Caldas fez uma festa a Zeca Afonso há 40 anos

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Entre os artistas contaram-se Carlos Paredes,Sérgio Godinho, Fanhais, Manuel Freire e Vitorino. Manuel Alegre e Natália Correia disseram poesia

Passam quatro décadas no próximo domingo, 5 de fevereiro, da Festa da Amizade, feita a José Afonso. Iniciativa foi um sucesso com o pavilhão da Mata a abarrotar de gente e com muitos artistas nacionais

“O Pavilhão da Mata não esteve cheio, na verdade, estava mesmo a abarrotar de gente!”. Palavras de José Carlos Faria, que foi um dos músicos que atuou na Festa de Amizade pois é membro dos Charanga, grupo que atuou a 5 de fevereiro, de 1983, na Festa da Amizade, uma iniciativa solidária criada por um grupo de cidadãos, amigos do cantor com vista a angariar fundos para José Afonso e que agora recorda à Gazeta das Caldas.
“O bilhete custava 200$00!”, recordou Evaristo Sousa, um dos elementos que ajudou na organização desta Festa da Amizade, que acabou por se transformar numa iniciativa nacional com a presença de artistas como Carlos Paredes, Vitorino, Luís Cília, Manuel Freire, Francisco Fanhais, Sérgio Godinho, Manuel Alegre, Natália Correia, Fernando Assis Pacheco, entre outros artistas e poetas que se quiseram reunir nesta festividade de apoio ao cantor.
O cantor já tinha sido diagnosticado com a doença esclerose lateral amiotrófica, – que acabou por o vitimar, – e o dinheiro angariado “destinava-se para que ele pudesse fazer tratamentos nos EUA”, recordou Élia Mendonça, elemento do núcleo caldense da Associação José Afonso e que agora se dispôs a assinalar os 40 anos desta festa que “reuniu gente de todo o país, de Aveiro e de Coimbra”. Muita gente com bilhete comprado, acabou por não ter lugar e “ficaram a tentar ouvir o que se passava lá dentro”.
A ideia de se celebrar os 40 anos “partiu de Paulo Vaz”, contou Élia Mendonça, que é também membro do núcleo caldense da AJA e que esteve na organização desta iniciativa solidária. O seu pai, Renato Mendonça, era grande amigo do cantor desde que se conheceram na Margem Sul.
A Festa da Amizade teve que ser organizada no Pavilhão da Mata pois era o maior espaço da cidade. “Mas tivémos que organizar na primeira parte atividades de caráter desportivo”, recordou Élia Mendonça. Como a Gazeta das Caldas noticiou na época, houve Karaté e Judo e também atuou o grupo de Bailado da Casa da Cultura. “E ainda tivémos que comprar uma alcatifa industrial para proteger o chão do pavilhão”, referiu a organizadora, acrescentando que, no fim da festa, esta foi oferecida à autarquia.
“Todos os artistas vieram graciosamente desde cantores, poetas e houve um verdadeiro manancial de gente que quis estar presente”, disse Élia Mendonça, surpreendida também com o facto de várias senhoras caldenses, com alguma idade, que quiseram participar com comida – bolos e rissóis – “na festa para o senhor Zeca”.
Apesar do cunho político, “ele humanamente tocava as pessoas” e houve muita gente que veio trabalhar nos bastidores da Festa “e que acabou por não conseguir assistir ao espetáculo”.
Élia Mendonça ainda decorou o pavilhão com cravos e usou cestos oferecidos por uma quinta. “Alguns caldenses estiveram a noite inteira a cozinhar nas instalações do CEERDL, no Largo João de Deus, e foram lá servidas as refeições para os músicos convidados”, recordou Élia Mendonça.
A Festa nas Caldas seguiu-se à do Coliseu e acabou por ser uma das últimas vezes “que ele atuou todo o concerto”, referiu José Nascimento, que fotografou a Festa da Amizade, entre outros concertos de Zeca Afonso.
Estatutariamente, o núcleo das Caldas depende do grupo de Lisboa Associação José Afonso (AJA) que vai também ceder algum material para as atividades deste núcleo caldense. Esta é a primeira atividade deste núcleo, iniciado em setembro passado e formalizado em novembro último.
Zeca Afonso era visita regular nas Caldas, na década de 1980. Tinha vários amigos na cidade e marcou presença em diversas iniciativas como as movimentações contra o nuclear em Ferrel e ainda fez um concerto a favor da Amnistia Internacional, em 1982, que foi feito na Escola Secundária Rafael Bordalo Pinheiro.
O cantor e poeta era frequentador das termas das Caldas, bem como da Praça da Fruta e do Café Central. A edição da serigrafia, que será lançada a 5 de fevereiro, foi impressa em França de forma semi-clandestina pois foi antes de abril. “No pós-revolução este o cartaz, até então inédito, foi escolhido para divulgar a Festa da Amizade”, disse José Carlos Faria, também do núcleo caldense. Na conferência “A resistência do canto” será ainda distribuído um fac-simile de uma denúncia da Pide sobre a presença de Zeca Afonso, de Francisco Fanhais e de Adriano Correia de Oliveira numa das noites, no espaço caldense, Inferno d’Azenha. ■

 

Testemunhos

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Evaristo Sousa
Organizador

“Com Renato Mendonça já tínhamos trazido outros concertos às Caldas como o da cantora caldense Adelaide Ferreira. O pavilhão da Mata esgotou!. A Festa foi de facto um momento único que contou com a solidariedade de muita gente de todo o país!” ■

 

José Nascimento
Fotógrafo

“Fotografei com todo o gosto a Festa da Amizade, só é pena que infelizmente Zeca Afonso já estava doente. Ele pediu-me para o fotografar também nas termas cá Caldas e a imagem acabou por ser incluída no álbum Fura Fura”. ■

 

Élia Mendonça
Amiga

“Zeca Afonso costumava ficar em nossa casa, primeiro na dos meus pais, depois na nossa. Ele era amigo do meu pai e tinham ideias políticas semelhantes, firmadas na Margem Sul. Nas Caldas fez termas com regularidade. Frequentava o Central e a Praça da Fruta. ■

 

José Carlos Faria
Músico dos Charanga

“Foi das últimas presenças de Zeca Afonso em palco e ele convidou-nos para atuar e até chegou a assistir a um ensaio. A Festa da Amizade foi algo inolvidável! A doença infelizmente acabou por levá-lo cedo. Só viveu mais quatro anos…”. ■

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