Obra gráfica de Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro em destaque em Lisboa

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Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro“Através do traço de Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro” designa a exposição inaugurada a 19 de Abril no Museu Bordalo Pinheiro, em Lisboa, que dá uma visão transversal do trabalho de caricaturista, ilustrador, cartoonista e desenhador que foi o filho de Rafael Bordalo Pinheiro. A mostra, que vai ficar patente até 14 de Setembro, integra vários tipos de trabalhos gráficos (alguns desenhos são inéditos), assim como algumas peças de cerâmica de Manuel Gustavo (1867-1920). As obras fazem parte da colecção do próprio museu ou de outros como do Museu Militar e da Biblioteca Nacional e ainda possui obras de colecções privadas. Entre os visitantes da mostra, Gazeta das Caldas encontrou o cartoonista António que considera que se justificava o regresso da caricatura em cerâmica nas Caldas da Rainha.

“Manuel Gustavo foi um bordaliano e trabalhou na sequência da obra do seu pai, Rafael Bordalo Pinheiro”. Palavras de Mariana Caldas, a comissária desta mostra, constituída por vários núcleos. Um deles, designado “Desenho em Barro” inclui peças de cerâmica, feita na fábrica das Caldas da Rainha e “onde Manuel Gustavo fez uso do desenho ou fez no barro uma clara abordagem gráfica”, disse a técnica e investigadora daquele museu. Nos dois pisos do Museu Bordalo Pinheiro podem ser apreciados os primeiros trabalhos de ilustração do artista que foram publicados nas publicações do pai, Pontos nos Is, António Maria e a Paródia. Nestas, disse a investigadora, “ele vai desenvolver o seu trabalho como desenhador e inovar nos cabeçalhos e nos frisos com o uso da cor”. 

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Há também um núcleo dedicado ao Humor no Quotidiano e que é dedicado ao cartoon. Nestes trabalhos, Manuel Gustavo recorre à figura do Zé Povinho, criada pelo pai, e que vai usar para apresentar situações relacionados com aspectos sociais e políticos da sua época. Presentes estão ainda as colaborações publicadas no Século, no Comércio do Porto e no Diário de Noticias Ilustrado.

Uma das grandes novidades desta mostra é “que fomos à procura das grandes influências internacionais que Manuel Gustavo tinha e encontrámos várias obras que ele adaptou ao contexto português”, disse Mariana Caldas, referindo-se, por exemplo, às obras de Busch ou de Caran d’Ache e que estão colocadas lado a lado com os trabalho de Manuel Gustavo. No mês de Maio realizam-se várias actividades paralelas como uma demonstração de esgrima. E porquê? “Porque Manuel Gustavo era um sports man como se pode ver em muitos dos seus desenhos. Entre as modalidades praticadas, conta-se a esgrima”, responde a comissária da exposição. Apesar de ter sido um praticante amador, o artista aprendeu a modalidade com um dos mestres da época – António Martins -, tendo também praticado futebol e ciclismo. “Esta era a exposição que faltava realizar aqui no Museu”, disse Pedro Bebiano Braga, director do Museu e que considera que Manuel Gustavo foi de facto um bordaliano, mas que conseguiu inovar no traço.

O que distingue Rafael do seu filho? Além da diferença geracional, para o director do museu, Manuel Gustavo “tem um traço mais anguloso com uma expressão gráfica de movimento diferente do seu pai”. Na sua opinião também teve preocupações com causas diferentes do seu pai Rafael. O responsável considera que “não há mal nenhum em ser bordaliano, só que Manuel Gustavo apresenta propostas diferenciadas, em especial na área da cerâmica como podemos ver aqui nalguns exemplares nesta exposição”, rematou. Para Pedro Braga, fazia todo o sentido apresentar esta exposição nas Caldas da Rainha. A inauguração de “Através do traço de Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro” foi muito concorrida, contou com individualidades ligadas à cultura da capital e ainda alguns caldenses que se deslocaram para a inauguração desta exposição.

O regresso da caricatura em cerâmica?

“Esta é uma exposição muito interessante, com trabalhos que eu não conhecia. Tenho muita pena que estas exposições não tenham catálogo de modo a poder-se levar um pouco desta obra para casa”, disse o caricaturista António, um dos visitantes da mostra. Sobre Manuel Gustavo, o cartoonista do Expresso afirmou que foi “um homem que ficou um pouco na sombra do pai”, mas que “é um autor de grande qualidade e lamento que as pessoas não conheçam a sua obra”.

António mantém-se ligado às Caldas e ao Cencal, onde em final dos anos 80 esteve a coordenar um curso de caricatura em cerâmica. Questionado se faria sentido relançar artistas humoristas na cerâmica, o cartoonista acha que sim, mas preferia que a formação fosse integrada numa escola superior de artes, “como uma disciplina opcional”, acrescentou. Até porque “só com formação contínua se podem esperar bons resultados”, disse. Na sua opinião, é preciso ainda clarificar alguns aspectos: “não vale a pena fazer mais varinas porque já não a as há, mas em compensação há tanta coisa nova para retratar”.

Para este autor querem-se caricaturistas do século XXI, mas é preciso também apostar na qualidade estética e plástica. “O hand made só por si é um equívoco que só funciona e só traz valor acrescentado se tiver grande qualidade estética e plástica e é disso que nós temos que ir à procura. Aí nesse caso há mercado”, afirmou. Além do mais, os portugueses estão mais exigentes e os que nos visitam têm o mercado dos seus países como referência onde há coisas de grande qualidade. Neste jogo, diz o cartoonista, “a mediocridade não tem lugar”.

Cartoons de António do Metro em breve nas Caldas?

 

Notícias das Caldas

Durante a exposição, António contactou com a livreira Isabel Castanheira e logo surgiu a hipótese de trazer às Caldas a sua exposição de esboços de caricaturas que agora decoram a estação do Metro do Aeroporto de Lisboa. “Penso que seria interessante apresentar a exposição nas Caldas. Considero que as iniciativas devem ir ao encontro das pessoas”, disse o autor. António conta que vem com regularidade às Caldas em especial à Fábrica Bordalo Pinheiro, acompanhado de profissionais do mesmo ofício, já que preside ao World Press Cartoon e é à fábrica caldense que traz os seus congéneres estrangeiros para apreciar as peças bordalianas, sobretudo as muitas caricaturas do seu universo. ”Quando os trago à fábrica ficam muito sensibilizados com os trabalhos ali criados e muitos compram as peças”, revelou. N.N.

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