Durante os meses de Julho a Setembro, a cerâmica esteve em destaque no Cencal com actividade ininterrupta em várias vertentes deste sector. Ao todo mais 150 formandos, portugueses e estrangeiros, fizeram a sua formação em áreas específicas da produção e criação cerâmica.
De forma sucessiva realizaram-se várias cursos, desde Escultura de Grande Dimensão com Rui Vasquez, outro de Iniciação à Cerâmica, coordenado por Umbelina Barros e de Joalharia Cerâmica, que teve a coordenação de Paulo Oscar e o apoio de Nick Taylor. Seguiu-se ainda azulejaria criativa, liderada por Thomas Schiteck, artista alemão que está radicado na região.
Em Julho esteve no centro de formação um grupo de professores e alunos polacos da Escola de Artes Plásticas de Czestochowa, que para além de ter contactado com a realidade cultural e criativa nacional, realizaram um workshop de pintura de azulejo com o artista Ferreira da Silva.
UMA EXPERIÊNCIA DE INICIAÇÃO
“Há muito que sentíamos pessoas ligadas ao centro de formação que nos pediam que fizéssemos um curso de Iniciação, que foi agora possível”. Palavras de Jesus Sherriff , a coordenadora destes cursos de formação, que explicou que o convite para dar esta acção foi feito a Umbelina Barros, que já tinha feito anteriormente propostas para o centro de formação, destinados a vários públicos como, por exemplo, para as crianças.
A procura foi grande e foram seleccionados 17 formandos das mais diversas áreas para experimentar as técnicas iniciais de se trabalhar o barro. Advogados, designers, investigadores, artistas plásticos e até quem se encontra sem emprego, reuniram-se durante uma semana para trabalhar neste material, colocando verdadeiramente as mãos no barro.
“Há algo de primitivo no trabalho com a cerâmica. Muitos nunca tinham mexido no barro e todos têm estado a produzir as suas peças, ultrapassando as expectativas iniciais”, disse a formadora, que é ceramista caldense. Formada em Artes Plásticas na ESAD já concluiu o seu mestrado na escola de artes da sua cidade e está agora a frequentar o doutoramento em Educação Artística na Faculdade de Belas Artes do Porto.
As técnicas base da cerâmica foi algo que os formandos estavam a gostar de aprender, prescindindo de intervalos e ficando até mais tarde para não perder pitada desta aprendizagem. “É sinal que o “bichinho” da cerâmica já entrou, logo tenho a certeza que o grupo vai tentar voltar ao Cencal para aprender mais técnicas. Nesta semana sentiram apenas o aroma do que é trabalhar na cerâmica”, disse a formadora.
“Aprender mais sobre a arte da minha terra natal”
Carlos Vitorino, 40 anos, é advogado e mora nas Caldas. Veio para este curso pois “queria aprender algo sobre a arte da minha terra natal”. O curso de iniciação à cerâmica “está a ultrapassar as minhas expectativas pois nunca tinha tido contacto com o barro e estou a gostar do que estou a fazer”. O participante até já tinha experimentado trabalhar com a madeira (também no Cencal) e agora quis dedicar-se à cerâmica de modo a “aprender um pouco mais”. Depois do barro, Carlos Vitorino ainda vai querer colocar as mão na cortiça e na pedra para melhor saber o que se pode retirar de cada material.
Nuno Pires, 24 anos, é aluno nas Belas Artes de Lisboa e veio de Sintra. Soube através de uma amiga sobre este curso e “como não tinha experiência quis aproveitar esta oportunidade”. Estava a adorar a experiência, tendo inclusivamente ficado alojado no centro de formação caldense. À Gazeta das Caldas disse que provavelmente vai querer regressar para aprender mais técnicas de cerâmica.
Elizabete Santos, 60 anos veios de Leiria e é professora reformada de Educação Visual. “A formação está a ser fabulosa, já fui a vários workshops e aqui fartei-me de aprender”, disse a participante que é uma habituée dos cursos do Cencal. A docente achou que Umbelina Barros “tem grande facilidade de transmitir os seus conhecimentos e “levou-nos” logo a pôr a mão na massa”, rematou.
Elena Sierra é espanhola, vive no Cadaval e é bióloga. Dedica-se à produção agrícola e quando soube deste curso quis logo inscrever-se. Estava a gostar de aprender as primeiras técnicas da cerâmica e também sublinhou o bom convívio que se gerou entre os formandos. “Aprendemos muito uns com os outros e, sim, vou querer voltar”, disse.
A arquitecta Teresa Henriques, 32 anos, foi outra das participantes nesta acção. “Está a ser tudo uma descoberta”, disse pois esta foi a primeira vez que veio ao Cencal. Apesar do grupo ser heterogéneo “creio que a formadora conseguiu passar-nos os conhecimentos sobres as técnicas que eu vou querer continuar a aprofundar”. Para Teresa Henriques, o curso serve para termos “as noções básicas da cerâmica e depois cada um vai aprofundar para poder desenvolver o seu percurso pessoal”.
Judite Ramalho, de 56 anos é das Caldas e soube do curso através da internet. “Como sempre gostei de cerâmica e resolvi “por a mão” no barro. Está a valer a pena e acho que vou querer tirar mais cursos”, disse a participante que se encontrava sem emprego na altura e estava a encarar a hipótese de trabalhar nesta área.
João Fabião, 27 anos, veio Coimbra e também foi na internet que tomou contacto com a iniciativa. Formado em Piano, João Fabião tem outros interesses que procura aprofundar nas áreas da indústria, mecânica e até trabalho em vidro. Teve artes no secundário e agora quis saber mais sobre como se trabalha o barro. Mariana Sampaio é da Golegã mas está nas Caldas a tirar o mestrado em Artes Plásticas, onde se formou. “Decidi fazer uma pausa nas férias para regressar às Caldas para me dedicar à cerâmica”, disse. Este já não é o primeiro curso ligado ao Cencal que tira pois já se dedicou à formação em vidro no pólo deste centro de formação na Marinha Grande.
A jovem já tinha experimentado a cerâmica mas agora quis aprender mais já que nas Artes Plásticas “é sempre bom poder aprofundar conhecimentos nas várias vertentes”.
Segundo Jesus Sheriff como houve grande procura para o curso de Iniciação, “pensamos que o curso poderá ter continuação no próximo ano e também uma segunda parte”. Esta acção teve ainda como intuito formar público pois quem esteve no curso “fica agora com uma outra sensibilidade para comprar e até oferecer cerâmica. Olha agora para esta arte de uma outra forma é no fundo também fazer marketing”, rematou a coordenados destes cursos de cerâmica do Cencal.
“Desmistificar processos construtivos em cerâmica”
O escultor Rui Vasques foi o coordenador da açção dedicada à grande escultura em cerâmica que se realizou durante uma semana de Julho. O responsável já deu aulas nas Belas Artes de Lisboa e veio ao Cencal com o intuito de “desmistificar alguns processos construtivos ligados à cerâmica e aproximar mais ao processo criativo ao acto de criar em termos de escultura”. Ou seja, o processo criativo “não se cinge às técnicas tradicionais mas sim às regras da criatividade”, acrescentou.
Para alguns dos intervenientes esta foi a primeira vez que contactou com a cerâmica e teve a oportunidade de experimentar o barro “usando grande liberdade formal que depois é complementada por um processo técnico”, referiu o coordenador que orienta cada formando no trabalho que cada um propõe.
Ao todo estiveram nesta acção 17 formandos, desde enfermeiros, arquitectos, artesãos, um acordeonista e professores e até quem trabalha com vitrais. Os resultados do curso são surpreendentes com grandes esculturas das mais variadas formas, conforme ditou a criatividade individual. “Uma situação de pré-catástrofe na cerâmica pode até não ser pois o material é muito dinâmico e essa dita autoconfiança que se pode incutir às pessoas é muito importante para a continuação do trabalho”, disse o escultor.
Ana Vicente é professora de EVT de Lisboa, mas vive nas Caldas e esta foi a primeira vez que veio ter formação no Cencal. Estava adorar a experiência, apesar de já saber técnicas de cerâmica. “é sempre bom consolidar conhecimentos”, disse a participante. Já Amílcar Sousa é arquitecto e depois da esposa ter vindo ao Cencal tirar cursos, chegou a sua vez de fazer alguma cerâmica. “É uma estreia e está a valer a pena e estou com vontade de continuar a fazer peças”, disse o participante enquanto dava forma a um peixe.
Maria José Sousa veio de Setúbal e é a segunda vez que tem formação nas Caldas. “Tem sido muito agradável descobrir novas técnicas”, disse a participante que é professora. Acha que o trabalho em cerâmica funciona “quase como uma terapia pois transmitimos na peça o nosso eu”.
Maria João Pereira é uma artesã de Alcanena que esteve neste curso a fazer uma escultura de jardim. “Já fiz outras formações aqui no Cencal e está a valer a pena pois estamos a aprender muitas técnicas novas”, disse a autora cujas peças se encontram à venda em lojas em Lisboa e em Tomar.
Em destaque esteve também um curso de Lustres, Lustrinas e Reflexos Metálicos, dirigido pela pintora cerâmica e ceramista Teresa e Lima e pelo ceramista Paulo Óscar, especialista na técnica de redução.
“Do Ecodesign ao produto cerâmico”
Roberto Miquelino , das Belas Artes de Lisboa, dirigiu um curso de Desenho e Modelação do Corpo Humano integrado no 1ª edição do Ciclo Modeladores ao passo que David Camacho se dedicou à formação “Do Eco Design ao Produto Cerâmico”. A cobertura das acções através das redes sociais já colocou o Cencal em contacto com responsáveis da Universidade norte-americana de Artes Plásticas de Miami na Florida e em breve abre-se a possibilidade de parcerias e intercâmbios de pessoas das duas entidades. Esta acção contínua trouxe uma lufada de ar fresco ao ensino e à especialização em áreas ligadas à cerâmica, a relembrar que com esta outras dinâmica seria mais fácil tornar Caldas da Rainha numa cidade ligada à sua tradição, agora de feição contemporânea.
O resultado das acções de formação do de 2012 a Maio de 2013 está patente na exposição “Cencal – Cerâmica e Vidro 2012-2013” e que pode ser apreciada até 17 de Novembro.
Professores polacos executaram painel com Ferreira da Silva
Em Julho, o Cencal recebeu um grupo de professores polacos da Escola de Artes Plásticas de Czestochowa que teve workshop com o mestre ceramista caldense, Ferreira da Silva. Como resultado final desta formação, o grupo e o artista fizeram um grande painel que vai ser colocado no novo edifício da sua escola a inaugurar em Abril do próximo ano.
Do grupo fizeram parte escultores, pintores e fotógrafos que leccionam naquela escola em Czestochowa, bem como outros professores das áreas do design gráfico, da cerâmica e de fotografia.
Segundo Ewa Ciosek o grupo de docentes deslocou-se às Caldas no âmbito do do programa Leonardo da Vinci. Na região tiveram a oportunidade de visitar a ESAD, a Janela Digital e tomar contacto com o funcionamento daquelas entidades. “Para mim foi muito importante, para mim e para a minha escola, tomar contacto com os seus projectos multimédia”, disse esta docente que está em Portugal pela sétima vez, mas pela primeira integrada num projecto para professores. Ensina História de Arte em Czestochowa e sempre que pode faz trabalhos em cerâmica. “É muito importante para os professores poderem contactar com outras tendências e outro trends style e design de outros países. É muito bom para ter outras visões das artes”, rematou a participante.
Já Cezary Stojek, que ensina Pintura e desenho está pela segunda vez nas Caldas. “Desta vez foi melhor, tudo fabuloso: o clima e a simpatia das pessoas”, disse o professor. Entre as muitas visitas que realizaram nas Caldas, Cezary Stojek salientou o workshop com Ferreira da Silva e a ida ao museu da Fábrica Bordalo Pinheiro.
Anna Trojanowska ensina Informática e Design Gráfico. Gostou das várias localidades, das exposições e de ter feito pela primeira vez trabalho em azulejo e salientou o prazer que foi conhecer logótipos portugueses pois considera que na Polónia “não estão tão desenvolvidos”.
Esta docente quer regressar de férias a Portugal e trazer a sua família. Anna Trojanowska estava muito satisfeita com a oportunidade de trabalhar com o barro pela primeira vez.
Jacek Palucha, que ensina desenho e escultura, esteve pela primeira vez em Portugal. “Foram duas semanas de visitas intensas e as impressões não podiam ser as melhores”, resumiu o docente. Acha que em Portugal as pessoas são muito simpáticas ao passo que “nós somos do lado frio da Europa”. Acha portanto que esse facto “influi na forma de encarar o design e também na forma de viver, que a mim muito me agrada”, afirmou. Esta artista já sabia que as Caldas era uma terra de forte tradição cerâmica, através dos seus amigos “foi surpreendente trabalhar com o barro. Faz-nos crescer, conhecer outras técnicas”, disse o escultor que salientou que gostou de visitar Fátima, mas que visita verdadeiramente favorita foi a que fez ao Museu Nacional de Arte Antiga onde teve a oportunidade de admirar os quadros de Bosch.
Jerzy Kedziora, também escultor acha que o grupo foi muito bem recebido nas Caldas e considera “exótica” a paisagem da região. O escultor quer voltar e o que mais gostou foi da viagem ao Porto pois o clima barroco de alguns dos seus monumentos conseguiram encantar este autor.
Ferreira da Silva aprecia fazer parte destes projectos “por amor à cerâmica e ao Cencal”. E é um prazer para este artista, que vive na região há vários décadas, “estou encantado com este grupo de pessoas, sensíveis e inteligentes, que vieram de tão longe para aqui produzir”.
O artista plástico dirigiu os trabalhos necessários a concretização de um pequeno painel colectivo. “Vou fazendo alguns trabalhos em casa, pois o trabalho público não há”. Para Ferreira é sempre difícil já que é um autor que prefere trabalhar em escala. “O trabalho público está pelas ruas da amargura”, alertou o artista que tem várias obras públicas colocadas nas Caldas, sendo o maior deles o Jardim das Águas, junto ao hospital.
“Trocas de experiências são para continuar”
“Temos uma cooperação com o Cencal há 13 anos”, disse Anna Maciejoliska, a directora da Escola polaca que tem visitou, com a sua equipa, Portugal durante alguns dias. Em 2001, contou, concretizou-se o primeiro intercambio entre estudantes e professores. “Tem sido uma óptima experiência que também gostaríamos de alargar à ESAD”, disse a dirigente que gostaria de, no futuro, promover parcerias para a concretização de seminários e de conferências sobre educação, design e arte na Europa. “Também temos parceiros em Itália, Alemanha, e França. Temos também com Israel noutros tipos de programas internacionais e por isso achamos que podemos aprofundar o nosso relacionamento”, disse.
Em relação à estadia, “estava muito bem organizada” e o workshop no Cencal também não poderia ter corrido melhor. Anna Maciejoliska referiu também que uma das especificidades da escola que dirige na Polónia é a cerâmica.
Maria Fedorowicz é coordenadora do programa europeu que permite este tipo de iniciativas partilhadas entre escolas de centros de formação europeus. “São fundamentais estes trocas de experiências na UE” pois, desta forma, professores e estudantes . A coordenadora afirmou que apesar da crise está assegurada a continuação deste tipo de intercâmbios entre diferentes entidades europeias.
Além dos docentes, também estiveram nas Caldas, durante três semanas, estudantes polacos, igualmente de Czestochowa. Os jovens, formados em artes gráficas e multimédia, realizaram trabalhos nestas áreas sobre a região Oeste e sobre Portugal. Professores e estudantes tiveram a oportunidade de visitar o Oeste, bem como Lisboa, Évora, Monsaraz, Alqueva, Porto, Fátima, Batalha, Marinha Grande (as instalações do CENCAL) e S. Pedro de Moel.
Natacha Narciso
nnarciso@gazetadascaldas.pt


































