A tecedeira que quer “iluminar a alma” esteve na Foz do Arelho

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Rita Martins Pereira, de 48 anos, vive em Odivelas, mas esteve temporariamente na Foz do Arelho, para onde gostava de se mudar, seguindo as pisadas da mãe

Rita Martins Pereira fez uma residência artística na Casa-Museu Jaime Umbelino, onde dinamizou workshops de tecelagem. Pretende regressar

Rita Martins Pereira, designer têxtil e tecedeira de 48 anos, esteve na Casa-Museu Jaime Umbelino, na Foz do Arelho, a fazer uma residência artística, durante o verão, até 29 de agosto. Esteve a dar workshops e aulas individuais à comunidade e fomos encontrá-la no seu atelier neste verão, enquanto tecia para uma nova coleção de sapatilhas.

Natural de Lisboa, tem dado a volta ao mundo, seja para aprender técnicas ancestrais de tecelagem na Grécia, seja para investigar as suas origens, em Goa, ou mesmo para fotografar o seu continente de eleição: África.

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Formada em Design de Moda no IADE (Instituto de Arte e Design), seguiu para Londres, para ganhar conhecimentos na área da produção de moda. Quando regressou a Portugal, trabalhou na revista Máxima, mas não se ficou por aqui. Foi para Barcelona estudar direção de atividades de tempos livres, começando depois a desenvolver atividades “com todo o tipo de pessoas”, desde crianças a jovens e idosos, conta.

Em 2015 retomou a tecelagem, que ficara esquecida desde os tempos de estudante na Escola António Arroio, em Lisboa, onde aprendeu a técnica. Foi assim que deu início ao seu projeto, Crosslights, que produz os mais variados tipos de peças de forma artesanal e numa lógica de sustentabilidade. O nome do projeto tem muito a ver com as paixões de Rita e que marcam as suas peças: a multiplicidade de cores com as mais variadas combinações.

“A minha intenção com esta marca é que as pessoas vistam a peça e a sintam como um abraço, uma proteção, que se olhem no espelho e que as cores iluminem a alma”, explica.

“Fazendo uma pesquisa no Google, descobri que 2015 era o ano da luz. Por isso, fez-me todo o sentido o nome de Luzes Cruzadas”, Crosslights, em inglês, para a marca se globalizar.

As suas peças vão beber à arte popular e inspiram-se em padrões de azulejos ou nas paredes das casas de pescadores. Outro aspeto singular é que Rita só produz peças únicas.

“Não há desperdício. Tudo é pensado de uma forma que seja sustentável e ecológica. Só é produzido o que é encomendado”, afirma a designer, declarando-se adepta do slow living e da slow fashion.

“São produtos de luxo pelas horas de trabalho que envolvem e pelos materiais utilizados”, explica, razão pela qual “não são propriamente acessíveis a toda a gente. Mas são peças que são para toda a vida”, e que comportam um “valor emocional”, salienta.

“A pessoa conhece quem é que produziu e sabe que mais ninguém vai ter aquela peça. Portanto, acabam por ser muito exclusivas”, continua.

Rita produz écharpes, mantas, casacos, coletes, tapetes para decoração de paredes, forros para móveis e sofás e, este ano, lançou-se nas sapatilhas. Faz o tecido, mesmo à medida, e envia-o para a Just Burel que, por sua vez, trata do resto. As sapatilhas vão ter um custo de 180 euros e a produção começa em setembro. “O objetivo é que todos os anos haja essa coleção-cápsula”, continua.

Os fios usados para as sapatilhas e para os forros são comprados numa fábrica na Covilhã que os produz através da reciclagem de roupa, que não volta a ser tingida. “É um fio muito resistente, adequado exatamente para as sapatilhas e não tanto para o corpo, porque é mais áspero”, elucida.

Já nas peças para vestir, usa fios italianos, nomeadamente Baby Alpaca e lã biológica, proveniente de ovelhas que “pastam em campos”. A tintura é hipoalergénica e os fios, além de não terem químicos, levam um tratamento anti-traça, com as peças a serem certificadas pelas entidades competentes e recomendadas pelo guia internacional de artesãos Homo Faber, do qual Rita faz parte. “São peças que não se podem pôr na máquina, porque encolhem. Têm de ser lavadas à mão”, alerta.

Neste momento, a designer está dedicada à sua marca, complementando esse trabalho com workshops de tecelagem criativa e aulas individuais de tecelagem. Nos workshops, as pessoas são convidadas a fazer uma peça no tear, seja uma decoração de parede ou uma base para copos. “A ideia é viver o momento, abstrair-se de tudo, brincar com as cores e texturas”, diz, salientando o lado “terapêutico” de “uma atividade que trabalha com as mãos”.

E os workshops são para todos, homens incluídos. “Na última atividade participaram mães e filhos, rapazes e raparigas. Portanto, [a tecelagem] não é uma atividade feminina. Aliás, em muitos países é feita pelos homens, com muita concentração e dedicação”, nota. Os fios para esta atividade são “de luxo”, italianos, já utilizados em marcas como a Gucci, mas que “iriam para o lixo”.

Rita fez uma viagem à Grécia financiada pela Comunidade Europeia, para aprender as técnicas ancestrais da tecelagem bizantina. A escola ficava numa aldeia na montanha e a professora era uma sénior muito experiente. Fez também um intercâmbio com um tecelão escocês, o que permitiu a cada um passar duas semanas a conhecer a cultura têxtil do país do outro.

A designer está atenta às open call da União Europeia, subscrevendo a newsletter da Europa Criativa. Dada a sua experiência nestas candidaturas, faz mentoria para ajudar pequenos negócios a recorrerem a esta ajuda.

Rita pretende voltar à Casa-Museu Jaime Umbelino para o ano.

A designer têxtil tem uma nova parceria com a Just Burel, para produzir sapatilhas cujo tecido ela fabrica, nos seus teares artesanais
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