Aquando da apresentação da candidatura do PS Óbidos, os jornais locais divulgaram aquela que foi a questão colocada pelo candidato sobre a governação de Telmo Faria: “De que vale apregoar um concelho que seria um oásis na região e país quando, apesar dos investimentos avultados, o desempenho escolar dos nossos alunos continua a situar-se na cauda de toda a região Oeste?”.
A minha indignação não é enquanto membro da equipa de Humberto Marques (pois o dedo que é apontado não parece indicar a política deste executivo), mas enquanto professora do Agrupamento de Escolas Josefa de Óbidos, enquanto membro da comunidade educativa que todos os dias desenvolve um trabalho consequente para formar pessoas.
Estas afirmações, além de falsas e simplistas, revelam um desconhecimento profundo da realidade.
Quem se preocupa minimamente com a educação sabe que as escolas de qualidade são as que criam maior valor acrescentado aos alunos e não as que têm os alunos com melhores resultados nos exames.
Quem se preocupa minimamente com a educação sabe que a acusação feita aos professores, alunos, técnicos da acção educativa e demais elementos da comunidade educativa é demasiado redutora face às finalidades definidas na Lei de Bases do Sistema Educativo, que vão muito além da instrução para uma competitividade redutora.
Quem se preocupa minimamente com a educação sabe que instrução não é sinónimo de educação, de formação.
Quem se preocupa minimamente com a educação sabe que muitos dos aspectos que interferem no desempenho escolar não estão reflectidos nos rankings (nem poderiam estar), como o projecto educativo da escola, os factores intra-escolares, as taxas de transição e de retenção, as taxas de conclusão dos cursos, os projectos, as dinâmicas de promoção, de valorização pessoal, de relações interpessoais e de sociabilização, o clima educativo promotor de atitudes e valores e de desenvolvimento de competências dinâmicas de aprendizagem…
Quem se preocupa minimamente com a educação sabe que não se pode avaliar uma escola em função de um processo administrativo, que valoriza a medição estatística dos resultados cognitivos dos alunos.
Quem se preocupa minimamente com a educação sabe que os rankings das escolas são uma perversão, porquanto resultam da comparação simplista das escolas, e podem desencadear efeitos igualmente perversos na conduta das escolas: centrar o ensino nos resultados dos exames em desfavor da aprendizagem e desenvolvimento integral dos alunos, pondo em causa a qualidade da educação.
Quem se preocupa minimamente com a educação não distorce a realidade, não faz leituras sincrónicas mas sim diacrónicas, tendo em conta o progresso dos alunos ao longo do tempo.
Para se preocuparem minimamente com a educação, antes de fazer qualquer acusação leviana, é necessário saber o que se passa nas nossas escolas, conhecer a sua realidade e dia-a-dia, considerar os vectores de entrada e demais variáveis que influem no funcionamento da escola e no processo de ensino-aprendizagem e não olhar apenas para o output final que é publicado em forma de números.
Quem está preocupado com a educação no nosso concelho não deve, oficial e publicamente, estigmatizar as nossas escolas, rotulando-as e denegrindo a sua imagem e o seu projecto educativo.
Nós, professores, alunos, pais, técnicos – os que vivemos (n)a escola – precisamos de uma apreciação de valor acrescentado, uma avaliação multidimensional e integrada, que nos ajude a ultrapassar os problemas que todos os dias enfrentamos, a construir uma matriz educativa que priorize a educação (em detrimento da instrução), a formação integral dos alunos, que seja inclusiva.
Lamentavelmente, quem avalia a nossa educação desta forma tão ligeira não reconhece (nem conhece) o esforço e o empenho de uma comunidade educativa válida e consciente da realidade. Quem olha para rankings como um instrumento de avaliação aritmética de civismo, personalidade, carácter, cidadania , revela não só falta de estudo em matérias de educação, mas também um profundo e preocupante esquecimento da diferença entre formação para a cidadania e preparação para a tirania.
“[A]ssegurar o direito à diferença, mercê do respeito pelas personalidades e pelos projectos individuais da existência, bem como da consideração e valorização dos diferentes saberes e culturas” não é avaliar com base num critério unificado e sintético. Os números são apenas um medidor exacto de si próprios. A educação, aos olhos de quem a conhece, ainda é muito mais do que isso.
Celeste Afonso
Professora do quadro do
Agrupamento de Escolas Josefa de Óbidos

































