“O Zé Povinho nunca acaba de ser desenhado”

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No primeiro debate participaram Carlos Querido, Raquel Henriques da Silva e João Alpoim Botelho

Símbolo do povo e a celebrar o 150º aniversário, mantém-se na pena dos atuais cartoonistas

No sábado, 20 de Setembro, o café-concerto do CCC acolheu a primeira conferência destinada a refletir sobre esta personagem da sátira portuguesa, tentando entender qual é o papel de Zé Povinho na sociedade contemporânea, se esta personagem ainda nos representa e se ainda incomoda. No debate, moderado por Carlos Querido, participaram a historiadora de arte, Raquel Henriques da Silva, o diretor do Museu Bordalo Pinheiro, João Alpoim Botelho e o curador da mostra sobre o Zé Povinho, patente no CCC, Jorge Silva.

Esteve prevista a participação de Isabel Castanheira que não pôde comparecer, por motivos de saúde. Para a historiadora de arte, Raquel Henriques da Silva, Rafael Bordalo Pinheiro foi “o mais importante artista português do século XIX pois “fez a ligação entre a arte e a indústria”.

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O surgimento do Zé Povinho em 1875 numa caricatura do jornal bordaliano, Lanterna Mágica foi vista à lupa na sessão onde se debateu o contexto nacional e internacional.

Sobre o Zé Povinho afirmou-se na conferência que este é, na verdade, “a criatura que sobreviveu ao seu criador” e que logo poucos anos depois de ter sido criado por Bordalo, passou a ser desenhado por uma série de outros autores e inclusivamente usado pelas mais diversificadas vertentes políticas.

Já para João Alpoim Botelho, Zé Povinho “é uma figura que nunca acaba de ser desenhada” e que ainda hoje é reproduzida pelos atuais cartoonistas.

O convidado relembrou que em tempos de grandes ataques à liberdade de expressão, e de cancelamentos de programas de humor, por causa de uma piada “fazem-nos pensar que de facto a Liberdade tem que ser conquistada todos os dias”, disse.

Na partilha foram dissecados os mais variados aspetos sobre esta personagem, a começar pelo próprio nome. Para Raquel Henriques da Silva, a figura satírica não tem um significado fechado, tendo identificado alguns aspetos de auto-representação de Bordalo e vários sinais de modernidade. “Há um cerne de ironia pois sendo Zé Povinho um analfabeto, os seus desenhos necessitam de escrita, de legendas explicativas”.

Sobre o facto de ele se chamar Zé Povinho, “diz-nos que ele não chega a ser Povo”. Por outro lado, o uso do diminutivo “não só exprime afeto como também desdém”.

Já para Jorge Silva, os atuais autores quando reproduzem a personagem “pretendem referenciar Rafael Bordalo e fazem-no mantendo as características do Zé Povinho”. É hoje representado com a mesma cara redonda, barba, chapéu, colete e camisa branca. “Não se atrevem a mudar nada na sua indumentária”, referiu.

No sábado, 27 de setembro, às18h00, no Café-Concerto, haverá o segundo debate que contará com as presenças de Nuno Saraiva e de Cristina Sampaio, ilustradores e cartoonistas e ainda do académico Paulo Jorge Fernandes.

A conferência pretende abordar o futuro do humor em Portugal.

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