Caldense ajudou Moçambique a apurar-se para a CAN, que quer disputar, e sonha com o Mundial
Pepo, és caldense, jogaste na segunda liga, foi um desafio interessante?
Foi, isso era aquele sonho desde sempre, jogar numa liga profissional em Portugal. Ter conseguido isso para mim foi incrível, senti que estava preparado e que até poderia ter vindo antes, porque tinha estado no Leixões, mas não comecei a jogar, já lá tinha estado, mas nem me tinha estreado, então conseguir fazê-lo no ano a seguir foi bastante bom.
Falemos do Caldas SC…
O regresso foi na altura que tinha que ser, bateu tudo certo, tinha sido pai, o futebol andava a desiludir-me bastante e senti que precisava de voltar a ser feliz e a desfrutar do futebol. Só consegui quando voltei para junto dos meus, saber que a minha família ia estar todos os fins de semana na bancada porque são adeptos do Caldas, voltar para ao pé de amigos de infância com quem sempre mantive o contacto… Sabia que o carinho que as pessoas tinham por mim aqui era muito grande e a única expetativa era de ser eu mesmo, sabiam o valor que eu tinha. Vim para ao pé do meu pai, da minha mãe, das minhas irmãs, a minha mulher também voltou para perto de casa. Acho que foi quando tinha que ser, quando tudo se alinhou.
Jogaste várias vezes contra o Caldas. Como era ser adversário?
Era um misto de emoções porque adorava jogar contra o Caldas, gosto de jogos em que sei que vou apanhar bons ambientes e o Caldas na Mata tinha sempre bons palcos. Quando vinham a Leiria, sabia que ia defrontar amigos e dentro do campo temos aquela rivalidade boa em que nos superamos. Era um misto de estar a defrontar e a querer ganhar a colegas meus, mas também era quando as coisas me saíam melhor e eu gostava desses jogos porque tinha uma ligação especial.
Vestir a camisola do Caldas foi diferente pelo carinho ao clube da terra?
Sim, sim. Muito diferente. Mas sou sincero. Não entendia tão bem… Porque estamos a falar de ir para o balneário com jogadores como o Clemente, como o Militão, o Januário, o Farinha. Eles falavam desse amor ao Caldas de uma maneira diferente da que eu falava, mas a partir do momento em que entrei ali dentro percebi aquilo que eles falavam e o que os fez ficar aqui tantos anos. É realmente um clube muito especial.
O recuperar da alegria também te levou à seleção de Moçambique, mas o convite já tinha surgido, certo?
Certo. Eu tinha recebido esse convite quando estava na Segunda Liga, no Cova da Piedade, e, infelizmente, na altura da primeira convocatória em que já tinha tudo definido para ir, tive uma lesão que me afastou dos jogos e acabei por nem levantar voo, nem fazer parte dessa convocatória. Nas seguintes, eles perguntaram-me se queria ir, mas apanhou uma altura de Covid e a nível pessoal as coisas não estavam a fazer sentido e acabei por dizer que não e adiar e os contactos também foram acabando, comecei a jogar muito menos… Quando voltei ao Caldas e comecei a jogar outra vez com frequência e as coisas a correrem bem, o convite surgiu e, com naturalidade, aceitei e foi tudo fácil.
A tua ligação a Moçambique vem da tua mãe? Já tinhas lá ido? Como foi a primeira ida?
Sim, a minha mãe nasceu lá, tal como os meus tios, os irmãos dela. E não, nunca tinha ido! Foi um choque de realidade, ou seja, nós ouvimos o que ouvimos dos países africanos, mas só depois quando lá chegamos é que sabemos realmente como é que as coisas são. E foi um choque tanto pela positiva como pela negativa. Negativa naqueles aspetos mais óbvios, porque é um país com alguma pobreza e alguma falta de condições de vida, mas de surpresa pela forma como fui recebido, porque o povo recebeu-me de uma forma incrível, os jogadores igualmente. Eles vivem para o futebol, só vi alegria naquelas pessoas, com muito menos do que nós temos. Foi aquele choque de perceber que nós somos uns sortudos e nem sempre damos valor a muita coisa.
Com a camisola da seleção tens já um momento histórico, com o golo de canto olímpico…
Foi logo no início do jogo. Foi um momento em que vou marcar o canto, sinto que está muito vento, vejo o guarda-redes na marca do penálti, completamente fora da baliza, vejo os defesas à entrada de área e pensei: “olha, deixa-me tentar”. E fui feliz. Mas foi uma coisa muito do momento, não foi nada pensado antes ou que tivéssemos visto que eles defendiam assim, foi uma coisa do momento e saiu bem. Também tive essa sorte.
As tuas características em campo encaixam bem na equipa e permitem potenciar os teus colegas, com a tua visão de jogo e capacidade de passe para a verticalidade, força e velocidade?
Eu acho que esse é o principal fator. Eles são muito mais rápidos que eu, muito mais fortes, e acho que essa capacidade que tenho de passe e de saber gerir os tempos de jogo, num futebol em que é tudo muito mais físico, muito mais partido, acho que essa minha inteligência e capacidade de passe fazem diferença. Se pensava que me ia enquadrar ali tão bem? Era difícil, pela parte mais física, por vir de uma Liga 3 e apanhar jogadores habituados a contextos muito melhores, que estão muito mais preparados, sabia que ia ser difícil, mas correu bem, consegui adaptar-me bem, percebi como é o jogo e adaptei-me de maneira a que não se percebessem essas partes mais negativas que tenho.
Fizeste parte do apuramento para a CAN. É um sonho disputar essa competição?!
É, porque isto pode soar arrogante, mas no futebol sempre senti que tinha a capacidade de fazer algo que nunca fiz, não sei se por falta de qualidade, de sorte ou seja o que for, mas sempre senti que poderia ter feito outras coisas. E chegar a isto, seja aos 31 anos, seja aos 25, faz-me parecer que, apesar de não ter estado noutros patamares, é uma coisa que vai ficar para a história e vou finalmente viver aquele sonho de estar numa grande competição. É fazer com que tudo valha a pena lá.
O foco está agora no apuramento para o Mundial?
Está, ficou mais difícil, por causa da derrota com a Argélia e depois os melhores segundos é uma grande confusão, mas pronto, enquanto matematicamente for possível, é sempre para acreditar, apesar de termos muita noção, que agora ficou muito mais complicado.
Fala-nos um bocadinho dessa equipa de Moçambique, que tem alguns nomes conhecidos, como o Reinildo, do Atlético Madrid, ou o Geny Catamo, do Sporting?
Nota-se porque é que estão acima de outros, mesmo em contexto de treino, fisicamente estão melhor preparados, tecnicamente são mais rápidos a fazer as coisas, pensam mais rápido e é um orgulho muito grande vê-los a trabalhar e depois sentir que eles depositam em mim confiança. Penso: como é que jogadores que durante uma época estão a apanhar os melhores do mundo e chegam àquele contexto e veem em mim capacidade para poder fazer a diferença? É interessante porque eles veem que se calhar tenho realmente qualidade e é um motivo de grande orgulho para mim vê-los a pensar em mim dessa maneira.
O que te falta?
É ir ao Mundial, depois da CAN.































