Meia centena de cuteleiros, de Norte a Sul e de outros países como Paquistão ou Argentina, transformaram o CCC num espaço de homenagem ao ofício milenar da cutelaria. Durante dois dias houve vendas, partilhas, tertúlias, concursos de corte e convívio numa edição de estreia da Naifa, evento que cativou participantes e público. Para o ano, haverá novo evento internacional
O foyer do CCC deu lugar a algo completamente novo. Perto de meia centena de expositores de cutelaria nacional e internacional, reuniram-se nos dias 5 e 6 julho na Naifa, iniciativa, que segundo a própria organização, atraiu mil pessoas.
Organizado pela Centra, o Grupo de Amigos do Centro de Artes, o evento foi um espaço de encontro entre artesãos, colecionadores e público, com demonstrações, competições de corte, tertúlias e degustações, sempre tudo em volta da valorização do ofício da cutelaria artesanal. Os cuteleiros vieram de paragens distantes, desde a Argentina até ao Paquistão mas o grosso foram participantes da Península Ibérica. Presentes estiveram também vendedores de máquinas de desbaste de cutelaria artesanal e também de gravação a laser.
Shoaib Ashraf é da empresa Golra Tools no Paquistão, que se dedica a esta área. Esta foi a sua estreia em Portugal e trouxe os mais variados tipos de faca: de chefs, de caça, para escavar madeira, entre outros instrumentos de trabalho. “Vendemos muito para os EUA e Reino Unido”, disse o participante que gostou de estar nas Caldas e de fazer parte deste certame do setor. Por seu lado Emanuel Moreno que veio de Beja estava contente pois esta foi a primeira vez que veio fazer parte de uma iniciativa apenas dedicada ao setor.
O criador da navalha alentejana desenhou o formato da lâmina, inspirando-se nas espadas árabes, povo que mais tempo habitou o sul de Portugal. “Tem corrido tudo às mil maravilhas”, contou o participante.
O maior colecionador do país
Todos apreciaram a organização da iniciativa caldense, inclusivamente o colecionador José Falcão Garcia, do Porto e que é o maior colecionador de facas e navalhas do país. Tem três mil exemplares e faz exposições nacionais e internacionais. “O colecionismo é um passatempo”, contou o convidado, enquanto explica que os exemplares que trouxe às Caldas foram de fabrico maioritariamente português.
Sendo um grande conhecedor da história da cutelaria portuguesa, José Falcão Garcia deu a conhecer algumas peças que trouxe e que foram feitas por um grande cuteleiro caldense, António Policarpo. Mostrou também uma pequena adaga, usada pelas prostitutas para se defenderem. “É uma peça que não é fácil de encontrar”, disse colecionador, que trouxe ainda punhais do século XVIII, assim como algumas facas do período das guerras liberais. O colecionador que percorre feiras, vendas e mercados em busca de peças especiais para a sua coleção gostou de a dar a conhecer algumas nas Caldas. Neste momento, já soma três mil exemplares.
Daniel Castro veio de Tenerife nas ilhas Canárias. Consigo trouxe as facas tradicionais que têm raízes naquelas ilhas. Há dez anos que este professor primário trocou as salas de aulas pela cutelaria artesanal. “Esta era uma faca de campo que era levada à cintura”, disse o convidado que explicou que esta é uma faca que leva no mínimo 15 a 20 horas de trabalho.
“Nas ilhas há cerca de 10 a 12 cuteleiros a fazer este tipo de exemplares”, acrescentou o convidado, que gostou de fazer parte da Naifa.
São raras mas há algumas mulheres ligadas ao mundo da cutelaria. Aida Augusto e Natália Castro são de Viana do Castelo e “por gosto” acabaram por se interessar pela cutelaria. Para ambas o cuteleiro é um dos artesãos mais importantes pois as peças que cria “têm todas utilidade”. Uma é mulher de um colecionador, outra de um cuteleiro e os quatro organizaram o primeiro festival de cutelaria a Norte, em Viana do Castelo. Participaram 20 cuteleiros de todo o país e foi “um verdadeiro sucesso”. Para Aida Augusto toda a gente devia ter uma faca feita por um cuteleiro artesanal pois esta “vai durar toda uma vida”.
Filipa Norte trabalha com o seu marido, o cuteleiro Carlos Norte. Em conjunto desenvolvem o negócio que inclui fábrica e loja on-line onde vendem facas de fábricas portuguesas e algumas internacionais. “A loja já tem 17 anos, promovemos workshops e temos a nossa própria marca, Lombo do Ferreiro”.
São também os organizadores da Feira Internacional de Cutelaria Artesanal que terá a sua 5ª edição nas Caldas em 2026. Já decorreram duas edições no CCC e mais duas no Museu Militar, em Lisboa. Fizeram depois uma pausa neste evento dado que o seu core-business é de facto a produção artesanal e a venda on-line. “Voltamos para o ano e será no CCC”, disse Filipa Norte para quem a cutelaria está na moda não só estimulada pelos programas televisivos do setor e também da ligação ao mundo da cozinha.
A Naifa, na sua opinião, teve muita variedade, e uniu profissionais de longa carreira na cutelaria com vários estreantes.



































