A diretora dos Museus Malhoa, Cerâmica e Joaquim Manso (Nazaré) pretende apostar em parcerias e novas linhas de ação que levem a comunidade aos museus. Em entrevista, aborda o projeto que apresentou e que lhe valeu a nomeação para o cargo.
Qual a razão que a levou a concorrer para a direção destes museus, atravessando o Atlântico?
Sobretudo, o desejo por conhecer novas realidades museológicas, a vontade de colaboração com outras pessoas e redes de articulação, bem como a expetativa de novas aprendizagens e trocas culturais. A generosidade e a gentileza das pessoas com quem me tenho relacionado tem feito com que a experiência esteja a correr da melhor forma. Os processos de mudança são repletos de desafios, mas o facto de aqui ter chegado para desenvolver um processo de gestão em museus favoreceu, creio, a criação de uma ambiência de colaboração, um privilégio pelo qual sou extremamente grata.
Do projeto que apresentou no concurso quais as principais linhas de ação? Quais serão as primeiras ações que vai implementar?
Diante de uma realidade em que a desigualdade e a indiferença são tão evidentes, penso que é imperativo para os museus a sua interação com a sociedade, mobilizando e envolvendo as pessoas nestas instituições, para proporcionar o seu efetivo impacto na sociedade. Seguindo esta premissa, entendo que mais do que instituições voltadas unicamente para os seus acervos, a gestão dos museus deve-se voltar para as suas potencialidades em termos das comunidades, territórios e narrativas para a arte – pilares das programações culturais que apresentei.
Qual é o orçamento que possui para o funcionamento dos três museus?
Conforme orienta a legislação portuguesa, o orçamento dos equipamentos culturais é definido conforme o Orçamento do Estado. Desta forma, e como é do conhecimento de todos, ainda não está definido o orçamento para o próximo ano. Os museus contam com 15 colaboradores. Considero que os museus pedem o estabelecimento de novas formas de atuação e colaboração, que permitam o incremento das suas atividades, bem como que possibilitem uma maior interação com a realidade atual. Este é um desafio transversal às instituições culturais, não só em Portugal, como noutros países.
A futura municipalização dos museus de Cerâmica e da Nazaré, é algo que decorrerá a médio ou longo prazo? O que pensa fazer em relação à dinamização desses dois espaços?
O processo de transferência de competências para os municípios, pelo facto de envolver diferentes organismos e ministérios da administração pública, ainda não tem uma data definida para estes espaços. Enquanto museus que, atualmente, fazem parte de uma mesma unidade orgânica, o programa previsto na minha candidatura prevê a realização de atividades em ambas as instituições. Outro ponto importante é o facto de que o incremento da presença digital das três instituições, conforme abordado anteriormente, está previsto ser realizado pela Direção Regional de Cultura do Centro (DRCC).
O Museu da Nazaré necessita de obras urgentes. A degradação do edifício é evidente. Quando avançará a recuperação daquele espaço?
Estamos a aguardar as definições orçamentais para que se possa confirmar a realização das atividades previstas para cada uma das instituições – especialmente, como é de se esperar, as ações que dizem respeito às necessidades de conservação dos espaços e acervos.
Creio que está a pensar em estabelecer parcerias. Se sim, quando, com quem e que projetos se vão realizar?
Tenho dialogado com diferentes agentes culturais caldenses e de outras partes – inclusive, gostaria, até, de conversar com mais pessoas. Espero que esta abertura contribua, para a manutenção das atividades que já estavam previstas e que favoreça a realização de outras ações. A colaboração e a cocriação são fundamentais para o que planeio realizar. Neste sentido, a DRCC já colabora por exemplo com a ESAD no projeto Casulos, por exemplo. Outros parceiros fundamentais são a Liga de Amigos do Museu José Malhoa e o Grupo de Amigos do Museu da Cerâmica. Estão a ser continuadas as parcerias já muito bem realizadas pelo anterior diretor, Carlos Coutinho – a quem agradeço a generosidade com que atua desde a minha chegada. Com as premissas que trago, aliadas ao trabalho já desenvolvido pela DRCC, as instituições continuarão as parcerias com a sociedade, como as exposições e das atividades de programação. Já se realizam várias parcerias com entidades da região e espero mantê-las e ampliá-las. As instituições continuarão a criar diálogos com entidades ligadas ao património, ensino, investigação, turismo, para a realização de protocolos de colaboração. Provocar envolvimentos será a tarefa destes museus para os próximos anos, adensando a percepção de que são espaços de inspiração para as comunidades onde atuam: ponto de encontro, lazer, reflexão, construção de conhecimentos. Como tal, todas as escolas, de qualquer grau de ensino, serão sempre muito bem vindas a estas instituições. ■
Perfil

Nicole Costa
Diretora
Tem 40 anos e é doutorada em Antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde também fez mestrado. Possui especialização em arte-educação e licenciatura em desenho e plástica.
Percurso Profissional Trabalhou no Instituto Ricardo Brennand e na Fundação Joaquim Nabuco no Recife. Colaborou com a criação da Rede de Educadores de Museus e Instituições Culturais de Pernambuco (Remic-PE). Promoveu encontros formativos entre educadores de museus da região. Em museus, realizou formações de equipas e pesquisas, como “Estética da Periferia”, no Museu de Arte Moderna Aluísio Magalhães. Entre 2019 e 2021 foi diretora geral do Paço do Frevo, instituição cultural de Recife. Foi diretora de conteúdo, liderando atividades no Centro de Documentação e as coordenações de música, dança e educação.
Ligação ao Ensino Coordenou cursos de Bacharelato em Artes Visuais e de Fotografia na Associação de Ensino Superior de Olinda (Pernambuco). Fez consultoria educativa na Fundação Roberto Marinho, formação de professores e esteve na coordenação cultural voluntária na Central Única das Favelas de Pernambuco.
Passatempos Ler e cozinhar estão entre as atividades favoritas. Arrisca fazer origamis e outras manualidades.
Se não fosse diretora …”Talvez fosse artista de artes visuais ou literárias,para provocar os públicos a pensar e a agir na construção de sociedades mais empáticas e que valorizam a diversidade”.
“Caldas tem acervos que deviam ser conhecidos em todo o lado”

Dirigente pretende dar a conhecer coleções museológicas locais e estabelecer parcerias internacionais
Nicole Costa considera que uma das coisas “mais impressionantes nas Caldas é o facto de que possui instituições museológicas com acervos incríveis, que precisam de ser difundidas, por todas as partes”. A dirigente considera inclusivamente que os museus de José Malhoa e da Cerâmica “possuem coleções fundamentais para a cultura portuguesa”.
A diretora espera “criar oportunidades para que os caldenses e os demais portugueses as conheçam”. Nicole Costa pretende que para aqueles que já as conhecem, “que façam destes lugares os seus espaços prediletos, visitando-os com regularidade, encantando-se e inquietando-se a cada encontro com estas instituições”, referiu a responsável. A diretora quer, ainda, realizar parcerias com pessoas e instituições que promovam estes museus internacionalmente – caso, por exemplo, das atividades planeadas para a Temporada Cruzada Portugal-França, a decorrer em 2022. Além disso, planeia que as instituições “sejam favorecidas pelo facto de ser brasileira, para que possam traçar novos elos entre Portugal e o Brasil”.
Para a responsável, 2022 traz o desafio “de ser um período em que as incertezas e as desigualdades sociais incrementadas pela pandemia permaneçam”. Por esse motivo, crê ser importante para as instituições uma retoma gradual e cuidadosa dos seus envolvimentos com os diferentes públicos”. Assim, tal como propôs na sua candidatura, os programas que tem pensados “procurarão aproximar os museus de temáticas referentes à sociedade, assim estas propostas procurarão provocar os públicos das instituições a estar ainda mais próximos dos seus museus. Seguindo nesta linha, espera realizar processos formativos internos, para orientar as equipas para esta nova perspetiva institucional.
Além disso, vai apostar num novo projeto educativo, para os diferentes públicos, e a criação de processos de curadoria baseados na cocriação estão entre as propostas que planeia, gradualmente, implementar. Na sua opinião, por entender que os serviços de mediação cultural “são os pilares do cumprimento do papel social dos museus”, é nas atividades educativas que se vão iniciar as proposições do plano de atuação. É no Museu José Malhoa e no Museu da Cerâmica que em breve haverá um novo projeto educativo, “planeado para servir os diferentes públicos e pautado pela perceção de que estes equipamentos culturais devem, também, colaborar ativamente com as sociedades que representam, além mesmo de envolver outros grupos nas suas atividades, para que as suas mensagens sejam amplamente percebidas”. Também está previsto que a DRCC invista, com o apoio do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), em ações que visam digitalização do acervo destas instituições. ■






























