do concelho e em que participo religiosamente todos os anos.
É neste encontro anual que sinto uma saudade imensa das férias, das brincadeiras, dos piqueniques no São Romeu ou à volta das ruinas da Capelinha de Sant’Ana, de todos os meus amigos e amigas que comigo partilharam a  juventude em Salir no tempo em que as horas eram lentas e que pareciam intermináveis
Hoje, muita coisa mudou em Salir e ainda bem. Saliento as melhorias feitas a nível do   saneamento básico, a água canalizada, o alcatroamento de passeios e ruas – em que teve algum papel preponderante o atual presidente da junta – e ainda o aparecimento de algumas urbanizações  que ajudaram a promover o turismo iniciado pelos franceses nos anos setenta.
Mais recentemente a criação da Associação de Desenvolvimento e apoio às crianças e aos idosos.
Para mim, Salir do Porto de ontem, hoje e do amanhã, continua a cheirar a Portugal, a férias, a saudade, a cheirar à minha terra .
Gosto muito de Salir e vai ser lá que seguramente um dia, vou ficar.

Ernesto Carvalho

- publicidade -