É mais uma empresa exportadora caldense. Sobreviveu às últimas duas décadas depois dos anos loucos oitenta em que todos ganhavam dinheiro com a cerâmica, e parece agora encontrar um rumo mantendo um ritmo de encomendas constante para França, Estados Unidos e, mais recentemente, o Canadá e o Reino Unido.
Mas o administrador, Fernando Nicolau, alerta que este milagre só é possível com muito “sangue, suor e lágrimas” e mostra-se inquieto com os custos inusitados dos factores de produção.

Fernando Nicolau é o administrador da Olfaire – Mendes & Nicolau, Lda. dando hoje continuidade à cerâmica dos seus tios, Álvaro José Mendes e Maria José Mendes (que o criaram desde pequeno) e que tinham fundado esta empresa em 1970.
Por sua vez, Álvaro José Mendes (falecido em 2006) herdara em 1946 a olaria do seu avô, à data existente na Rua 15 de Maio. Era uma época em que o plástico não estava banalizado e os tachos e alguidares eram todos feitos de barro.
Álvaro Mendes fez com que a Mendes & Nicolau soubesse aproveitar o boom cerâmico dos anos oitenta, mantendo-se sempre fiel à “louça das Caldas”, como ele a designava, a qual deve muito à inspiração bordaliana.
Mas foi também um criador, dotado de grande engenho, com atelier próprio. A ele se deve, por exemplo, a famosa Fénix que está colocada na sede dos bombeiros caldenses, um trabalho de grande envergadura de dois metros por dois metros e que foi feito na sua fábrica.
Por essa altura o jovem Fernando Nicolau estava a concluir Engenharia Química no Instituto Superior Técnico, em Lisboa. Ainda lhe passaram vários projectos pela cabeça, mas acabou por se juntar ao negócio dos seus tios criando, em 1991, a sociedade por quotas Mendes & Nicolau, Lda.
“Desde sempre que eu trabalhara aqui, desde miúdo. Isto era a minha casa pois vivíamos no rés-de-chão. Por isso, foi normal que eu desse continuidade à empresa”, diz Fernando Nicolau.
Como os anos fáceis dos oitenta já tinham passado, os 20 anos seguintes revelaram-se duríssimos, com inúmeras fábricas a encerrar. E é aqui que o hoje administrador (o tio morreu em 2006 e a tia, Fernando Nicolau há dois meses) usa a famosa expressão de Churchil “sangue, suor e lágrimas” por ter conseguido que a sua empresa não fosse mais uma das muitas do sector cerâmica que foram à falência.
Em 2003 a empresa tinha 40 trabalhadores. Hoje só tem metade. O redimensionamento foi uma necessidade imperiosa. Depois Fernando Nicolau deu-se conta que só com a louça decorativa não iria a lado nenhum e, sem perder o ar bordaliano, perdão, caldense, das suas peças, optou por torná-la mais utilitária.
“Apostamos mais na louça de mesa para poder progressivamente descontinuar o mercado da decoração e afirmar-nos no mercado da casa, introduzindo os novos produtos num segmento mais alargado”, explicou.
No fundo, para este empresário, a história desta empresa é em tudo idêntica à das próprias Faianças Bordalo Pinheiro que usaram também a mesma estratégia. Uma estratégia que foi mais ditada pelo mercado externo do que propriamente de actos de gestão tomados a partir de dentro das empresas. “Foi o mercado e a necessidade de sobrevivência que nos levou a isto”, conclui. É que, para quem, como é o seu caso, trabalha em faiança, e não em porcelana ou grés, não havia muitas alternativas visto que estes últimos é que se vendem bem no mercado da hotelaria, por exemplo.
Hoje a empresa exporta 99,9% da sua produção. “Só não digo 100 por cento por pudor”, ironiza o seu proprietário.
Mas porquê a França e os Estados Unidos?
“Foram os nossos compradores de sempre. A França tem uma apetência por este tipo de loiça, própria para as casas de campo… a arte de la table. E os Estados Unidos, como são um país novo, tudo o que venha da Europa e tenha um cheirinho a História, a passado, a tradição, é-lhes bem vindo. Aliás, temos clientes que nos pedem uma resenha histórica de algumas peças porque isso acrescenta valor ao produto”.
Apesar de a empresa se limitar a reagir ao mercado, não investindo muito na inovação nem em novas linhas, Fernando Nicolau conta que tem tido experiências muito interessantes e profícuas com o designer de exteriores San Baron. Este famoso criador francês tem desenvolvido alguns projectos próprios assentes em linhas bordalianas, tendo exposto peças no Museu do Design em Nova Iorque. Por exemplo, a folha de couve, tão tipicamente caldense, fez sucesso nessa exposição devido a um estilo próprio que San Baron lhe imprimiu.
Quanto a novos projectos, o administrador da Mendes & Nicolau diz que “o futuro está parado”. Uma frase que encerra tanto de filosofia com de pragmatismo. As vendas estão a descer, os lucros também. E remete para as declarações de Joaquim Beato, da Molde, à Gazeta das Caldas (ver jornal de 22/10/2010), a quem trata por “colega” e não por “concorrente” acerca da enorme dificuldade em aceder ao crédito.
“As empresas estão descapitalizadas e só sobrevivem com muito sacrifício e muito trabalho”, diz. É claro que notam-se sinais de retoma nos Estados Unidos, mas estes indícios encorajadores são contratendenciados pelo aumento do custo da energia em Portugal e pelo agora súbito e inesperado aumento dos metais que faz com que o cobre necessário para os vidrados tenha aumentado de 12,50 euros o quilo para 16,50 euros. O futuro, apesar do “motor” das exportações, não se avizinha fácil.
Resultados pouco animadores, mas boas perspectivas para o futuro
Nos bons tempos a empresa chegou a facturar 700 mil euros e a empregar 40 pessoas. Agora factura metade e emprega metade dos colaboradores, mas é uma empresa resistente porque faz parte do rol das que não fechou.
Fernando Nicolau explica que a quebra de resultados em 2008 se deveu sobretudo à baixa paridade do dólar americano face ao euro (na altura 1 euro = 1,60 dólares) que ocorreu com o pico da crise financeira.
“Mas a verdade é que, devido à nossa relação com os Estados Unidos, começamos logo a notar o início da chamada crise do imobiliário e numa altura em que ainda o nosso primeiro ministro e o ministro das Finanças diziam que isso não nos iria afectar”, conta o empresário, que repete a fórmula do “sangue, suor e lágrimas” para poder manter a empresa a pagar atempadamente salários e subsídios.
A acumulação do défice tem sido combatida com alguma alienação de património particular dos sócios, mas o futuro, apesar da crise, tem luzes de esperança: “em França estamos a trabalhar no terceiro ano consecutivo com um novo importador que nos permite praticar preços mais ajustados e no Canadá estamos no segundo ano com resultados satisfatórios”.
A empresa recuperou também um bom cliente antigo dos Estados Unidos “e estamos a iniciar este ano a entrada num cliente de segmento alto, cujos resultados ainda não são visíveis, mas são promissores”.
Por outro lado, a Olfaire não fica presa a uma produção industrial taylorista e aposta em pequenas séries, usando de grande flexibilidade nos processos, trabalhando com pequenas e médias séries.
Há, então, futuro? “Olhe, se nada disto resultar, enfim, há as saídas clássicas: admitir um sócio investidor, vender a empresa ou “fechar a porta”. No entanto quando se faz aquilo que se gosta e se acredita, vai-se até aos limites do impossível!”
Exportações “puxam” pela Molde
Um crescimento acentuado da procura por parte dos Estados Unidos e uma correcção favorável do dólar tem levado as faianças Molde a ritmos crescentes de produção e a admitir pessoal.
Desde Outubro foram já criados mais 30 postos de trabalho para responder a um pico de produção que é quatro vezes maior do que o período homólogo no ano passado, como explicou à Gazeta das Caldas o administrador Joaquim Beato.
A empresa facturou no ano que agora findou 1,9 milhões de euros (menos 200 mil euros do que esperava) e teve resultados positivos, ainda que quase simbólicos – apenas 12 mil euros.
No entanto, a administração está optimista porque, por via das exportações, têm surgido encomendas.
Só o acesso ao crédito – fundamental para este tipo de pequenas e médias empresas – é que continua difícil, tal como já dizia Joaquim Beato à Gazeta das Caldas em 22/10/2010. E tem sido essa falta de fundo de maneio que levou a que houvesse salários em atraso até Julho do ano passado. “Mas apenas por alguns dias”, disse o administrador. Neste momento a empresa paga a tempo e horas e só o subsídio de Natal é que está a ser entregue em prestações.
Joaquim Beato diz ainda que o prestígio que a Molde tem vindo a alcançar junto dos clientes é tal que tem conseguido diminuir os prazos de pagamento, o que tem um impacto positivo no financiamento da empresa. “Já aconteceu termos ainda o contentor no porto de Lisboa e estarmos a emitir a factura e o cliente já nos estar a pagar”, disse Joaquim Beato, que não deixa, porém, de criticar a falta de apoio da banca às empresas exportadoras.
Carlos Cipriano
cc@gazetadascaldas.pt
































