Obras da Hansi Staël produzidas na Secla em exposição em Lisboa

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2-ferreiraIlona“Hansi Staël – cerâmica, modernidade e tradição”. Assim se designa a exposição que abriu portas em Lisboa, a 19 de Setembro na galeria Objectismo. A  artista húngara foi directora artística da Secla durante os anos 50 e nesta mostra, que tem curadoria de Rita Ferrão, podem ser apreciadas várias obras produzidas na fábrica caldense. Em preparação está já uma grande exposição da autora que terá lugar nas Caldas no próximo ano, não só de cerâmica, mas também de outras vertentes do seu trabalho como a pintura, o desenho e a gravura (ver caixa).

Hansi Staël (1913-1961) foi directora artística da Secla entre 1950 e 1959, ano em que teve de se retirar por motivo de doença, tendo vivido nas Caldas durante aquela década. A Galeria Objectismo inaugurou recentemente uma exposição desta artista, onde podem ser vistas peças desenvolvidas por algumas linhas para produção industrial, incluindo algumas peças modelo, únicas e assinadas pela própria autora. Também podem ser apreciadas obras feitas no seu estúdio e que estão disponíveis para venda.
“É uma oportunidade única para adquirir e apreciar obras desta autora ”, disse Nuno Cardoso, responsável pela galeria Objectismo, situada na Rua D. Pedro V, em pleno coração de Lisboa perto do Príncipe Real.
O arquitecto orgulha-se deste espaço por ser o único em Lisboa que se dedica à cerâmica portuguesa (com exclusão da Galeria Ratton que se dedica principalmente ao azulejo). Nuno Cardoso conta que há procura sobretudo por clientes estrangeiros que valorizam o património da cerâmica industrial e de autor. Em Portugal, devido à proximidade e por serem em muitos casos objectos de uso quotidiano, “não se dá o devido valor a estas obras”.
Além do intuito comercial, esta galeria trabalha as suas exposições tendo em conta “um fundo  museológico e de investigação”. Como tal, a ideia de fazer mostras temáticas referentes à produção de fábricas “será sempre um dos objectivos da loja”, referiu o responsável.
Além da inauguração da mostra, foi lançado o livro “Hansi Staël – Cerâmica, modernidade e tradição”, da autoria da curadora da mostra, Rita Gomes Ferrão. As obras de Hansi Staël que se encontram na Objectismo custam entre os 30 e os 900 euros.
A mostra estará patente até 19 de Outubro no número 55 da Rua D. Pedro V.

Filha quer organizar mostra nas Caldas

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Ilona Thykier, filha de Hansi Stael, ficou muito feliz ao ser contactada por Rita Ferrão, quando a investigadora a informou que estava a realizar um trabalho académico sobre a sua mãe. “Foi uma surpresa muito grande pois eu nunca tinha pensado na ideia de fazer uma exposição”, disse Ilona Thykier.
“Estou encantada e gostaria muito de fazer uma nova exposição nas Caldas pois foi onde a minha mãe também cresceu como artista”, disse à Gazeta das Caldas, durante a inauguração da exposição.
Ilona Thykier que é restauradora de arte e escolheu ficar a viver em Portugal, lembra-se de, com nove anos, acompanhar, algumas vezes, a sua mãe à Secla, “quando vínhamos nas férias do Verão da Suécia para a visitar”. Além da fábrica caldense recorda-se que nos primeiros anos “ficávamos na casa do senhor Ponte e Sousa [um dos proprietários da fábrica]” e só no último ano é que visitou a casa da mãe, na Rua Diário de Notícias.
A filha da ceramista teve uma participação muito activa nesta exposição, realizada em Lisboa, pois colocou à venda algumas peças da sua colecção e ainda restaurou algumas obras da mãe para as mostrar ao público. Nuno Cardoso havia adquirido num leilão cinco grandes pinturas que Hansi Staël fez, em 1954, para o paquete Uíge. Era o menor dos seis paquetes integrantes da frota da Companhia Colonial de Navegação que se destinava ao transporte de passageiros e carga para Angola. Medem 210 por 100 centímetros e representam a Ceifa, a Apanha da Fruta, a Vindima, a Caça e a Pesca. “Agora comprei aquelas pinturas e vou restaurá-las”, disse Ilona Thykier.
Na segunda-feira, 29 de Setembro, a filha da Madame Staël (como era conhecida nas Caldas) reuniu com responsáveis autárquicos que se mostraram interessados na organização da exposição. Ilona Thykier, aproveitou a ocasião para visitar espaços onde esta pudesse vir a ser apresentada, como o Museu do Ciclismo e a galeria do CCC.
“A minha mãe viveu nas Caldas da Rainha durante 10 anos e por isso era importante realizar aqui uma exposição do seu trabalho”, disse à Gazeta. Esta iniciativa deverá realizar-se no próximo ano e, além da Câmara, Ilona Thykier vai tentar contactar com alguns patrocinadores. “Fiquei contente pois constatei que há nas Caldas entusiasmo para realizar a exposição da minha mãe”, concluiu.

“O seu trabalho era muito inovador para a época”

Quem ficou muito surpreendido com o interesse gerado pela exposição de Hansi Stael, em Lisboa, foi Ferreira da Silva. O mestre ceramista era chefe da secção de pintura da Secla na época em que Hansi Staël estava na direcção artística. A artista húngara veio para as Caldas a convite de Ponte e Sousa, sócio maioritário da fábrica caldense com quem travou conhecimento em Lisboa no Atelier de João Fragoso. O escultor, que era caldense, tinha uma atelier de cerâmica em Lisboa.
Ferreira da Silva salientou que Hansi Staël conseguiu dar às peças um “sabor” português. Referiu por exemplo que a autora fazia “serviço de louça, decorados com  motivos portugueses, relacionados com o quotidiano das feiras ou do mar”.
O artista contou como Hansi Stael desenhava e pintava muito bem e “fazia os desenhos tão simplificados que os pintores da fábrica rapidamente conseguiam lá chegar”.
Para Ferreira da Silva, a directora artística “tinha um trabalho muito bonito, com um efeito muito luminoso, atmosférico até, o que era algo novo na época” e que não tinha nada a ver com o estilo de cerâmica das Caldas.
O mestre contou que a artista húngara só vinha à Secla um dia por semana, normalmente à segunda-feira, e que trabalhava mais um pouco à tarde. “Falava comigo e com o Pinto Ribeiro que era sócio e divulgador do produto”, contou à Gazeta das Caldas.
Segundo Ferreira da Silva, a artista e designer húngara teve um papel importante sobretudo porque “era totalmente diferente do bordalesco que aqui imperava”. Segundo o mestre caldense, as peças de Hansi Staël “tiveram uma aceitação extraordinária para países como EUA, Inglaterra, Alemanha, Suécia, África do Sul, devido a estilo que ela imprimiu aqui”. Como tal, para o autor faz todo o sentido realizar uma exposição da Madame Staël nas Caldas da Rainha.

Uma casa na fábrica

Para a curadora da mostra, Rita Gomes Ferrão, Hansi Staël  teve uma grande importância para a Secla, dado que “fez uma abordagem inovadora na produção corrente e com ela conquistaram o mercado internacional”. A fábrica que até à sua chegada produzia obras próximas do tradicional das Caldas “passou a produzir outras linhas com um design mais moderno e sintético, mais adequado aos mercados externos”, explicou a investigadora. Além da produção industrial, Hansi Staël dedicou-se também ao projecto do Estúdio Secla, local ligado à fábrica para onde passaram vários artistas portugueses e estrangeiros.
Rita Ferrão ainda explicou que a artista trabalhou nas Caldas praticamente até a sua doença (esclerose múltipla)  a incapacitar em 1959, tendo falecido dois anos depois. Resultaram dessa fase um conjunto de objectos “que revelam, por um lado uma fase mais madura em termos artísticos, mas por outro lado demonstram a fragilidade da doença que afecta muito o lado motor e ela acaba por se afastar”, disse a investigadora, que também será responsável pela exposição nas Caldas.
Nos últimos anos de vida de Hansi Staël já lhe era muito difícil subir a Rua Diário de Notícias, de onde habitualmente via gente que vinha vender à praça e trazia os seus produtos nos burros. Para solucionar este problema foi instalada uma pequena casa, dentro da fábrica, junto ao laboratório, onde a artista passou a viver.

Natacha Narciso
nnarciso@gazatacaldas.com

Quem tem peças para mostrar de Hansi Staël?

Gazeta das Caldas vai aliar-se a esta iniciativa e pede também a colaboração de caldenses que queiram mostrar as obras que possuem de Hansi Staël.
Os interessados deverão dar a conhecer as suas obras comunicando com a curadora Rita Ferrão, através do e-mail ceramicamodernistaemportugal@gmail.com ou na Gazeta das Caldas que lhe transmitirá as informações recolhidas.

N.N.

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