D. Leonor colocou o irmão no trono e “direcionou” financiamento para assegurar a continuidade do Hospital Termal das Caldas
No sábado, 18 de outubro, o Centro de Artes acolheu a conferência “À viva memória e fama immortal”: D. Leonor de Lencastre e o hospital de Nossa Senhora do Pópulo no século XVI” que foi proferida por Lisbeth Rodrigues e decorreu no âmbito dos 500 anos do seu legado.
A académica – que dedicou a sua tese de doutoramento ao hospital das Caldas – conhece bem a fundação e o funcionamento do mesmo. Na verdade sempre se deixou interrogou como teria sido em pleno século XV financiar uma estrutura tão grande. “Como teria sido possível vestir e alimentar e providenciar mais de cem indivíduos em simultâneo em pleno século XV?”. Para a investigadora, a demanda só foi possível pois o financiamento do Hospital foi conseguido por D. Leonor com a Coroa Portuguesa.
Em 1503, a rainha comprou ao rei as jugadas (imposto pago por cada jugo de bois) de Óbidos, Aldeia Galega, Merceana e Aldeia Gavinha. Em 1508, D. Leonor doou-os ao hospital termal. Fê-lo em satisfação do seu dote que 30 anos após o seu casamento ainda não tinha sido pago. “Foram decisões que acabaram por garantir a sustentabilidade do hospital das Caldas”, contou a investigadora.
“D. Leonor era uma mulher muito perspicaz, inteligente, astuta e determinada”, disse Lisbeth Rodrigues.
Apesar de ter sido também alvo de situações muito dramáticas como a morte do seu único filho e de ter vivido o assassinato do seu irmão D. Diogo, em 1484, pelo seu marido, o rei D. João II, a rainha “não se deixou abater pelas tragédias, isto é, transformou as suas fraquezas em forças para levar avante vários projetos”.
A convidada relembrou que o Hospital Termal das Caldas, fundado em 1485, é anterior ao de Todos os Santos que surgiu em Lisboa em 1492 e que, de facto, houve a ideia de travar os monges da Ordem de Cister que queriam cada vez mais território.
Nas Caldas, disse a académica, a Rainha não criou apenas um edifício, “criou uma comunidade”. Além do mais, esta esteve nas Caldas pelo menos em quatro ocasiões, numa altura em que era “mesmo muito difícil viajar em Portugal”.
D. Leonor era de facto uma mulher poderosa e segundo a convidada “tinha mais poder que muitos dos homens da sua época, tendo capitalizado a sua relação com o irmão, D. Manuel”.
Lisbeth Rodrigues diz que há uma relação de dádiva: “ela pede e ele acede. Foi ela que o fez rei de Portugal”.
A oradora é professora de História Moderna na Universidade do Porto, onde ensina um módulo sobre Assistência, onde são feitas referências constantes ao Hospital Termal e à ação da Rainha.
Em termos cronológicos, a investigadora considera que falta um estudo dedicado ao século XVII. Falta também um estudo sobre os doentes e as doenças que eram ali tratadas e a dinâmica que existia. “Falta também um estudo sobre o recrutamento das pessoas que serviam no hospital”, contou Lisbteh Rodrigues, acrescentando que no Hospital Termal, no tempo da Rainha, havia cinco escravos que laboravam no Hospital e que por isso “não tinham salário”.
Com a administração dos Loios, deixa de haver escravos nos serviço do hospital. Já a escolha dos provedores era feita sempre sob a alçada real e a partir de 1532 passam a ser padres a assegurar os lugares mais importantes da hierarquia.
No Livro do Compromisso expressa-se preocupação com quem serve no Hospital que em idos tempos contratava pessoas com incapacidades que “varriam o chão das enfermarias”, mostrando que a inclusão começou cedo.
Os doentes tomavam os banhos durante as madrugadas pois “acreditava-se que era nessa altura em que mais se transpirava”. Os banhos termais aconteciam por volta das duas da manhã. Os doentes voltavam para as suas camas, eram bem embrulhados e desta forma ao transpirarem “libertavam os maus humores, curando os seus males”. Também havia quem pagasse e ficasse alojado nas casas da localidade. “A diária incluía alimentação e os banhos”, contou a investigadora que continuará a estudar este Hospital “criado por uma rainha e bem sucedido, e que surgiu de um local ermo”, rematou.


































