Os genes herdam-se?

0
1366

É de todos sabido que Rafael Bordalo Pinheiro teve um filho de nome Manuel Gustavo e que a relação existente entre os dois era muito mais do que um normal vínculo entre pai e filho. Eles foram cúmplices na vida, no trabalho e na criatividade.
Penso que Manuel Gustavo foi prejudicado por ser filho de quem era; os filhos dos génios são sempre comparados aos seus progenitores, e dessa comparação saem habitualmente desvalorizados. Este desenho de Rafael, de bata e boina de trabalho, acariciando um gato – será a Pili ou o Pires? – é da autoria do filho, e daqui podemos concluir que o seu traço não é tão harmonioso como o do pai, mas não deixa de ser um bom desenho que retrata o artista em toda a sua plenitude.
Leal da Câmara escritor, professor e caricaturista, em 28/9/27 proferiu um elogio ao Prof. Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro, no dia da inauguração da Aula de desenho ornamental que tinha o seu nome, na Escola Industrial de Fonseca Benevides.
Eis algumas das palavras ditas por Leal da Câmara:
[…] “Foi com certo alvoroço que eu recebi o encargo que me foi dado pelo meu ilustre Director e amigo o Sr. Dr. Adrião Castanheira mas, falar de um artista como Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro, defini-lo, indicar, tão pobremente seja, a sua figura moral e o papel que desempenhou na Sociedade Portuguesa durante os breves anos que andou por esta vida, poderia ser fácil se se tratara de outro artista que não tivesse, como este, depois do seu duplo nome de Manuel Gustavo, o nome familiar e predestinado de Bordalo Pinheiro.
Não é que a personalidade do seu ilustre pai empasse a não menor personalidade do nosso querido Manuel mas, quando esse pai se chamou Rafael Bordalo Pinheiro e que, por assim dizer, açambarcou a atenção da sua época com o brilho singular do seu fulgurante talento, tão polimorfo, – tocando todos os assuntos e realizando – aqui e acolá – em Lisboa e no Rio de Janeiro, em Paris e em Madrid, todas as fantasias criadas pelo seu genial engenho, escrevendo, dia a dia, a história dos costumes portugueses com o bico do seu lápis e transformando o barro das Caldas em mil formas fantásticas – qual fôra um feiticeiro ou um mago de conto de fadas […].
Lembro-me do Manuel Gustavo da primeira época, cheio de vida e de mocidade, do tempo em que desenhava tudo e todos com aquele traço enérgico, retilíneo, que se desenvolvia em linhas quebradas vigorosas e que, no seu conjunto representavam as charges mais hilariantes e inesperadas. Esses desenhos, já nesse tempo contrastavam com a grafia nervosa e ligeira do pai Bordalo, pela audácia e pelo rigor, bem próprios da sua exuberante juventude.”
A partir daqui podemos lança-nos em busca da obra de Manuel Gustavo. E aviso-vos já: não é nada pequena!

- publicidade -