Câmara das Caldas corta apoios ao WPC

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Autarquia fala na relação custo-benefício, mas diretor do WPC rebate com estratégia cultural a médio e longo prazo

A Câmara das Caldas da Rainha vai interromper o apoio financeiro à organização do World Press Cartoon (WPC), inviabilizando a realização do certame já no próximo ano. Uma “análise detalhada” dos encargos e benefícios do investimento na organização do evento, que se realiza no CCC desde 2017 e já custou aos cofres do município mais de 1,3 milhões de euros, ditou esta decisão.
“O argumento da valorização territorial através da publicidade associada à realização do WPC em Caldas da Rainha não se comprovou pela avaliação camarária”, refere a autarquia em comunicado.
A exposição teve um número máximo de 4.539 visitantes, na edição de 2019, e um mínimo de 1.572, em 2018, “sendo que a maioria foram visitantes das escolas locais e contavam para esta contabilização todos os espectadores do Grande Auditório do CCC, independentemente de serem visitantes dirigidos especificamente à exposição, ou de serem espectadores do Grande Auditório durante a permanência da mesma”, acrescenta a nota do município.
O documento, assinado por Vítor Marques, refere-se ainda às poucas visualizações da gala através da plataforma Youtube e considera o WPC como um evento regular, mas isolado, “não se repercutindo transversalmente no programa cultural da cidade”.
Entende que este constitui, “de longe”, o evento mais dispendioso do município, “mesmo quando comparado com apoios prestados ao abrigo de contratos-programa com projetos estruturantes, como é o caso do Teatro da Rainha e do CCC”, ou com os encargos com grandes equipamentos culturais, como o Centro de Artes. A Câmara aponta que o valor global investido no WPC teria permitido a “reabilitação integral” do Museu António Duarte ou da Biblioteca.
O município quer continuar a apostar no humor e na caricatura e avança que está a preparar, para o próximo ano, “um evento inovador”, de projeção nacional, ancorado na realidade local e assente numa transversalidade de linguagens humorísticas e interventivas, com um encargo financeiro “ajustado” à dimensão orçamental do pelouro da cultura.

“Fazia todo o sentido nas Caldas”
António Antunes, diretor do WPC, sai “com pena” das Caldas porque acredita na valia do projeto que, a médio e longo prazo, iria marcar a vida cultural da cidade. “Este era o maior salão do mundo de humor gráfico publicado na imprensa”, afirma, lembrando que por ali passavam, anualmente, os melhores cartoonistas, que depois eram “os nossos embaixadores pelo mundo”.
António refere que a realidade apresentada pelo executivo é “verdadeira, mas não a total”, rebatendo com a avaliação de duas agências especializadas sobre o valor das notícias sobre o WPC, na ordem dos 1,3 e 1,5 milhões de euros por ano. “Senti desde o primeiro momento que o atual presidente estava um pouco contrafeito em relação a este projeto, que herdou mas nunca perfilhou”, refere o cartoonista, adiantando que a decisão da autarquia foi-lhe comunicada a 31 de agosto, sem que “alguma vez tenha havido uma conversa de fundo” sobre o assunto.
Para o diretor do WPC, o projeto fazia todo o sentido nas Caldas, devido à sua relação com a caricatura e com Rafael Bordalo Pinheiro. A estratégia idealizada implicava, para além da realização anual do WPC, a criação de uma Casa-Museu, exposições individuais de autores nacionais e estrangeiros e a implantação de esculturas caricaturais de grande porte pela cidade. Considera que é um plano que “dificilmente” se pode reproduzir noutras cidades e diz que ainda não sabe qual será o futuro do evento.
Luís Patacho, vereador do PS, reconhece que o WPC é um evento com um “custo expressivo e um peso específico no orçamento da Cultura” da autarquia, no entanto acredita que seria possível rever o formato (e com isso aligeirar o seu custo) e, simultaneamente melhorar a sua promoção, divulgação e projeção, com uma política de comunicação do município mais proativa e assertiva. O socialista considera tratar-se de um “evento diferenciado, à escala global, sobre um tema de índole cultural, icónico da liberdade de imprensa e do caricaturismo, um enquadramento muito favorável nas Caldas da Rainha”.
De acordo com o vereador do PSD e anterior presidente da Câmara, Tinta Ferreira, a realização do WPC inseriu-se numa “estratégia de afirmação nacional e valorização internacional” das Caldas e “é um dos melhores eventos do género no mundo”. Lamenta, por isso, que o executivo municipal não tenha chegado a acordo com a entidade promotora e considera que as Caldas perdeu projeção. Na sua opinião fazia todo o sentido realizar-se nesta cidade, dada a sua relação com Bordalo Pinheiro, com os ceramistas e com a tradição cerâmica do concelho, particularmente com a tradição humorista da cerâmica caldense. Enquadrado nesta estratégia o município adquiriu, no mandato anterior, o edifício “Charuto” com o propósito de aí poder instalar o “Museu do Humor”, onde o espólio do World Press Cartoon poderia ser exposto em permanência. Tinta Ferreira destaca ainda o contributo dado pelo dinamizador do evento, o cartoonista António e considera que “não será por falta de capacidade de tesouraria que este evento não se realiza, uma vez que o município herdou uma situação sólida e tem hoje um saldo orçamental superior nove milhões e meio de euros”. ■

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