“Os Acontecimentos”, de David Greig – Uma trágica história da vida real interpretada por dois actores e um coro

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Gazeta das Caldas

OsAcontecimentosNo sábado, dia 10 de Outubro, o auditório do CCC esteve a meio gás para assistir à recente produção dos Artistas Unidos, companhia que voltou a deslocar-se às Caldas da Rainha, desta vez para apresentar “Os Acontecimentos”, uma peça da autoria do escocês David Greig com encenação de António Simão. Em cima do palco, os actores Andreia Bento e João Pedro Mamede contracenaram lado a lado com o Coral das Caldas da Rainha, dirigido por Maria Jorge. Em digressão desde Fevereiro, esta foi a primeira vez que o elenco actuou com um coro local: até então, as vozes estiveram representadas por um grupo da Escola Superior de Teatro e Cinema e elementos do Coro da Universidade de Lisboa. Aplaudida de pé pelo público, a estreia correu bem, com a presença de 30 coristas caldenses que revelaram dar cartas na representação.

Em 2011, Anders Breivik abrira fogo num acampamento de jovens em Utoya, na Noruega. Horas antes, fora o responsável por explosões combinadas em Oslo. Dois atentados que resultaram na morte de cerca de 70 pessoas e que foram a inspiração para o dramaturgo David Greig.
“Os Acontecimentos” conta a história de uma tragédia, protagonizada por um atirador que interrompe o ensaio de um coro e, à semelhança do terrorista norueguês, faz uso da arma que leva na mão. Andreia Bento é Claire, a responsável pelo grupo coral que assistiu ao massacre, mas conseguiu sobreviver. Passado um ano, ela continua a questionar-se sobre os motivos que levaram aquele homem a cometer a atrocidade, perguntas – muitas perguntas – que acabam por tornar-se numa obsessão pelo atirador, com quem chega a encontrar-se na cena final. Pelo caminho, entrevista os familiares, os amigos e o dirigente do partido de extrema-direita do qual o terrorista dizia fazer parte. Um conjunto de personagens que ganha forma com a interpretação de João Pedro Mamede, que também dá vida ao atirador, à companheira e ao psicólogo de Claire.
A agonia de Claire consegue ser suavizada com a presença do coro, pelo menos para quem assiste do lado da plateia. David Greig chegou mesmo a dizer, numa entrevista ao Público, que a intervenção do coro lhe permitia ser sombrio no texto, sem que os espectadores entrassem em desespero. Os 30 elementos do Coral das Caldas da Rainha estiveram à altura da peça, não só ao nível do canto, mas também na representação. Houve direito a falas e, nalgumas cenas, à actuação em pleno centro do palco.
Joaquim António Silva (Quitó), maestro do Coral, elogiou o facto da companhia teatral pensar nos coros locais como uma opção em palco, revelando que “a experiência foi interessante e que as pessoas gostaram e aderiram bastante. Só foi pena que não tenham podido participar todos”. Ficaram de fora 10 coralistas, uma delas Leonor Leitão, que falou com a Gazeta das Caldas no final do espectáculo, enquanto espectadora. “É uma maneira diferente de fazer teatro e apresentar um coro, gostei muito. Vê-se que, ao contrário do que as pessoas pensam, os grupos corais não são uma chatice”, disse.
Na opinião da actriz Andreia Bento, “apesar da peça ser inspirada no acontecimento da Noruega, pode passar-se em qualquer comunidade, mostrando que não somos apenas bons ou maus. Serve para as pessoas pensarem um bocadinho na sociedade em que vivemos”. A sua personagem, Claire, ainda de que uma forma excessiva, acaba por ser o espelho da sociedade, explicou a actriz, pois “coloca todas as perguntas que surgem quando estes atentados acontecem”. Em “Os Acontecimentos”, contudo, não são dadas as respostas, muito pelo contrário. Fica o espaço para que o espectador tire as suas próprias conclusões.

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