“Ol(h)á Florbela!” estreou em Setembro e esteve em cena nos Pimpões, dia 3 de Março. Esta é a peça que volta a pôr em palco Florbela Queiroz, actriz de 74 anos, que não fazia teatro de revista desde 2011. É também um espectáculo que põe o público a rir do princípio ao fim, mas que ao mesmo tempo abre as cortinas a assuntos sérios e actuais. A emigração jovem qualificada, o fenómeno dos refugiados, a corrupção política e a falta de privacidade digital são alguns exemplos.

“Eu sou a mesma”. É assim que Florbela Queiroz se apresenta na sua primeira cena, em que é abordada por dois jovens que a reconhecem na rua. Encontram-se em frente ao Teatro Nacional, precisamente onde a actriz se estreou aos 14 anos. Ao contrário do que estes pensavam, Florbela não está reformada. Pelo contrário!
Regressou à Revista e aos olhos do público é como se nunca tivesse parado. “Fui capa de muitas revistas, na altura era preciso ter talento, hoje basta silicone”, ironiza a actriz, realçando que antigamente os espectáculos ficavam anos em exibição, enquanto agora bastam poucos meses para serem considerados um êxito.
Nesta revista, produzida por João Nuno e Ricardo Miguel, Florbela surge ainda no papel de um soldado prestes a ir para a guerra, de uma alentejana que prefere viver do que a horta lhe dá do que daquilo que o governo lhe nega e de uma fadista desafinada.
“Gosto de dizer que vou estando por aqui, um dia de cada vez. Com 74 anos mexo-me como elas, só já não aguento muito tempo em cima das tarocas altas”, contou a actriz à Gazeta das Caldas, acrescentando que precisa sempre que alguém lhe segure a mão para manter o equilíbrio. “Mas isso não é da idade, foi assim a vida toda porque aos nove anos fui operada ao ouvido e isso afectou o meu sentido de equilíbrio! Nunca desci uma escadaria completamente sozinha”, explicou.
No ano em que assinala seis décadas de carreira, Florbela Queiroz confessa que já não tencionava voltar teatro. Foi convencida pelos produtores da peça, dois grandes amigos, “que me viam muito sozinha em casa”. Embora não entrasse numa revista desde 2011, garante que pisar novamente o palco foi tão natural como fazer o almoço todos os dias.
RIR SOBRE TEMAS SÉRIOS

“Ol(h)á Florbela!” são mais de 10 números diferentes, interpretados por Florbela Queiroz, Vera Mónica, Marisa Carvalho, Raquel Caneca e Gonçalo Brandão, intercalados com momentos musicais, em que marchas populares e fado estão incluídos. São também mais de duas horas em que o público ri às gargalhadas, mesmo quando os assuntos têm mais de sério do que de brincadeira.
Quem não se lembra de Linda Suza e da sua mala de cartão? É Vera Mónica quem interpreta esta famosa cantora portuguesa emigrante em França, mas que está de regresso a Portugal. Só que agora chega com uma mala comprada nos chineses, aquela marca que tomou conta do mundo. Linda de Suza faz parte da geração que passou a fronteira “a salto” e, de volta ao seu país, não poupa críticas à cena política: o Passos Coelho, a geringonça do Costa, o Cavaco, a Assunção Cristas e o Paulo Portas são os alvos da sátira. Confessa também que gostaria de ver o maior monumento do país – Cristiano Ronaldo – mas que estando o português em Madrid, tinham-lhe dito que Tinta Ferreira não lhe ficava atrás.
Esta não foi a única vez em que figuras locais entraram no texto da peça. Logo de início, Florbela Queiroz faz referência “ao menino das Caldas”, que comprou numa vez em que se enganou no caminho para o seu dentista e foi parar a Leiria. De passagem pela cidade da cerâmica, perdeu a vergonha e comprou um falo, “o maior que encontrei”. Curiosamente, esta deixa não fazia parte do texto original, mas a actriz incluiu-a no dia de estreia da Revista, em Setembro. “Uma invenção que resultou de um improviso, mas que agora já faz parte do espectáculo”, contou.
O tema dos refugiados surge num convento que vai receber 1500 famílias sírias, mas que se depara com o problema da falta de espaço e com uma visita da ASAE, que vem averiguar se as instalações cumprem as normas. Já a questão da exposição dos dados pessoais na internet é retratada num telefonema a um restaurante de pizzas: a senhora que liga a fazer uma encomenda é surpreendida pelo facto do empregado saber tudo sobre si, desde os seus problemas de saúde ao seu extrato bancário.
Um dos números mais emocionantes aborda a emigração jovem qualificada. O cenário é o da estação de comboios de Sta. Apolónia e o monólogo de Marisa Carvalho. “Estudei, trabalhei e voltei a estudar. Para quê? Para nada receber em troca”, diz a personagem, que se vê obrigada a sair de Portugal pela segunda vez, em busca de uma vida melhor. “E se eu quiser ficar, não tenho esse direito?”, questiona-se.
“A REVISTA NÃO É UM GÉNERO MENOR”
“Ol(h)á Florbela!” estreou o ano passado e tem a agenda preenchida até Setembro. Cumprirá, pelo menos, um ano em cena pelas várias salas do país. “A receptividade do público tem sido muito boa e esgotamos quase sempre”, disse Florbela Queiroz, realçando que o elenco fica muito satisfeito por ver cada vez mais juventude na plateia. “Principalmente porque os intelectuais desta praça disseram à nova geração que a Revista era género menor, não a educaram sequer a ir ao teatro”.
Para a actriz, que salienta o facto de Gil Vicente ser um dos pais da Revista, o principal desafio deste género é o curto tempo de cada número: “ou agarro imediatamente a personagem ou fico logo arrumada”.






























