A Santa Casa da Misericórdia do Concelho de Óbidos publicou o primeiro volume de um conjunto de obras onde pretende dar a conhecer a história da sua vida administrativa, económica, social e cultural, através da transcrição dos Livros de Acórdãos e Eleições.
Da autoria do historiador Ricardo Pereira, a obra constitui um “importante e indispensável contributo para todos aqueles que se queiram dedicar ao estudo e investigação de Óbidos e do seu termo, a partir de meados de quinhentos”, afirmou o provedor da instituição, Carlos Orlando, na apresentação pública que decorreu no passado dia 18 de Janeiro.
A 3 de Maio de 1551 foi pedida ajuda à Santa Casa da Misericórdia de Óbidos para o dote de casamento de uma jovem moura residente no concelho, de nome Graça. Vivia-se a época da Inquisição e a instituição deliberou conceder-lhe “dois mil réis” para a realização da boda.
Esta é uma das decisões contidas no primeiro volume dos Acordos da Confraria da Santa Casa da Misericórdia (de um conjunto de nove cadernos), datado de 1546 a 1603, organizado pelo historiador Ricardo Pereira.
Na obra agora apresentada, o historiador manteve os mesmos erros ortográficos e a originalidade dos textos, tendo apenas alterado as abreviaturas de nomes e cargos, para melhor percepção dos leitores.
Nesta transcrição de documentos, Ricardo Pereira deparou-se também com diferentes formas de escrita, consequência do cuidado com que os escrivães colocavam no texto e também dos muitos erros ortográficos e gramaticais que cometiam.
Apesar de haver documentos em que precisou de mais de um dia para os conseguir ler, o historiador destacou o interesse da variedade de escrita que encontrou, “e que não se distanciava muito do que se fazia na corte”.
Entre os vários tipos de escrita que os escrivães da Misericórdia do século XVI utilizavam, estão a cortesã, a encadeada (de difícil percepção) e a processada (que se lê com relativa facilidade).
Já a chegar ao século XVII, Ricardo Pereira encontrou dois outros tipos de escrita nos documentos, a escrita cursiva moderna e a caligráfica moderna, esta última de mais fácil percepção e maior preparação do escrivão em separar as palavras.
Na sequência deste trabalho, o historiador João Tormenta e o arquitecto José Duarte trabalharam a evolução dos topónimos. Os dois autores basearam-se nas transcrições das idas dos mamposteiros (pessoas que recolhiam esmola para a Misericórdia) e verificaram as alterações dos nomes das freguesias em meados do século XVI, percebendo a sua evolução.
Verificaram também as alterações que o termo de Óbidos sofreu nos últimos cinco séculos. Para João Tormenta é curioso como o assunto da delimitação administrativa é actual, pois nos últimos tempos tem sido procurado por diversos autarcas, no Arquivo Histórico de Óbidos, a pedir informações sobre as áreas que tiveram as suas freguesias.
“Penso que nesta altura [séc. XVI] o grande denominador comum era a Lagoa e há uma ligação muito estreita de toda esta população do Cadaval, Bombarral, Óbidos e Caldas da Rainha em torno dela. Devia ser a grande fonte em termos de riqueza do território”, disse João Pedro Tormenta.
Entre os exemplos dados pelos autores estão a localidade de A-dos-Negros, que foi das que teve mais alterações. Em 1546 era grafado (escrito) como Dados Negros, enquanto que logo a seguir aparecia como Dos Negros ou freguesia de Madanela (Madalena). Em 1584 aparece referência à freguesia de A-dos-Negros e, em finais do século XVI, era registado como freguesia Madanela.
Já Tornada aparece referida nos documentos de 1546 como Cornagua e freguesia de Cornagua. Mais tarde, em 1578, é grafada como Cornaga e só em 1589 aparece a primeira referência à freguesia de Tornada.
De acordo com o provedor da Misericórdia de Óbidos, Carlos Orlando, o arquivo histórico desta instituição “tem à sua guarda o mais rico e o mais variado acervo documental do concelho”. O lançamento deste livro visa promover uma maior proximidade entre o arquivo histórico e a comunidade, mas também sensibilizar os jovens e historiadores para a importância do tratamento e preservação do património arquivístico.
Também presente na apresentação da obra, Fernando Correia, presidente da Assembleia Geral da Misericórdia, destacou o trabalho da actual mesa administrativa tanto ao nível social como cultural. “Acho que a Misericórdia está com uma vivacidade como nunca teve e espero que assim continue”, concluiu.






























