Bib. de Inst. Profissional – Indústria Cerâmica - 1907
Mais um dos livros da coleção “Biblioteca de Instrução Profissional”, desta vez dedicado à “Indústria Cerâmica”.
Antecedendo o texto principal do livro, um capítulo intitulado ”A Cerâmica Portuguesa e a sua aplicação Decorativa”, da autoria de Joaquim Vasconcelos.
Convém informar que esta biblioteca foi iniciada por Tomás Bordalo Pinheiro, que se de pouco ouvimos falar, conhecemos de certeza como um dos irmãos de Rafael.
Tomás foi também, em parceria com Henrique Lopes de Mendonça (seu cunhado de Rafael), responsável pela publicação de uma revista infantil, que tinha por título “O Gafanhoto”, publicação que à época granjeou grande sucesso.
Mas regressemos à nossa “Indústria Cerâmica”; faz todo um historial da cerâmica, dedicada atenção à composição das argilas, refere a execução das pastas cerâmicas, dá a conhecer toda a maquinaria (moderna, à data) necessária à fabricação da cerâmica de construção, dedica capítulos à “louça ordinária de barro”, à faiança comum e à faiança fina. O último capítulo “Decoração de produtos cerâmicos” é em grande parte dedicada a Rafael Bordalo Pinheiro. E é do texto desse capítulo que nos é dado saber o seguinte:
[…] “Por isso, não devemos encetar o capítulo da decoração cerâmica, sem lembrar com admiração e saudade, um nome que na história das artes deve escrever-se em letras de ouro: Rafael Bordalo Pinheiro.
Depois de cultivar de uma maneira inconfundível a arte da caricatura, depois de 23 anos a dedicar-se a uma indústria já antiga entre nós, é certo, mas que ele aperfeiçoou extraordinariamente imprimindo-lhe modernamente uma feição artística.
A antiga louça das Caldas era caracterizada pela representação de alguns animais, frutos e plantas, em que as cores, alegrando a vista dos humildes ou dos poucos exigentes em assuntos de arte, falseavam a natureza no exagero dos coloridos. O oleiro manifestava pouco cuidado nos traços anatómicos, dando às vezes em resultado verdadeiros aleijões.
[…] Propriamente como ceramista, Rafael Bordalo Pinheiro influiu com os seus estudos para a adaptação do barro das Caldas às produções mais variadas, desde o pichel rústico até às produções mais variadas miniaturas que que rivalizam com os «biscuits» mais rendilhados de Sévres e Saxe, notando-se porém, que pela natureza dos seus fornos, não possuía o recurso das temperaturas calculadas para cada espécie de produção, como acontece naquelas fábricas onde se sabe previamente que esta e aquela côr, esta e aquela pasta devem ser cozidas a determinada temperatura para chegar a determinados resultados.
Além disso, e ainda no intuito patriótico de criar discípulos, Rafael não ocultava aos operários os seus processos, e diligenciava constantemente que eles aprendessem, indo mesmo ele para a oficina à hora matutina do trabalho, descansando quando eles descansavam, tratando-os mais como companheiros do que como seus empregados.
A modelação do barro devia ser para o eminente artista como que a continuação da sua já consagrada obra artística; mas as cores e vidrados nos produtos cerâmicos têm os seus segredos que ele desconhecia e que só uma prática consegue desvendar.
O pintor da tela vai vendo os efeitos de côr das suas tintas combinadas, e facilmente destrói as que não lhe agradam, para as substituir por outras. Ao ceramista não acontece o mesmo. Os tons de côres são preparadas e aplicadas no biscoito são em geral diferentes depois de cozidas no forno.
É preciso portanto ter uma longa prática dos efeitos do calor intenso na combinação dos óxidos que dão as côres da cerâmica, para afoitamente meter num forno produtos dedicados e trabalhosos, com a certeza de que o colorido vem tal e qual se imaginou. Rafael não tinha essa prática; contudo, logo às primeiras tentativas conseguiu valiosas côres e vidrados preciosos.”
Trabalho de dois operários
Deixemos Rafael entregue às suas experiências de cores e vidrados, e fechemos o livro …